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5 de Março de 2022 - 21:44

Eu hesitei em descer, pensei em subir as escadas de volta e sair correndo, mas a curiosidade me segurou, me segurou com força, a única coisa que fiz de fato foi continuar descendo as escadas com um olhar tremendamente assustado na direção daquele homem.

- Não imaginei que fossem tão espertos - Disse o homem me encarando ainda com uma espécie de sorriso macabro na face - Mesmo com todos os obstáculos vocês conseguiram achar uma solução.

- Quem é você? - Disse descendo do último degrau - E o que você quer?

- Nós já nos conhecemos Heitor Viana dos Santos - Ele coloca as mãos para trás da cintura e começa a caminhar devagar na minha direção - E não é sobre o que eu quero, e sim sobre o que você quis fazer.

- Tá falando grego comigo - Respondi encarando ele no fundo dos olhos enquanto colocava o galão de gasolina no chão, ao lado da escada - Não tô entendendo nada.

- Logo tudo ficará claro para você, o trato logo será concluído.

- Que trato? Do que você tá falando?

- Sem mais perguntas, já estou ficando irritado com isso - Ele disse desfazendo o sorriso e ficando sério.

- Então por que está aqui falando comigo? - Questionei ficando ainda mais sério - Se não vai me responder nada, qual o motivo de você aparecer do nada?

- Sabe, eu tenho diversos nomes - Ele estava próximo o suficiente para me ferir, mas não fiquei com medo - Mas você conhece especificamente um deles, Luciano Fernandes e é dele que você vai se lembrar no fim de tudo.

Houve um tom agressivo em sua voz no fim da frase e ele rapidamente tocou minha cabeça com as pontas dos dedos da mão esquerda. Uma dor indescritível me atingiu e nesse instante eu sabia que eu já tinha conversado com esse homem antes, com Luciano Fernandes, mas não sabia quando, nem onde, nem porquê eu havia falado com ele. Senti minhas veias da cabeça pulsarem e ele tirou os dedos da minha cabeça dizendo:

- No fim de tudo você se lembrará. Mesmo que alguns resquícios tenham ficado, já que memórias são apagadas, sentimentos não.

Ele começou a subir as escadas, eu senti ainda mais dor na minha cabeça e uma gota de sangue quente escorreu pela minha narina direita, da mesma maneira que aconteceu ontem no início da noite quando eu estava parado na frente do latão com o fogo recém apagado no quintal de casa. Eu esfreguei os olhos com as mãos até a dor de cabeça passar, limpei o sangue do nariz com o braço da blusa de frio que estava em minha cintura e assim que Luciano chegou ao topo da escada e virou para a porta eu escutei gritos, vindos lá de fora. Eu corri rapidamente até o topo das escadas e Luciano não estava mais lá, ele havia desaparecido como sempre fez desde a primeira vez que o vi no mercado, ou melhor, tenho certeza que essa não foi a primeira vez que nos vimos, eu com certeza havia visto ele antes, só não lembrava quando, merda de problema de memória.

Eu corri na direção da saída passando pelas portas duplas e fui na direção de onde os carros estavam, chegando na garagem eu vi no pasto, onde os carros estavam, Troco tinha o braço afundado no capô do carro de Olívia e elas saíam correndo de dentro do carro.

Como Troco chegou aqui tão rápido?

Eu arranquei na direção deles, vi Carlos gritar do outro lado tentando chamar a atenção dele, mas ele o ignorou e correu atrás de Martha.

Eu me aproximei mais e consegui chegar onde Carlos estava.

- Cadê Leo? - Eu dizia em meio a respiradas fundas - Por que ele não conseguiu distrair a merda do monstro? E como ele chegou aqui tão rápido?

- Não sei, precisamos ajudá-las - Ele correu na direção de Troco que avançava na direção de Martha - EI ABERRAÇÃO VEM AQUI!

Ele o ignorou e eu acompanhei Carlos. Gabriel e Rob estavam no Golf, ouvi Gabriel ligar o carro, os faróis acenderam e ele arrancou na direção de Troco, Martha notou o que Gabriel ia fazer, todos nós notamos, ela jogou seu corpo para o lado e Gabriel arrancou numa tentativa de atropelar o monstro.

Mas infelizmente nada podia dar certo, o carro amassou e bateu em Troco como se tivesse batido numa pilastra de concreto. Ele apenas ficou parado alguns segundo, estava de costas para o carro, ele se virou rapidamente, enfiou a mão pelo vidro e segurou o pescoço de Gabriel e urrou:

- TRÊS, TRÊS, TRÊS! - E enquanto puxava o corpo de Gabriel esmagando sua cabeça contra o vidro diversas vezes seguidas, seus cabelos balançavam enquanto isso - QUATRO! QUATRO! QUATRO! QUATRO!

Cada palavra uma batida, Gabriel parou de gritar na terceira, foi quando Rob saiu correndo e gritando do carro se aproximou de mim e de Carlos, Olívia ajudava Martha a se levantar. Quatro haviam morrido, três que eu me importava, por minha culpa. Um tiro foi ouvido e Leo se aproximava mirando o rifle na coisa e então gritou, pela primeira vez que vi na vida:

- MARTHA, OLÍVIA, ROBERTA, VÃO PRO CARRO QUE RESTOU! - No caso era o Santana da minha mãe - CARLOS E HEITOR, COMECEM O INCÊNDIO EU LEVO ELE ATÉ LÁ!

Zero comoção pela morte de Gabriel que tinha seu corpo jogado dentro do Golf GTI, sua cabeça estava esmagada contra o vidro da frente, vidro esse que agora estava quebrado, talvez estivéssemos ficando acostumados. Martha, Olívia e Rob foram até o Santana, Carlos se aproximou correndo de Olívia deu a chave do carro pra ela. Nisso eu já ia em direção a casa e Carlos logo me acompanhou, mais tiros ecoaram no vazio pasto escuro e Leo parecia que ia conseguir segurar Troco por mais alguns poucos minutos. As três meninas entraram no Santana e avançaram até a estrada e ficaram lá paradas com os faróis acesos esperando a gente lidar com Troco.

Troco estava indo em direção a Leo, que dispara seguidas vezes em seu corpo, mas as balas pareciam cada vez fazer menos efeito, ele notou isso e começou a correr na nossa direção, então gritou:

- VÃO LOGO, ACELERA - Ele corria enquanto Troco se recuperava e começava a correr atrás dele.

Eu e Carlos corremos, entramos na casa, eu acendi o papel com o isqueiro prateado, entreguei a Carlos e ele jogou numa das poças de gasolina que havíamos jogado ali mais cedo e a chama subiu rapidamente e começou a se alastrar.

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