Capítulo 8

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IAGO HÉRNANDEZ

As luzes da mansão de Montserrat destacavam-se na noite espanhola como um farol de poder e mistério. A arquitetura imponente, cercada por jardins que mais pareciam saídos de um conto de fadas, era um lembrete constante de que nem todo conto tem um final feliz. Algumas histórias, como a nossa, são tecidas com espinhos.

— Uau, bem humilde sua casa, hein? — Giordana saiu do carro, a voz carregada com aquele tom de ironia que ela parecia ter aperfeiçoado.

Observei-a por um momento, lutando contra a vontade de sorrir. O jeito como ela tentava desdenhar de tudo o que a cercava, enquanto seus olhos denunciavam a fascinação, era quase encantador. Quase. Mas eu não podia lhe dar esse gostinho.

— Os italianos não são os únicos com poder aqui, Pasíon — respondi, o apelido saindo com uma mistura de veneno e sedução que apenas ela conseguia despertar.

Ela apenas ergueu uma sobrancelha, sem dizer mais nada, enquanto os soldados se adiantavam para recolher as malas. A viagem de cinco horas até Montserrat foi silenciosa. Ela passou a maior parte dormindo, exausta depois do dia do casamento. Mas, mesmo assim, pude perceber como seus olhos se acendiam ao vislumbrar Barcelona. Agora, ao entrar na mansão, notei seu olhar se perder nos detalhes, uma pequena expressão de encantamento, rapidamente substituída por indiferença.

— Vamos entrar? — sugeri, já caminhando à frente. Ela me seguiu em silêncio, mas eu podia sentir o calor do seu olhar queimar minhas costas. Estava ciente de que aquela noite não seria fácil.

Assim que cruzamos o hall de entrada, o som das malas sendo arrastadas ecoou pela casa. Margot, minha governanta e a verdadeira dona desse lar, apareceu imediatamente, suas mãos firmemente plantadas na cintura, enquanto seus olhos passavam por cima dos óculos, analisando a bagunça que estávamos trazendo para sua preciosa sala de estar.

— Imagino que a senhora seja Giordana. — Margot dirigiu-se a ela, sem sequer tentar esconder o escrutínio no olhar. Giordana, por um breve segundo, parecia querer se esconder atrás de mim, um gesto tão sutil que poderia passar despercebido, mas não por mim. — Você é tão linda. Eu sou Margot. — A velha senhora avançou, ignorando qualquer formalidade, puxando Giordana para um abraço caloroso.

— É um prazer conhecê-la — Giordana murmurou, hesitante.

— O prazer é todo meu, minha linda. — Margot afastou-se, sorrindo com uma sinceridade que eu raramente via. — Tasha, venha aqui!

Sussurrei para Giordana, enquanto aguardávamos:

— Tasha é a sobrinha de Margot. Os pais dela morreram em um acidente... um caso que nunca foi totalmente resolvido. Desde então, Margot cuida dela como uma filha.

— Que triste — Giordana respondeu, suavemente.

Não demorou muito para Tasha aparecer, ainda vestida com o uniforme que Margot insistia que usasse, apesar de meus repetidos pedidos para que ela se vestisse de maneira mais confortável. Giordana não hesitou; caminhou até Tasha e a abraçou com uma intensidade que me surpreendeu.

— É um prazer, sou Giordana — apresentou-se, sorrindo calorosamente.

— Eu... eu... bom, meu... meu nome é T... Tasha, senhora — ela gaguejou, envergonhada, antes de retribuir o abraço.

— Nada de "senhora". Me chame de Giordana ou Gio — insistiu, suavemente.

— Tudo bem — Tasha concordou, um sorriso tímido surgindo em seu rosto.

— Que bom que já se conheceram — Margot interveio, sua voz firme como sempre. — Agora, vocês podem levar essas coisas para cima. E vocês dois — ela nos lançou um olhar que misturava autoridade e carinho —, podem subir e tomar um banho. Vou terminar de preparar o jantar com as outras.

— Sim, senhora — respondi, já segurando Giordana pela cintura, guiando-a pelas escadas, sentindo o calor do seu corpo contra o meu enquanto subíamos. Era uma provocação, uma forma de testar os limites do seu autocontrole, e também do meu.

— Esse é o meu quarto, o seu é aquele ali — indiquei, ao chegarmos ao topo da escada.

— Entendi. Obrigada — respondeu, sua voz calma, mas com um leve tom de surpresa que ela rapidamente tentou disfarçar. Sem mais uma palavra, ela entrou no quarto e fechou a porta.

Fiquei ali por um momento, encarando a porta fechada, tentando ignorar a sensação incômoda de que algo estava prestes a explodir. Sacudi a cabeça e entrei em meu próprio quarto, jogando-me na cama com um suspiro. A maciez dos lençóis não fazia nada para acalmar a tempestade que se formava dentro de mim.

Depois de alguns minutos, decidi que um banho seria o melhor remédio para clarear as ideias. A água fria correu pelo meu corpo, tentando lavar o cansaço e a tensão que eu carregava desde o casamento. Mas a verdade é que nem a água mais gelada seria capaz de apagar o fogo que queimava quando eu estava perto dela. Vesti uma calça de moletom, deixando o peito descoberto. O reflexo no espelho mostrava um homem calmo, mas por dentro, eu sabia que estava tudo menos isso.

Ao sair do quarto, fui surpreendido pela figura de Giordana parada ao lado da porta, me observando com um olhar fixo.

— O que faz aqui? — perguntei, tentando esconder o nervosismo que sua presença me causava.

— Moro aqui, lembra? — ela devolveu, com aquele tom debochado que me fazia querer... bem, o que exatamente? Beijá-la ou mandá-la para o inferno?

Eu revirei os olhos, tentando não sorrir.

— Estou te esperando para descermos juntos — acrescentou, sua voz agora mais baixa, quase vulnerável.

— Tudo bem. — segurei sua mão, notando como estava fria e trêmula. Descemos as escadas em silêncio, nossas mãos ainda entrelaçadas, como se estivéssemos ambos tentando encontrar uma forma de romper essa tensão que se arrastava entre nós.

Na sala de jantar, nos sentamos lado a lado, a proximidade quase insuportável. Cada movimento, cada respiração parecia uma provocação. Eu sentia o calor de seu corpo próximo ao meu, o perfume suave que ela usava parecia se infiltrar em meus pensamentos, deixando-me dividido entre a razão e o desejo.

Margot e as outras chegaram com os pratos, interrompendo o silêncio pesado que pairava entre nós. O jantar transcorreu em uma dança silenciosa de olhares e palavras contidas, uma batalha entre o que queríamos e o que estávamos dispostos a admitir.

Naquela noite, sabia que a verdadeira luta ainda estava por vir, não entre inimigos declarados, mas entre nós dois, que fingíamos odiar aquilo que mais desejávamos. Um ao outro.

A Inabalável- Nova Era 6 - Conto Onde histórias criam vida. Descubra agora