-Sou capaz de matar quem machucar você.
- Mas você não tem o mesmo instinto protetor em relação a minha filha. - ela comentou, afastando-se.
Marco suspirou, amargurado.
- Não basta que eu ainda tenha algum sentimento por uma esposa infiel? - escarneceu.
- Não! Não basta!
Ela andou para um canto mais afastado do jardim pensando que ele iria embora, mas Marco a seguiu, sombrio e ameaçador.
- Você não facilita nada!
- Não. - ela concordou virando-se pra ele. - Por que deveria, se você nunca facilitou nada para mim?
- Eu a protegi! - ele respondeu com voz rouca. - Outro homem teria deixado você e a criança morrerem de fome na rua!
- E por que não deixou? - Helena o desafiou, fitando-o com o queixo erguido. - Porque estava protegendo seu próprio orgulho. - respondeu. - Não há generosidade nenhuma nisso. - Voltou-se para o jardim. - Se está esperando gratidão eterna, esqueça. Não me fez favor nenhum permitindo que eu ficasse aqui. E, se quer saber, eu o responsabilizo por não nos ter protegido, quando sabia que estávamos correndo risco!
Ele soltou uma gargalhada curta e seca.
- Você é surpreendente, sabe? - zombou. - Não é para menos que se mantém bonita assim. A culpa não cria rugas nesta pele perfeita. Deve ser a receita para a eterna juventude!
- E qual é a sua receita? - ela retrucou, calando-se ao perceber o que acabara de dizer.
Depois de um silêncio incômodo, ele se manifestou:
- Para minha beleza, você quer dizer?
Helena vasculhou algo numa planta que nem ela mesma sabia o que estava procurando, somente para disfarçar as mãos trêmulas.
-Claro que não. - respondeu. - Eu jamais o chamaria de belo.
No instante seguinte, Helena viu-se aprisionada entre dois braços fortes.
- Você sempre me chamava assim. Subia em meu corpo, nua, os cabelos adoráveis e revoltos acariciando meus ombros, os braços apoiados em meu peito. Costumava olhar em meus olhos e dizer com comovente solenidade: "Você é tão belo..." em italiano.
- Pare! - ela implorou, os olhos fechados para evitar a torturante lembrança.
Impossível. Em sua mente, ressoavam suas próprias palavras: "Sei così bello..." Helena também se lembrou da paixão violenta que se seguia, do impacto selvagem que aquelas palavras tinham sobre Marco , da maneira quase desesperada, ainda que gentil, como ele a possuía.
- Você sussurrava aquelas mesmas palavras ao ouvido de seu amante? Ele ficava tão enlouquecido quanto eu?
Ela balançou a cabeça, assustada demais com aquele olhar impiedoso para falar.
- Pare com isso...
- Tem idéia do que senti ao imaginá-la na cama com ele? Maldição, eu a amava! Venerava o chão em que você pisava! Você era minha! Minha! Eu a despertei para o amor!
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Era uma vez... a dor de uma traição.
RomansaMarco e Helena se conhecem ao acaso, se apaixonam instantaneamente e se casam logo após, mais precisamente no final do ano de 1921 na cidade de São Paulo, quando a cultura e gastronomia da cidade estavam começando a se moldar. Foram as fazendas cafe...