Capítulo 8

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Dias atuais:

O que deveria ser um pesadelo, não foi. Ontem quando o Gustavo apareceu aqui na casa da Stefanie, eu já estava bem alcoolizado. E tudo o que eu deveria ter feito – ou faria, só que sóbrio – era ouvir o que ele tinha a dizer e mandá-lo embora. Porém, sabemos que não foi isso que aconteceu e está tudo bem. Digo, nada está bem.

A Thayla respondeu a minha mensagem dizendo que ela não passou o meu número para o Henry, o que é estranho. E para piorar, eu acordei de ressaca. E para piorar mais ainda, o Henry quer me encontrar para conversar comigo. Agora só falta aparecer a minha mãe e eu não tenho coragem de olhar para a cara dela, e nem vou.

Levanto da cama e tudo começa a girar. Faço minhas higienes no banheiro e pego um óculos de sol, pois a claridade sempre me fode quando eu estou de ressaca. Pego o me celular, encaro a mensagem que eu não respondi do Henry e bloqueio. Desço.

Meu estômago começa a roncar de fome e eu não vejo a hora de comer.
Chegando na cozinha, Stefanie está mexendo no seu celular e está sozinha. Sento a sua frente e não demoro a pegar um pão francês, o abro com a mão, coloco queijo e dou uma mordida.

– A larica tá grande! – diz rindo.
Eu odeio quando eles falam gírias.
– Devia ter tomado remédio antes de beber. – neguei com a cabeça – Eu não tenho ressaca faz anos.
– Bem vindo de volta! – diz dando um gole em sua Coca–Cola. – Então, ontem foi um incentivo para você ficar de vez? – perguntou esperançosa, dá para ver em sua cara.
– Não! – nego – Já faz tempo que bebida não faz minha mente. Do que adianta a ilusão de uma noite com a vida toda fodida?
– Mas eu não digo só em questão da bebida. – pausa – Estou falando de nós, o nosso grupo que sempre esteve junto e ficou incompleto sem você aqui.
– Se passaram dois anos. Eu posso ter feito falta no inicio, mas vocês se acostumaram. – ela negou – E me desculpa, mas não é vocês e nem ninguém que vai fazer com que eu mude de ideia. Ficou mais que claro que o meu lugar não é aqui. Eu não descobri aonde é, porém uma hora irei descobrir.
– E onde você ficou esse tempo todo?
– São Francisco! – minto.
– E por que você não foi visitar seus tios? – se ajeitou na cadeira – É perto, não é?
– Um dia de carro e algumas horas de avião.
– E por que não foi?
– Não é obvio? – sua feição dizia que "não" – Quando mais novo ninguém quis me levar para lá, nem a mim nem os meus irmãos. Nem mesmo a passeio. – ela assentiu – Então, uma coisa que eu nunca farei quando estiver na América do Norte é ir visitar eles.
– Justo! – levantou de sua cadeira – Enfim, vou ter que sair. Mas fica a vontade. Minha casa é sua casa.
– Obrigado!

Passou por mim apertando meu ombro e eu aproveitei o tempo livre que eu tenho para comer mais.
Ao fim, deixei a mesa que estava pronta do jeito que encontrei e voltei para o quarto. Tomo banho, coloco uma roupa mais calorenta e pego o meu celular que estava em cima da cama. Há algumas mensagens do Henry e por mais que algo dentro de mim queira respondê-lo rápido, eu não vou. Abro o site de passagens aéreas e compro uma para hoje de noite. Então, começo a arrumar a minha mala, a mochila e logo está tudo pronto.
Meu celular toca, Henry.

– (XX) XXXXX–XXXX

X: Oi!
X: Henry aqui, de novo...
X: Será que poderíamos conversar hoje?
X: Me desculpa! Será que podemos consertar as coisas?
X: Já faz dois anos que eu estou mal por conta do bagulho que aconteceu. Por favor, me dê uma segunda chance!!!!

Nossa situação não tem volta e isso é obvio para todo mundo. Fico encarando as mensagens e não consigo sentir nada – ou será que não me permito? Bom, por mais que eu só sinta ódio por ele agora, sempre tentei ser uma pessoa justa. E ontem eu acabei ouvindo o Gustavo. Então, seria injusto se eu não o ouvisse, por mais que seja perca de tempo. Respondo que ele pode vir aqui na casa da Stefanie e ele responde que já está a caminho. Coloco o único tênis que trouxe, pois odeio ficar de chinelo na casa dos outros enquanto sou visita e deito na cama, para relaxar enquanto ele não chega.

A campainha não demora a tocar. Levanto da cama todo molenga e demoro a chegar até a porta, pois não é algo que eu gostaria de estar fazendo agora. Assim que abro, vejo aquela cara de cachorro abandonado quase que sorrindo para mim. Ele e Gustavo fizeram quase a mesma feição quando me viram.

– Oi! – ele diz meio sem jeito – Eu posso entrar?
– Fazer o quê, né?! – digo me afastando para que ele passasse.

