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Ele a aceitou e o gesto deu-lhe forças para controlar-se. Parou de soluçar, levantou-se e aproximou-se da janela, evitando encará-la.

- Como está seu pai? - Helena perguntou, depois de um longo instante.

Ele não respondeu de imediato. Retesou o maxilar, como se tentasse novamente controlar as emoções.

- Está de cama - disse por fim. - A confissão deixou-o exaurido.

Giuseppe finalmente decidira contar a verdade ao filho. Estava tentando redimir-se ante o Criador. Pelo pecado que acreditava ter cometido ao expor Isa à enfermidade, precisara redimir-se, revelando o pecado que cometera ao tentar.separar o filho da esposa. Pobre e atormentado velho!

- Sinto muito. - Helena murmurou, sem saber exatamente o que dizer.

- Você está dizendo isso? No, no! Mi scusi. Eu peço desculpas. Não posso... - Ele parou e engoliu em seco. - Mi scusi, cara, mas preciso deixá-la por um momento. - Começou a caminhar na direção da porta. - Voltarei assim que...

- Não, Marco! - ela protestou, correndo para o marido. - Preciso de você aqui. Nós precisamos de você aqui!

- Oh... sim... É claro que sim. - Então a abraçou.

- Venha sentar-se, por favor. Isa começou a se mexer um pouco hoje... Os dedinhos das mãos, dos pés... - Viu que Marco  fitava a filha com amor. - Vou sair um pouco está bem? Agora que você está aqui, posso tomar um pouco de café. Preciso disso.

No corredor, Helena se apoiou na parede, a mão trêmula massageando as têmporas doloridas. Além de ocupar-se de Isa, agora precisava preocupar-se com Marco , com Giuseppe e com... a mulher que o marido abraçara na festa. Atingida pelo ciúme, aprumou o corpo e foi até a lanchonete.

Ao retornar ao quarto, minutos mais tarde, percebeu que Marco, mais controlado, fitava a filha com um brilho esperançoso no olhar, como se a estivesse incentivando-a a superar aquele obstáculo.

Mais horas se passaram. Helena dormiu na cama de armar, e Marco  voltou ao hotel. Retornou pela manhã, com uma muda de roupa para Helena, que saiu para tomar um banho e se trocar. Ao retornar ao quarto, ficou paralisada. Marco estava sentado na cama, com Isa nos braços.

- Ela despertou neste instante - ele disse, os olhos marejados de lágrimas. - Minha filha me reconheceu!

Uma vez mais, Helena sentiu as pernas enfraquecidas, mas o médico que entrava a amparou.

Mais horas, mais espera, mais deliberações médicas até a confirmação oficial:

- Não houve sequelas. A criança foi trazida ao hospital a tempo. Mais uma semana e poderão levá-la para casa.

Voltaram à casa numa manhã ensolarada. Isa ainda estava fraca, ainda dormia a maior parte do dia, mas, assim que entrou na casa, ergueu a cabecinha, até então apoiada no ombro do pai, e sorriu, aliviada.

- Cadê o vovô? - perguntou.

Marco retesou-se.

- Esperando por você - assegurou. - Quer que Fábia a leve para vê-lo?

Isa passou, feliz para o colo da babá, deixando mãe e pai sozinhos na sala de entrada, tensos, cientes de que teriam que enfrentar a verdade.

Era uma vez... a dor de uma traição.Onde histórias criam vida. Descubra agora