02. Reencontro uma amiga. Devia ser normal, mas...

1.6K 201 1.1K
                                    

“Seu coração bate como um tambor
A perseguição apenas começou
Monstros presos dentro de sua cabeça
Monstros debaixo da sua cama”

Monsters, Ruelle

[ᚠ]

Aquele relógio era uma relíquia. Minha mãe ganhou de seus pais aos oito anos de idade e, quando completei a mesma idade, o objeto foi passado a mim.

Ele me fazia sentir mais próxima de uma dupla de avós que eu não conhecera, ainda que ele não tivesse valor monetário nenhum. Eu sabia disso pois já tinha tentado vender ele uma vez.

[Ah, o que foi? Sem julgamentos! Eu precisava de dinheiro para um celular novo, poxa!]

Haviam algumas palavras esquisitas entalhadas dentro do visor do relógio, as letras bizarras douradas contrastavam com o azul marinho do plano de fundo do mostrador. No botão que era usado para regular as horas, havia uma pedrinha cor azul do mesmo tom usado na parte de dentro do relógio.

Mas vamos voltar à história. Onde eu estava, mesmo? Ah, sim. Alguém que surgiu do nada tinha falado que sentiu minha falta.

Esqueci totalmente do que eu fazia quando a pessoa, debaixo do píer, falou comigo.

Hesitei por uns segundos e culpei a água fria pelos calafrios que corriam pelo meu corpo, mesmo ciente de que o verdadeiro motivo de eu estar querendo sair correndo dali que nem o próprio Barry Allen era aquela voz que havia falado comigo.

Todas as minhas células berraram CORRA, IDIOTA!, enquanto alguma parte estúpida dentro de mim me obrigou a ficar onde estava e olhar para quem dissera sentir minha falta.

[Infelizmente, eu ouvi minha parte estúpida. É, eu sei que foi estupidez. Não é à toa que eu usei a palavra estúpida.]

Os olhos azuis brilhantes foram a primeira coisa que eu percebi na pessoa, uma vez que estávamos debaixo da sombra que o píer fazia.

— M-Maryne? — Engasguei com minhas próprias palavras.

Sua aparência se tornou mais clara aos poucos. Os cabelos escuros como petróleo e a pele levemente bronzeada juntavam-se em belos tons, os lábios estavam coloridos por algum pigmento vermelho.

Engoli em seco. Ela havia mudado bastante, mas também continuava sendo a mesma pessoa de três anos atrás.

[Mas não fazia sentido algum ela estar ali, bem na minha frente.]

— Oi. — Sorriu.

Maryne tinha sido uma aluna de intercâmbio e por seis longos meses em meu colégio ela me suportou e foi a primeira pessoa que eu pude chamar de amiga.

Esqueci de mencionar uma coisa. Em minha escola, eu era parte de um grupo de alunos que possuía fluência em uma segunda língua, nós éramos responsáveis por ajudar estudantes estrangeiros a se acharem no colégio, se enturmarem e os auxiliar em basicamente qualquer coisa que fosse necessária.

Maryne foi a primeira estudante de intercâmbio que eu auxiliei. E, bom, ela também me ajudou bastante. Não só pelo fato de que minha pronúncia em inglês melhorou a níveis inimagináveis, mas também, em algo que fez ainda mais diferença em minha vida: ela me ensinou o que era uma amizade verdadeira.

Até os seis meses acabarem, nós duas éramos inseparáveis. Mas o tempo acabou. Ela teve que voltar para o Canadá três anos antes, no fim do ano letivo.

E foi nas férias seguintes em que conheci Samuel e Adriana. A partir daí, você já sabe. Voltemos à história.

— O que... Como você... Quando... — Eram tantas perguntas entaladas em minha garganta que eu nem sabia o que dizer direito.

Diário de Uma Semideusa em Crise [ᚠ] Conheça suas origensOnde histórias criam vida. Descubra agora