Ele entra e não faz igual o Gustavo que já foi sentando no sofá. Ele apenas parou perto da porta, de frente para mim e eu de costas para a porta. O silêncio começou a ficar agradável, pois se ele não falar nada eu posso expulsá-lo daqui. E se o silêncio está agradável, por outro lado está sendo muito difícil encará-lo e não sentir nada. Pelo celular era completamente diferente. Pelo celular eu não estava encarando o garoto que me fez feliz por algumas semanas – sendo que às vezes parecia que nós nos conhecíamos de outra vida – o garoto que estragou tudo com um piscar de olhos. Enfim, está quase impossível manter contato visual. Pensei que seria mais fácil.

– O Gustavo te falou que veio aqui ontem e você resolveu aparecer para dar seu lado da história? – cruzei os braços.
– Não! – negou – Eu não falo com o Gustavo faz dois anos. Quando eu descobri que você foi embora, eu fiquei péssimo e excluí ele da minha vida. – olho para o lado, para não manter contato visual – Eu me senti um lixo durante esse tempo todo.
– Então quando você foi lá em casa pedir desculpas, você ainda tinha contato com ele?

Silêncio.

– O que você veio fazer aqui? O que você quer? – droga, contato visual – Quer que eu me sinta péssimo por ter feito você se sentir péssimo, quando foi você que começou isso?
– Não! – negou com a cabeça – Eu só queria pedir desculpas. Eu fui infantil e sem caráter. – assenti – Eu acho que te conheci no momento errado. Por causa do meu antigo relacionamento eu...
– Não venha colocar a culpa no seu relacionamento anterior! – o cortei – Eu não era ela. – apontei para mim – Eu era uma pessoa nova, te dando novas experiências. Eu não tinha nada haver com o seu passado.
– Eu tinha! – apontou para si – Por mais que eu te amasse... E eu ainda te amo... – eu ri – Não conseguia esquecer o passado.
– E agora o seu passado sou eu. – respirei fundo – E você não vai me esquecer tão cedo.

Silêncio.

– Você já parou para perceber que você só dá mais valor quando perde? – ele olhou um pouco para o lado – Você tem um relacionamento abusivo com o seu passado. Você não consegue digerir a perda, mas passa pra próxima, só pra magoar mais alguém.
– Não é...
– Sabe o que é mais engraçado nisso tudo? – o interrompi e ele negou – O jeito em que sua ex te traiu. Você fez a mesma coisa comigo. Esse era o plano?
– Não!
– Então qual foi o problema? – altero um pouco o meu tom de voz – Eu dei tudo de mim. Eu te apresentei a minha família mesmo sabendo que eles não iriam digerir. O que eu fiz de errado? O que você não gostou em mim que foi procurar outro? – termino.
– O problema nunca foi você! – aumenta um pouco o tom de voz – Sempre foi eu e a minha bagagem que eu nunca consegui despachar. – pelo menos ele admite – Você foi a melhor coisa... A melhor pessoa que apareceu na minha vida e eu apenas não aceitei que algo perfeito podia acontecer comigo. Estava tudo muito perfeito para ser verdade e eu estraguei tudo. Desculpa! – o encaro.
– Acabou? – pergunto com a voz trêmula e ele abaixa a cabeça.
– O que você sente por mim agora?
– O que o amor vira quando chega o fim? – ele abaixa a cabeça.
– Então por que você está usando o All Star? – apontou para o All Star que ele personalizou – Mesmo depois de tudo, você o guardou.
– É apenas um tênis! – digo olhando para baixo.
– Para nós dois nunca foi!

Silêncio.
Nós nos encaramos e ele deu um passo a sua frente, eu dei um para trás. Ele continuou vindo em minha direção e eu a recuando, até que... Droga! A porta. A porta impediu que eu recuasse mais e logo estamos cara a cara. Esse rosto, esse estilo dark, esse cabelo cacheado, esse perfume que eu nunca esqueci o cheiro... Droga!

– Nós estávamos no mesmo barco e eu fui o único que afundou! – digo com uma tristeza em minha voz.
– Eu nunca mais vou te deixar sozinho no barco. – ele responde olhando nos meus olhos, tão perto que é capaz de eu não aguentar e abraçá-lo.

Ele me puxou e nós nos beijamos. Tão bom, é como se eu estivesse no céu novamente. Eu retribuo e coloco a minha mão em sua cabeça. Ele me puxa e coloca suas mãos um pouco mais abaixo. Começa a beijar a minha bochecha, logo o meu pescoço e por mais que eu queira interromper isso, não posso. Digo, eu posso sim.

– Não! – o empurro – Para. Você já teve a sua chance.
– Por favor, me dá outra chance! – diz tentando se aproximar.

O encaro. Seus olhos começam a encher de lágrimas e o meu também. Eu sei que eu vou amá-lo para sempre. Existe aquele ditado que todo mundo se identifica "Existe o amor da sua vida e o amor para a sua vida." E o Henry não é o amor para a minha vida.

– Eu não acredito em segundas chances! – digo com um tom falho.
– Você me fez acreditar que estava tudo bem entre nós e simplesmente foi embora, sem avisar... – diz relembrando o passado e logo caiu uma lágrima do seu olho.

Eu o machuquei, não tanto o quanto ele me machucou. Mas eu o feri e isso está me matando.
Estendo o braço para abrir a porta e ele sabe o que isso significa.

– Eu te amo! – diz enquanto passa.
Eu fecho a porta.
– Também te amo! – me agacho na porta e começo a chorar.

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