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Assim que saí da faculdade fui direto para o meu novo lar, já fazia quatro dias em que eu havia mudado, fiz uma comida enlatada para comer, afinal mais tarde eu iria á casa dos meus pais e eles com certeza iriam me empanturrar de comida. Então preferi uma comida mais fácil de preparar.

Tentei me concentrar nos livros, mas minha mente estava totalmente aérea, não conseguia me concentrar na leitura, então joguei os livros de lado e peguei o celular e para minha surpresa havia uma mensagem de um número desconhecido e assim que cliquei a imagem de Mikhael apareceu:

" _ Eu aceito o seu desafio, irei com você no almoço na casa de seus pais."

Esbocei um sorriso, aquele cara era mesmo inacreditável, balancei a cabeça olhando para o visor do celular, pensando se deveria responder a mensagem ou não.
Depois de muito pensar escrevi:

"_ Isso será bom para ampliar o seu conceito de família"

Assim que ele visualizou a mensagem já começou a responder:

" _ Não se esqueça que isso é uma via de mão dupla, eu aceito ir ao almoço e você virá a sinagoga comigo no outro final de semana"

Respirei fundo antes de começar a digitar:

"_ Sou um homem de palavra, meus pais me ensinaram a honrar o que eu digo"

"_ Isso não precisa ser ensinado é o dever de toda pessoa de caráter."

Ele jamais daria o braço a torcer, isso me fez rir, de fato ele tinha um pouco de razão, meus pais ensinaram-me com o exemplo, eles nunca precisaram me falar sobre honrar a palavra, mas eu aprendi vendo os dois fazendo isso.

Cheguei a casa dos meus pais uma hora após, mas resolvi não comentar nada sobre o Mikhael com eles:

_ Como você está meu filho?

_ Estou bem pai.

_ Você não me parece tão bem filho, é impressão minha ou você emagreceu, anda comendo direito filho?

_ Pai Beto me ajuda a explicar para o pai Jean que não tem nem uma semana que sai de casa, que não tem como ter emagrecido tanto ao ponto dele notar.

Abracei o meu pai Jean e depois abracei o pai Beto que sorriu dizendo:

_ Quando tiver os seus filhos vai entender que quando o filho perde uma grama você irá notar.

_ Falando nisso, tudo certo para o almoço?

_ Sim, todos confirmaram que virão, seu avô Alberto é o que mora mais distante mais já avisou que virá com a Gláucia e a Helena.

_ Tudo está preparado filho, mas nos fala como está na faculdade?

_ Está bem, estamos estudando anatomia aplicada á medicina, vamos também ter bioquímica I, biologia celular e molecular entre outras matérias nesse primeiro período.

_ É um trabalho gratificante Gillian, cuidar de outras pessoas, mas tem que ter vocação, pois tratar de doenças e perdas não é para qualquer um.

_ Eu sei pai, cresci com um médico em casa, vi muitas vezes como chegava esgotado do hospital.

_Mas eu não me arrependo de ter escolhido essa profissão.

_ O senhor sabe que eu me inspirei no seu trabalho e dedicação para escolher essa área não sabe doutor Jean. Vocês dois são os meus maiores exemplo.

_ Já sabe em que área vai querer atuar Gillian?

_ Por enquanto estou pensando em medicina neuromuscular.

_ Essa área é a que trata diretamente de Esclerose Lateral Amiotrófica, Neuropatias, Distrofias Musculares, Miastenia gravis. É uma área que você presencia diariamente de muito sofrimento, pacientes com dores e cicatrizes profundas.

_ Eu fui escolhido para ser o seu filho, exatamente por causa de cicatrizes que o afligiam pai, na época o pai Beto ainda não havia surgido nas nossas vidas e o senhor sofria pela perda do pai Gillian, tanto que me deu o nome dele.

_ Você tem toda razão meu filho. Eu tenho muito orgulho de ter te escolhido.

Fiquei ainda até o anoitecer com eles e depois retornei ao meu apartamento, o silêncio a certo momento era tão intenso que liguei o som colocando uma música para distrair a mente, pois o silêncio me fazia ter pensamentos que sabia que não deveria ter. Não era por que Mikhael aceitara a ir ao almoço que eu poderia cogitar a ideia de ficarmos um dia juntos.
Entretanto por mais que a razão me dissesse que a ideia de que nós dois um dia poderíamos ficar juntos era utópica a imagem dele vinha nítida a minha mente, todo aquele jeito tímido, aquele jeito de quem precisava de cuidado me trazia uma certa inquietação, algo que jamais senti por outro alguém.

Não tinha como negar a beleza de Mikhael, o charme, tudo isso era inegável, mas o nível de complicação se igualava, quando eu pensava em encontrar alguém o que menos imaginava era encontrar alguém com um pensamento tão retrogrado quando o dele, chegava a ser absurdo que alguém nos dias atuais pensasse da forma como ele pensava, que uma família só se juntava para reprodução, isso era ridículo.

Mas então por que não conseguia tirá-lo de minha mente?

Sempre imaginei que quando começasse a se interessar por alguém, seria alguém com o mesmo pensamento que eu, que iríamos caminhar juntos no mesmo passo, com a mesma mentalidade, mas aí conheço uma pessoa com um pensamento ultrapassado e sem mais nem menos não consigo tirá-lo do pensamento. Isso só poderia ser ironia do destino.

Peguei novamente o celular olhando a mensagem dele, mas foquei ainda mais na foto de seu perfil, fiquei olhando-a por um longo tempo principalmente na área dos lábios, me peguei imaginando tocando-os, contornando-os com os dedos e enfim o beijando, fechei os meus olhos para espantar aquela visão que parecia ainda mais nítida, quase palpável, só não era mais pela ausência dele.

Toda essa reflexão durou a noite toda e eu apenas cochilei, despertando duas horas depois quase no horário da faculdade, como não tinha mais os meus pais para me despertar, assustei-me com o barulho do alarme e quase caí do sofá onde sentei-me na noite anterior e ali mesmo adormeci.

Tomei um banho rápido apenas para despertar o corpo e tomei um copo de suco natural de laranja que havia feito antes de ir à casa dos meus pais, mordi um pedaço da maçã deixando o resto em cima da mesa e fui rápido a faculdade. Quando cheguei faltava cinco minutos para fechar a portaria.
Fui correndo para aula e sentei-me ao lado de Mikhael:

_ Está atrasado.

_ Bom dia para você também.

_ Por que se atrasou?

_ Por que fiquei pensando em você.

_ O que?!!!

Eu faço o meu próprio paraísoOnde histórias criam vida. Descubra agora