PRIMEIRA CONVERSA

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Com a cabeça encostada na janela do ônibus, enquanto o mesmo balançava em um ritmo suave e constante, Rony tentava manter seus olhos abertos. A turnê ainda estava longe de acabar, e ele já não se aguentava em pé pela maratona de shows e o ritmo que bombeava a energia no ambiente artístico não estava em sincronia com seu coração. Talvez estivesse precisando de um pouco de adrenalina pra agitar. Por um lado, ele sentia-se feliz e satisfeito em ter a chance de fazer o que muitos sonhavam; mas a outra parte, a que desejava uma cama de verdade e lençóis quentinhos, o fazia querer chutar tudo para o mais longe possível. Ele não queria ficar só satisfeito. Queria que a alegria sacudisse seu ser. Que suas mãos formigassem com o nervosismo do começo, não um nervosismo contido.

Mas não era assim que a vida seguia e costumes eventualmente se estabeleciam. Teria que ter mais calma e paciência, muita paciência.

O ônibus balançou, agora com força o suficiente para fazer a cabeça de Rony ir para o lado e bater com tudo na janela. Xingando e com a mão na cabeça ele ergueu-se da poltrona em que ocupava e caminhou até os fundos do ambiente. Na pequena cozinha, uma funcionária terminava de preparar uma xícara de chá quando o viu e sorriu, retirando-se dali com o rosto um tanto corado pela vergonha. O ruivo riu sozinho, apostava que ela era uma novata. As outras mulheres já estavam de saco cheio de ver o seu rosto a todo momento e reações parecidas com a da garota já faziam um tempo. Bom assim.

Rony procurou uma bolça de gelo no freezer e afastou algumas latas de refrigerante e pacotes de batatas fatiadas congeladas, ficar com um roxo na testa era a última coisa que queria. Não encontrou o que queria mas pegou alguns cubos de gelo e os cobriu com um pano se secar pratos e retornou a poltrona. Olhando a hora no celular, viu que era quase seis da tarde e bocejou de cansaço. O palco para seu próximo show já deveria está montado e, se tudo corresse bem, faria uma apresentação de duas horas, depois, poderia ir para casa para um pequeno descanso de uma semana. Uma dádiva, ele pensou.

- ...sim, sim, claro... - a voz de seu pai soou gentil como sempre. Arthur, sentado do outro lado do corredor e com um notebook repousado nas pernas e seu celular acoplado no ouvido, digitava alguma coisa enquanto resmungava outra. - ...mas é claro que não! - ele fez uma careta. - Ah, tudo bem. Assim é melhor.

Sua mãe estava de frente a ele, também concentrada a um notebook. Os cabelos ruivos que antes sempre sempre ficavam soltos ao ar livre estava presos em um rabo de cavalo, a franja longe dos olhos atentos e sérios.

Ele estreitou os olhos e tentou adivinhar o que ela estava marcando em uma planilha azul com horários em vermelho e vários pontinhos pretos aqui e ali. As informações que leu um dia daquele mar de compromissos foi a razão de um acesso de raiva seu mas Molly fez algo para mudar todo seu trabalho e continuava a moderar no controle de seus passos. Ela não disse nada, é claro, mas ele conseguiu perceber as sutis mudanças. Ela estava tentando, pelo menos.

Já estavam chegando quando sentiu seu celular tocar. O pegou e sorriu ao olhar quem era no visor. Escorregou o dedo pela tela e atendeu com uma súbita alegria.

- Oi, Gina!

- Faaaala, cabeça de cenoura! - revirou os olhos. Gina era sua irmã mais nova, mas isso não tirava a oportunidade dela sempre insultar - sempre de um modo bom - o irmão mais velho. Rony escutou ela gritar com outra pessoa do outro lado da linha. - Desculpe, estou fazendo meu trabalho para a faculdade. Estou tentando fazer um vaso e o Harry não está me ajudando!

- ...eu não vou fazer o seu trabalho, Ginevra! - Harry falou exaltado de volta e Rony podia vê-lo inflar as bochechas de irritação.

- Ai, meu Deus, como eu ainda o suporto? - Gina voltou a falar para ninguém, particularmente. - Então, Rony, como vai a turnê?

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