Memórias do Último

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Possuir poderes mágicos era um privilégio que nem todos os seres humanos tinham. Nascer com uma grande fatia desse poder, então, era ainda mais privilégio. Ter o potencial para se tornar um mago era para os poucos sortudos que nasciam agraciados pelos deuses e por suas famílias que criavam covens para que seus descendentes tivessem ainda mais chances de nascerem assim.

Obviamente, nem sempre nascer com grandes quantidades de magia era uma benção.

Existia uma doença rara que afetava pessoas mágicas. Quanto menos magia, menos elas eram afetadas. Em escalas menores, a doença causava fadiga constante, confusão mental e falta de apetite, que poderia causar desnutrição. Aqueles sintomas eram facilmente tratáveis com poções e acompanhamento de curandeiros.

Por outro lado, bebês e crianças nascidas com grandes quantidades de magia, às vezes não sobreviviam nem mesmo ao parto. Conhecida como doença de magos, ela era considerada quase uma maldição. Rohan imaginava se seu irmão havia falecido por tal doença, dentro da barriga de sua mãe, pois em meio a conversa dos adultos, ouviu aquela possibilidade ser discutida.

Quem estudava a doença dizia que o corpo portador de magia poderia ser frágil demais para suportar toda aquela energia concentrada. A magia, então, se tornaria um parasita que enfraqueceria cada vez mais a pessoa. Os raros casos graves de bebês que sobreviviam, resultava em ossos frágeis, paralisia das pernas, constantes dores nos músculos e até mesmo cegueira. Era uma doença triste que, aos poucos, deteriorava a pessoa que conseguiu sobreviver a ela. O tratamento possível, porém caro, e deveria ser constante, caso contrário...

Apesar de ser uma doença conhecida, era absolutamente estranho uma pessoa ser curada quando criança e não demonstrar mais sintomas por anos... até que voltasse a sofrer na adolescência. Mas já havia aprendido há muito, muito tempo, que a vida tinha seus meios de surpreender negativamente os seres humanos...

***

— Ei, você... veio aproveitar a noite? — O homem de meia idade perguntou com um certo sorriso muito específico.

Ele sabia que tipo de sorriso se tratava... depois de meses, era fácil entender aqueles olhares e trejeitos absolutamente repugnantes. A frase também era extremamente manjada, todos os homens usavam ela e algumas variações como se estivessem disfarçando alguma coisa.

— Sim. — Respondeu, quase ríspido. Algumas pessoas haviam lhe dito para não tratar assim possíveis clientes, mas era impossível manter um sorriso no rosto ou alguma cordialidade. Por isso, respondia apenas monossilabicamente.

— Quanto? — O homem perguntou, com um sorriso ainda maior enquanto se aproximava. Aquele local era escuro, mas não era como se realmente precisasse se esconder demais, afinal, aquele bairro era evitado pelo resto da população pela má fama que recebia. Quando aquele cidadão tentou tocar sua face, segurou fortemente seu pulso, olhando-o com fúria nos olhos.

— Quinze peças de prata. — Respondeu, grosseiramente.

— Entendi, entendi... nada de tocar antes de pagar. — A figura mais velha pareceu achar graça daquilo tudo, e aquilo o enfureceu ainda mais, porém tentou se concentrar para não explodir e simplesmente arrancar o pescoço daquele cliente fora. Precisava do dinheiro... precisava do dinheiro... — Qual lugar?

Soltou rapidamente a mão do homem e virou-se de costas, caminhando para um local ainda mais escuro onde havia uma casa abandonada. Claro, naquele lugar, não era exatamente abandonada. Os donos a deixaram ali, talvez pertencesse apenas ao Estado, mas pessoas usavam aquele local para trabalhos deploráveis.

A escuridão daquele recinto não era um problema para si. Já havia entrado várias vezes para ser capaz de reconhecer, sem enxergar, os corredores e cômodos. Então, segurou o pulso daquele homem com força e praticamente o arrastou para dentro de um deles.

Histórias de Sol e LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora