O começo do pesadelo

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– Henry –

P:
Você quer conhecer minha família? Então se arruma.
P: Me passa o endereço que eu já te busco.
H: Sério?
H: Agoro eu fiquei nervoso.
H: Agora*
H: Já nem sei se quero mais, de tanto nervosismo.

P: Deixa disso. Vou te buscar em meia hora.
H: Você tem certeza?
P: Absoluta!
H: Tá bom.

Pensei no que a Monique me disse. Se ele já está mudando de ideia, talvez ele não queira tanto assim. Bom, ele tem meia hora para decidir a vida dele. Largo o celular para terminar de me arrumar, meio apreensivo com uma possível mensagem dele dizendo que mudou de ideia.

– Deixa eu ver se entendi esse bagulho direito – ele diz no meio do caminho – você está me levando para conhecer seu pai e a família dele, pois você acha que ele vai ser mais legal que a sua mãe que é uma crente duvidosa? – assenti.
– Pelo menos é isso que eu espero! – digo com os olhos na estrada.
– E se ele não aceitar que você esteja namorando alguém do mesmo sexo?
– Então nós estamos namorando? – eu sorri de lado encarando-o.
– É, agora que eu falei, acho que sim! – assentiu e sorriu de lado.
– Enfim, eu não pensei no pós. Mas se ele aceitar de boas, vou ficar muito surpreso. – digo tentando imaginar a reação do meu pai e falho.
– Eu estou aqui com você, isso que importa. – esfregou sua mão em minha perna e sorriu.
Segui com o percurso.

Essa é a primeira vez que eu venho para Nova Iguaçu dirigindo o meu próprio carro. E de tanto vir pra cá, seja em carro alheio ou ônibus, eu já até conheço o caminho de cabeça. O pior de Nova Iguaçu é o tráfego que existe de manhã, de tarde e à noite. Mas dessa vez eu não me importei, pois estou no carro com o Henry, apenas nós dois e está tocando as músicas duvidosas que ele gosta; são péssimas. Mas tudo bem!

Quando me aproximo do condômino da minha avó, eu sinto um frio na barriga que não tinha sentido antes. Henry aperta minha perna e pelo visto ele também está nervoso.
Entro no condomínio e estaciono o mais próximo da casa. Pego o presente que comprei para a minha vó e saímos do carro.

Hoje é o aniversário dela e a casa sempre fica cheia de parentes – alguns eu gosto e outros nem tanto – e infelizmente eu tenho que aturar todos.

Encaro Henry e ele estende a mão, eu seguro. Vamos caminhando lentamente até a casa da minha avó e assim que chegamos no portão, eu passo primeiro e depois ele passa – sem largar a mão um do outro.

Do lado de fora está o meu tio na churrasqueira, a sua mulher, uma de minhas tias e mais um bocado de parentes. Não pude deixar de perceber todos os olhos em nossas mãos que está grudada. Vou abraçando um por um e apresentando o Henry. Entramos na casa e não há ninguém na sala, apenas a televisão que fica vinte e quatro horas por dia tocando pagode. Entro no quarto da minha avó e ela está deitada em sua cama.

– Bênção, vó! – digo me aproximando e dando um beijo em sua bochecha – Feliz Aniversário! – digo entregando o presente.
– Deus te abençoe, meu filho! – diz sorridente – Como que você está? Tudo bom e nada presta?
– Tudo bom e nada presta! – repito rindo – E como à senhora está?
– Estou bem, graças a Deus! – assenti sorrindo – Quem é esse rapaz?
– Esse é o Henry! – apresento e ele dá um passo à frente – Meu namorado.
– Como vai, meu filho? – ela pergunta.
– Estou bem! E a senhora? – ele diz meio tímido. – Feliz Aniversário!
– Estou bem, estou bem! – sorriu – Sinta–se em casa, tá bom?
– Obrigado! – ele assentiu.

Eu disse que iria procurar o resto da casa e ao sair do quarto, percebi que estou suando. E olha que o pior ainda não passou. Vou em direção à cozinha com o Henry me seguindo e ao chegar, avisto duas tias minhas; uma lavando louça e outra no fogão; e a Pandora está sentada bebendo a cerveja dela.

– Oi! – digo e as três me encaram.
– Olá! – diz Maria, minha tia que está no fogão – Dessa vez eu não me esqueci de você e fiz o seu preferido! – silêncio – Lasanha de quatro queijos! – minha boca chega a aguar.

Eu e Maria sempre tivemos uma relação muito boa de tia e sobrinho. Era sempre bom vir para Nova Iguaçu, porque ela mora aqui. Além de ser super alto astral, ela fazia – faz – comidas e doces deliciosos; sempre me faz rir com qualquer coisa e ama Harry Potter. Em algum momento, sem mais nem menos ela parou de falar comigo e até hoje eu não sei o motivo. Porém, tá tudo certo. Do mesmo jeito que paramos de nos falar, voltamos. E ela continua sendo a mesma pessoa que eu sempre adorei.

– Obrigado! – me aproximo e abraço as duas. – Gente, esse é Henry...
– Seu namorado? – Pandora pergunta.
– Sim! – assenti – Essas são minhas tias Noêmia e Maria; e minha irmã Pandora.

As minhas tias me encararam surpresas e a Pandora também parece estar surpresa, mas por eu ter trago ele aqui.

– Oi! – ele diz balançando a mão, ainda tímido – É um prazer conhecê-las.

As três falam juntas e saí tudo embolado. Eu deveria rir? Pois fiquei nervoso em fração de segundos. Minhas mãos dão tiques e eu estou doido para coçar a minha perna.

– Onde está o meu pai? – pergunto.
– Ele foi buscar a Aurora – minha irmã mais nova – e daqui a pouco está de volta. – Pandora terminou de falar e eu assenti.
– Aqui tá quente, né? – digo balançando a blusa – Você quer beber ou comer alguma coisa? – encaro o Henry que nega com a cabeça – Então vamos lá fora. Daqui a pouco eu volto! – digo.

Viro. Assim que chego na área da churrasqueira, sei muito bem que não dá para ficar aqui. Todos os olhares... Se eles ficassem assim com todos os casais que vieram aqui, tudo bem. Porém, isso nunca aconteceu. Então eu propus uma volta no condomínio e o Henry aceitou.

– Seus familiares parecem ser mó gente boa! – ele diz e eu acho que ele não acredita na própria mentira dele.
– Uhum! – assenti – Eles iriam te adorar, se você fosse uma garota.
– Eu não quero que eles me adorem – negou – você gostando de mim é tudo o que eu preciso. – sorri de lado – E porra, você me trouxe aqui para conhecer eles. Já é um bagulho muito especial.

Quebrei o contato visual e olhei em volta.

– Eu já morei dois anos aqui... – comecei – E quando não morava vinha direto visitar a minha avó. – digo enquanto passávamos pelo intitulado "Parquinho de trás" – Aqui é um belo lugar para se morar, certo? – Henry assentiu – Você acha que eu fui feliz aqui?
– Pô, eu acho que sim! – assentiu.
– Nem um pouco! – neguei – Imagina... O condomínio cheio de criança, umas mais novas e outras mais velhas do que eu; e eu nunca pude chamar alguém de amigo. Eu não tinha amigos. – o encaro e logo olho para o chão – Aqui era uma divisão, meninos e meninas. Os meninos não me queriam por perto porque eu não sabia jogar futebol, e olha que eu tentei. E tudo que sobrou foi a minha irmã. Eu ficava andando por aqui com ela como sua sombra. Eu tive belos momentos com ela e com as suas amigas.
– Pelo menos isso, né?
– Sim! – mexi meus lábios – Até que um ano atrás ela me contou que não gostava que quando eu ficava seguindo ela, que corria de mim, mas eu não percebia. Seria engraçado, se não fosse trágico. – ri sem graça – Por anos eu falava que sobrevivia a isso aqui por causa dela e ela só me queria longe. – dou de ombros – Daí eu percebi que sou bem melhor sozinho do que acompanhando de três pessoas, por exemplo. Eu não preciso agradar ninguém, eu faço as coisas da forma que eu quero e não tem estresse.
– Mas não é meio solitário? – ele pergunta e nós nos encaramos.
– No começo foi. Mas depois você se acostuma e... Pai? – digo olhando para o Horizonte. Meu pai está vindo em minha direção, segurando a mão da minha irmã mais nova e sua feição não está muito agradável.

