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Carlos morava relativamente perto de mim pelo tamanho da cidade, era só seguir até a avenida e ir para o Bairro Longevidade, eu sabia de cabeça pois havia ido até lá infinitas vezes, tanto dirigindo, tanto sendo levado por minha mãe. Passou-se algum tempo enquanto eu passava pela avenida, as luzes me hipnotizaram por alguns instantes e eu comecei a sentir aquele arrependimento de novo, ele veio como um soco em meu estômago, uma dor quase física me atingiu. Sei que esse sentimento não faz sentido e então passo a pensar que ele pode ser um herdeiro da ansiedade, logo começo a usar a mesma técnica pra me acalmar e sentir cada vez mais a tranquilidade se instaurando em minha mente. Quase perco um pouco da concentração enquanto dirijo, mas como é uma avenida com muito espaço há poucas chances de algo acontecer comigo e com o carro.

Após alguns minutos eu entro de volta nas ruas da cidade e a cidade vai perdendo a sua cor, o Bairro Longevidade tem má fama em Aurora, ainda mais depois daquela história que contam que um corpo de um senhor teleportou de um banheiro de um bar pra dentro de um carro, tudo isso ligado ao famoso assassino Seis é claro. Pra ser sincero eu evito ver sobre esse tipo de assunto pra não ficar paranoico, com medo de andar na rua, e como minha memória anda ruim se eu vi algo sobre o caso eu esqueci.

Chego na frente da casa de Carlos, paro o carro e já puxo o celular mandando uma mensagem pra ele dizendo que estou na porta. Ele rapidamente responde e aparece no portão, saindo por ele e trancando-o sucessivamente. Ele é um cara alto, magro, de pele clara, cabelos emaranhados como um ninho, está usando uma calça jeans e sua clássica blusa de frio azul-escuro. Ele dá a volta, entra no carro e fecha a porta dizendo:

- Que frio do caralho puta que pariu - Ele me encara com seus olhos verde-escuro - Como diabos você não tá com uma roupa de frio cabeça de pica.

Eu dou de ombros e ele pega seu celular e começa a digitar algo, eu ligo carro dizendo:

- Onde você sugere da gente comprar as bebidas? - Eu começo a sair com o carro - Não tenho ideia de onde ir.

- Vai pra aquele atacadão aqui perto - Ele continua digitando em seu celular - Fiquei sabendo que algumas cervejas estão com desconto lá e alguns energéticos também.

Alguns segundos se passaram e Carlos continuava a digitar no celular, eu incomodado questiono:

- O que cê tanto digita nesse celular? Tá saindo com alguma mina?

- Quem me dera - Ele larga o celular e o guarda no bolso da blusa de frio - Tava respondendo a galera no grupo que você ignora.

- Hm - Continuei guiando o carro pela rua escura até virar a esquerda - E o que eles tão falando de importante?

- Nada demais - Ele junta ambas as mãos e assopra numa tentativa de aquecê-las - As vezes entendo você não falar nada lá, é meio inútil mesmo.

- Então - Eu dou de ombros - Meus atos tem uma razão cabível.

- Que jeito mais refinado de se falar, nem parece que é um fodido.

Ele dá um riso de canto de boca soltando um "humpf" e eu o acompanho, mesmo que aquilo me machucasse nós tínhamos intimidade o suficiente pra ele falar aquilo e não deixava de ser verdade. Após alguns instantes de mais silêncio nós chegamos ao atacadão, eu entrei com o carro no estacionamento e o estacionei numa vaga que tinha no canto. Nós descemos enquanto Carlos ia na frente com a cara enfiada no celular e eu fui de maneira normal tentando me concentrar no agora para aliviar aquela ansiedade que me corroía pouco a pouco por dentro.

Após isso algum tempo se passou, nós pegamos o que queríamos comprar, eu peguei duas caixas de cerveja e Carlos comprou duas garrafas de vodca e quatro energéticos, quando vi ele pegando essas merdas falei:

- Cê vai morrer desse jeito - Ele não usava mais o celular, segurava uma cesta com seus produtos na mão direita - Não sei como consegue beber essas merdas ainda.

- É a força da juventude me chamando - Ele aponta pra si mesmo com o polegar da mão esquerda - Quando a festa começar amanhã eu sou um a máquina de fazer merda.

Eu soltei um riso curto e fino enquanto ele seguia na minha frente em direção a fila do caixa. Ele avançou um pouco a frente enquanto caminhava rápido e eu o acompanhei até que senti algo agarrar meu braço. Ao virar meu rosto vi que era um homem negro, alto de sobretudo e chapéu, parecia estar nos anos trinta, ele segurou forte meu braço e disse:

- Espero que nosso trato ainda esteja de pé Heitor - Assim que me virei por completo ele soltou meu braço - Ou você já se arrependeu do que fez?

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