Delícias do Hospital

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Reunidos na sala de Feels, Gerard fazia duas revistas de binóculo, projetando-as para o alto. Frank estava cansado e lendo vários relatórios.

Feels passava base distraidamente nas unhas, enquanto uma nuvem de chuva gigante passava no céu, através da janela atrás dele, escurecendo tudo.

- Droga! – Ele reclama da escuridão.

Gerard fez um bico e voltou ao normal, enquanto Frank tirou a atenção do seus relatórios. O ar abafado de Urach fez um filete de suor escorrer por suas costas, era como se uma cobra estivesse fazendo uma dança sensual e indo em direção aonde o sol não bate. Não que ele não gostasse da ideia. Quer dizer, poderia ser uma cobra metafórica. Uma cobra que tem como base a virilha macia com uma réplica do rosto do Fofão embaixo. E que gostava de se enterrar em lugares quentes e apertados.

- Ok, agora vamos falar sobre isso? – Iero toma a frente. Desde o bar no dia anterior, todos ficaram agindo estranho uns com os outros, deixando tudo com um ar de velório, ou como se tudo já estivesse acabado e evitando tocar no assunto em si. Frank achava aquilo legal, de certo modo. A preocupação de seus colegas e sua fidelidade mediante a maçante quantidade de denúncias injustas ocorrendo a cada minuto. Eles estavam sendo abençoados pelo anonimato, mas não sabia mais por quanto tempo. Iero temia que a qualquer momento os levassem e fizessem sabe-se lá o que. Ouviu rumores de que não estavam mais dando cinco chances, o que se tornou extremamente perigoso. Em um nível nunca antes visto. Mas Gerard parecia não se importar muito. Ele até pensava sobre o minhocão caolho no meio das pernas e de como agradá-lo usando um pouco de cera de abelha. Ou iogurte numa mão bem apertada.

Feels suspirou derrotado, fechando o frasco de base e abandonando no canto da mesa:

- Sim, vamos. – Diz, com aflição. – Não há como escapar agora. – Ele diz, assistindo Gerard começar a roer as unhas. – Eu estou com medo por vocês. Além de trabalharmos juntos, também são meus amigos. Não quero que sejam enviados para Mors ou o que quer que seja que eles fazem. E eu temo por mim também. Aos olhos da sociedade que eles querem, eu sou só mais um afeminado que gosta de cozinhar e se vestir bem. Se eu for para o polígrafo, ou para a coisa  de alta tecnologia que eles disseram ter também, não importa o quanto eu diga que amo a Nhonhonha, eles vão me enjaular apenas pela culinária e a moda.

Feels também não queria deixá-los ainda mais preocupados com os rumores que ouvia das reuniões com seus superiores. Havia uma ordem no Supremo Tribunal de Florença de punição a associação ou cumplicidade antimoral – esse era o termo nos documentos, ou seja, quem fosse amigo, tivesse contato ou protegesse e escondesse qualquer um que não fosse heterossexual e praticasse qualquer tipo de paganismo era condenado aos campos de Mors. As coisas estavam ficando mais caras nos supermercados, haja vista que todas as atitudes do Governo não eram aceitas pela comunidade internacional que começou a taxar as exportações.

Pessoas com comportamentos suspeitos estavam sendo demitidas e expulsas de suas comunidades e condomínios. Uma onda sutil de moradores de rua começava a se formar nos centros urbanos, principalmente nos bairros comerciais e que a cada manhã desapareciam misteriosamente. Enquanto famílias pobres  de baixa renda não podem comprar o básico para se viver, a propaganda política se espalha como uma gripe por todos os cantos do país. Milhões em posters, comerciais e contratações de mais agentes da BNCCM para oprimir e prender. E com toda certeza matar. Não só no sentido óbvio da palavra, mas também no sentido emocional e social. Tire liberdade, tranquilidade e o direito de ser de alguém, depois, só é preciso cavar uma cova.

- A gente vai dar um jeito nisso, Feels. – Iero mentiu.

- Posso ser sincero? – Gerard se levanta do sofá no canto e ajeita Tancredo nas calças. – Eu to me cagando de medo. Eu aguento levar uns choque na bunda, uns tapa na cara. Mas não aguento ficar longe do Frank. – Na verdade, bem, a parte do Frank era bem real, mas Gerard até se sentia um pouco em paz, não sabia porque. Talvez porque fosse um machão com muitos honorários de escrotisse e frases ofensivas em público. Talvez ele escapasse da reeducação. Quanto a Frank...

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