IX. Visões do Passado

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Dias... Anos... Séculos talvez; não se podia dizer ao certo quanto tempo já se passara desde que o valente Aethel viajara para o casarão dos Blake (viagens entre realidades distintas são assim, cheias de contradições, incoerências e imprecisões, como se movidas por um relógio quebrado em 1789 que ainda marca a hora para certo desfile real (esse com chá e biscoitos para acompanhar) em 2022), mas parecia muito tempo.

Tudo que o rapaz podia dizer era que já não estava na caverna, mas no que parecia ser algum tipo de gramado fofo, iluminado por tochas...

Mas as tochas eram casas em chamas; para seu horror, uma vila estava queimando.

Correndo para ajudar os aldeões, tudo que pôde encontrar foi uma casa incendiada onde um garotinho de 8 ou 9 anos se escondia, em meio a móveis caídos.

Aethel olhou nos olhos daquela criança, cinzentos e profundos, ficando sem reação: o rapazinho tinha cabelos negros, lisos e bagunçados, calças e sapatos simples, típicos de um camponês da alta idade média, túnica que ia até os joelhos, com capuz, mangas que iam até os punhos e um cinto que, a bem verdade, não passava de uma corda simples.

Tudo era simplista, cinzento, sem cores para alegrar, mas o que mais chamou a atenção de Aethel foram as lágrimas do garoto, seguidas de um olhar que era um misto de medo e fúria.

De repente, a casa foi arrombada por um grupo de quinze homens armados, trajados com coletes feitos do que pareciam ser camadas de tecidos sobrepostas, escudos redondos com detalhes em ferro, capacetes também de ferro e espadas com rastros de sangue...

O discípulo de Merlin já havia entendido tudo, a aldeia do garoto estava sendo atacada e, provavelmente, sua família e boa parte dos moradores haviam sido massacrados por ordem de algum tirano local.

Desarmado e com um garoto indefeso ao lado, Aethel jamais poderia lutar com tantos adversários, então segurou nas mãos do menino e correu com ele, na esperança de tirá-lo daquele lugar contaminado pela violência e destruição.

O rapaz correu com aquela criança por uma trilha na floresta que, conforme os segundos preciosos passavam, parecia ficar cada vez mais escura, o que tornava o caminho ainda mais difícil.

De repente, o garotinho tropeçou e Aethel caiu junto com ele, rolando um morro de terra com grama, galhos e raízes, que muito machucaram os dois.

Levantando a cabeça, ambos viram os soldados se aproximarem, com cinco deles montados em cavalos, então Aethel pediu para o garotinho ficar atrás dele e procurar se ocultar em sua sombra; o discípulo de Merlin combateria os inimigos.

Neste momento, lembrou-se que ainda estava com sua adaga, o que não era muito, mas já seria um começo para desarmar alguns soldados estúpidos e surrupiar suas armas.

"Estão ali! Lembram das ordens, não deixem ninguém fugir!", gritou um soldado, bufando como um animal selvagem debaixo do elmo.

Aethel fechou os olhos por um instante, procurando esvaziar a mente e pensar no campo de batalha, em cada detalhe para, em seguida, abrir os olhos confiantemente, já tendo uma estratégia armada contra aqueles quinze tolos; primeiro, correu em direção ao soldado mais a frente, deslizou pela grama e, em um movimento rápido, cegou o adversário com um punhado de terra.

Cego, o soldado foi direto para chão e deixou a espada cair, ao que Aethel pegou-a e bloqueou o ataque do soldado que estava à sua esquerda, em um rápido movimento em "V", que terminou por assustar os cavalos e derrubar os soldados.

As espadas eram longas e menos afiadas do que se poderia imaginar, o que fez o rapaz lastimar não ter seu precioso arco em mãos; com ele, poderia se colocar em uma posição vantajosa e alvejar aqueles quinze desmiolados sem problemas! Mas tudo bem, a confusão já estava formada e os inimigos já haviam diminuído para apenas treze.

As Crônicas de Aethel: O Livro dos MagosOnde histórias criam vida. Descubra agora