– Oi, meu amor! – digo para Aurora assim que eles se aproximam – Pai, esse é...
– Seu namorado! – diz com raiva e logo me despertou medo. – Já me falaram que meu filho é um viadinho. – engoli seco – Faz o seguinte, para o seu bem, pega ele e some da minha frente. Não entra mais na casa da minha mãe, não entra mais na minha casa, não me mande mais mensagem. Esquece que eu sou seu pai, porque você não é mais meu filho! – respirou fundo – Eu só não te quebro na porrada agora, porque sua irmã tá aqui.

Não consigo me mexer.

– Some daqui, porra! – ele gritou.
– Vem, Pietro, vamos para o carro! – Henry diz com a voz trêmula.

Ele me ajuda a virar e nós vamos em direção ao carro. Abriu a porta para que eu entrasse e entrou do outro lado. Eu fiquei olhando para o meu horizonte e o meu pai passou segurando a mão da Aurora. Eu não consigo me mexer e só quero chorar, gritar, explodir. Henry coloca o sinto de segurança em mim e começa a balançar meu rosto.

– Ei! Pietro! – me chama – Nós precisamos ir. Eu não quero que ele volte aqui e...
– Ok! – me recomponho – Desculpa!

Finjo que nada aconteceu e contive minhas lágrimas, eu sou expert nisso.
Dou partida no carro.
Como que eu vou voltar para casa agora? Se o meu pai teve essa reação, imagina a minha mãe... Meu irmão e todos os meus familiares... Eu só quero cair em um buraco e do nada aparecer em um novo mundo. Porém, não é possível. Então, tenho que manter foco na estrada.

– Podemos ir para a sua casa? – pergunto com uma voz de choro.
– Claro! – responde sem pensar duas vezes.

Paro o carro em frente a casa dele e começo a coçar a minha perna, de tão nervoso que estou. Henry sai do carro e abre a porta, para que eu saia também. Tranco o carro e logo estamos entrando em sua casa. Sua mãe não está e segundo ele, o mesmo nunca conheceu o pai. Então, estamos sozinhos. Me levou até o seu quarto e eu deitei em sua cama.

Ele saiu do quarto e me deixando sozinho aqui. Eu estou deitado de cabeça para cima, encarando o teto e segurando minhas lágrimas, não quero que ninguém me veja chorando. Henry volta para o quarto, deita ao meu lado e começa a fazer cafuné.

– Não deixe que isso te abale – começa – tem pais que fazem coisas piores. E outra, você não está perdendo nada. Quem está perdendo é ele.
Silêncio.
– Vamos assistir a um filme? – assenti, só pra não deixá-lo entediado.

Ele colocou o filme e em meia hora dormiu. Eu continuei encarando o teto e fico assim o resto do dia. Henry levantou para comer, tomar banho e eu me encontro na mesma posição, pois eu não quero liberar minhas emoções perto dele.
Já é de noite e estamos "assistindo" mais um filme.

Madrugada chega e nada no sono aparecer. Henry está dormindo pela vigésima vez e eu tentando. Seu celular começa a apitar e me incomoda. Eu pego para colocar no modo silencioso e me espanto com as três primeiras mensagens.

– Luís Gustavo –

L: Ei!
L: Já estou com saudades.
L: Quando vamos nos encontrar de novo? Sinto falta do seu beijo.

Que porra é essa?
Bloqueio o celular e volto para a minha posição inicial. Agora as lágrimas decidem cair.

PIETROOnde histórias criam vida. Descubra agora