Capítulo 2 - Renan

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O dia amanhece e estou sentindo um cansaço enorme se apossando de cada molécula do meu corpo, mas não posso deixar que isso tome conta de mim, hoje eu tenho aula. Apesar de não gostar de estudar eu sabia que tinha minhas obrigações e que minha mãe encheria a minha paciência.

Levanto e tomo um banho rápido, coloco uma calça jeans normal, uma camiseta do Pink Floyd, um tênis de cano alto e deixei meu cabelo bagunçado, eu não tinha pique de ficar me embelezando todos os dias, até porque eu não me achava o tipo de cara bonito e tudo mais.

Desci para o café e tomei apenas um suco de maracujá e comi uma barrinha de cereais, minha mãe já estava com a cara enfiada no computador fazendo apostas em jogos online, ela realmente era viciada nisso, mas pelo menos ela não ficava me cobrando algumas coisas e nem me irritava querendo arrumar meu cabelo ou jogando fora minhas roupas.

Ligo meu celular e coloco na minha playlist que toca uma música qualquer, ando de cabeça baixa pelas ruas pensando nas primeiras aulas que seriam com toda certeza a pior coisa do universo. Encontro alguns colegas pela rua e seguimos conversando um pouco sobre qualquer besteira.

Percebo que já ando perdido pelos corredores e entro na sala, sento no fundo e fico olhando para a cara da professora que começa a falar com a voz rouca provavelmente por conta de cigarros.

- Alunos ia me esquecendo já, temos uma novata - ela disse, eu imediatamente parei e prestei atenção - O nome dela é Sayuri, ela chegou ontem do Japão, por favor fique de pé para que os alunos lhe conheçam.

Logo uma menina japonesa, branquinha de cabelos curtinhos, baixinha, usava um tênis florido e com a timidez no olhar se levanta.

- Oi - ela disse sorrindo sem graça - Sou a Sayuri e espero que possamos ter um ano bom! - ninguém falava isso no primeiro dia de aula, mas tudo bem. Ela se sentou e a aula seguiu tranquilamente, alguns caras ao meu lado já estavam pensando em pegar a novata e sinceramente isso me dava nojo, a menina era nova, eles nem a conheciam e já a tratava como um pedaço de carne.

O intervalo chegou e decidi levar meus materiais, estava distraído andando pela sala até que trombei com aquele corpo franzino, ouvindo os materiais se espalhando pelo chão.

- Oh, me desculpe - ela disse envergonhada com as bochechas coradas e ajuntando os materiais apressadamente.

- Eu que peço desculpas, prazer Renan - disse e estendi a mão, ela apertou de leve e sorriu.

- Sayuri - terminamos de ajuntar as nossas coisas e levantamos. Senti ela meio que triste por talvez ter que ficar sozinha então tentei uma aproximação.

- Quer ficar comigo no intervalo hoje? Digo, até fazer novas amizades? - disse tranquilo.

- Eu aceito - disse envergonhada - E não tenho tanta certeza de que vou fazer amigos, talvez nem fique muito tempo aqui por causa dos meus pais.

Saímos da sala e fiquei sem entender, mas sabia que não poderia pressioná-la, ela era nova, mal me conhecia e não abriria sua vida assim tão rápido. Ficamos sentados no banco perto do refeitório, aquele cheiro da merenda me dava náuseas, mas era o único lugar disponível.

Engatamos uma conversa qualquer e descobri diversas coisas em comum com Sayuri, ela continuava meio contida, porém estava falando um pouco mais do que antes. Além de ser parecida comigo em questão de músicas, de estilo, ela era muito inteligente e qualquer assunto para ela era fichinha.

Ela tinha argumentos para debater, não importava se falávamos de política ou do ciclo da água, ela tinha uma forma incrível de debater e me sentia um burro ao seu lado. Voltamos para a aula e ouvi alguns burburinhos, o pessoal costumava a fazer certos comentários sobre mim, especialmente por nunca ter namorado ou nunca ter aparecido com uma menina.

Eles me xingavam dia após dia, falavam que eu nunca arrumaria uma menina pela forma que me vestia e um monte de outras baboseiras que eu tentava evitar ficar pensando, pois sabia que eles não parariam se continuasse me importando.

Sayuri na troca de aula sentou-se ao meu lado e senti-me um pouco mais confortável, mas faltava algo, ela praticamente sabia tudo sobre mim em apenas algumas aulas e eu não sabia nada dela, apenas aquilo que era obvio perceber.

Voltamos para casa juntos, a acompanhei até a porta e me despedi dela. Continuei andando até que um dos moleques que vivia me zoando me acertou pelas costas e me jogou no chão. Ele ria da minha cara e me xingava como sempre fazia, ele era o valentão da escola e eu nem ousava me impor, ele era bem mais forte que eu.

Então, ali estirado no chão apanhei por ser diferente, por ter um estilo diferente, por pensar diferente que eles e por ter falado um pouco com a Sayuri, pelo menos foi isso que deu para ouvir a cada soco que ele dava em meu rosto. Logo ele sumiu e eu fiquei ali, algum tempo tentando levantar, assim que achei forças para me erguer fui caminhando devagar para minha casa, sentindo cada parte do meu rosto dolorida.

Cheguei em casa e minha mãe continuava no site de jogos, ela nem percebeu minha presença, então subi correndo e tratei de me lavar e fazer curativos. Deitei na minha cama e liguei a tv, assisti qualquer programa que passava e lembrei da pilha de trabalhos que eu tinha que fazer.

Olhei para a escrivaninha e nem me importei, estava acostumado a fechar com cinco, sempre que estava prestes a fechar com vermelha eu virava camarada do professor e ai conseguia um ponto a mais, era pura lábia, só que com as meninas isso não funcionava.

Acabei pegando no sono e acordando só as oito da noite, fui para a cozinha procurar qualquer coisa para comer e minha mãe ainda não tinha saído do computador, isso de certa forma era preocupante. Peguei um pacote de bolacha recheada e voltei para meu quarto.

Liguei meu computador e fiquei navegando na internet vendo alguns jogos, filmes que estreariam esse ano e entrei no facebook só por entrar, aquilo já tinha perdido totalmente a graça, eu nem sabia porque tinha criado já que estava jogado as traças.

Continuei vendo mais algumas coisas e devorando meu pacote de bolachas, logo enjoei e saí do computador, tomei um banho e deitei de samba canção na minha cama, virei a noite toda e toda vez que pregava os olhos me vinha aquela cena terrível que me perseguia desde os nove anos de idade, algo que talvez nunca saísse do meu subconsciente.

Fui até o armarinho do banheiro e ali onde estavam guardadas as toalhas, peguei um calmante que usava sempre, tomei e finamente apaguei, abafando e esquecendo por alguns instantes aquela imagem que me aterrorizava e que não me deixava viver em paz.

A Menina do Tênis FloridoOnde histórias criam vida. Descubra agora