Capítulo QUATORZE

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KOR

Kor olhou para os dois vigias. Estava desacostumado com essa parte do dever de um sentinela. Fazia quase uma década desde que teve essa responsabilidade. Quando se encontrou com Vaugh e Leo mais cedo naquele dia, conteve a careta e o desconforto com a situação. Não podia demonstrar fraqueza ou nervosismo, sentinelas eram a força que refletia o Alpha.

Os dois vigias eram novos, mas tinham um espírito promissor e exalavam vontade de se provar. Vaugh e Leo subiram no posto recentemente e sabia que haviam outros esperando, mas não tinham sentinelas o suficiente. Talvez com o plano ambicioso de Roan, eles atingissem uma força considerável em alguns anos. Mais alguns sentinelas e novos vigias. Era um plano bom.

–Eu posso estar afastado do posto há dez anos, mas isso não significa que eu tenha ficado de coração mole.--ele disse, olhando para os dois vigias parados à sua frente em forma de lobo.--Eu não gosto de insubordinação e não tenho paciência para erros. Erros matam pessoas, erros põem o clã em risco.

Os dois lobos rosnaram para ele.

–Não gosto de jogar conversa fiada também, então não esperem longas conversas em seus turnos comigo.--ele olhou para o céu, que estava começando a nublar.--Nesse momento, estamos rastreando um ex-sentinela, Norm, que está tentando achar uma brecha em nosso território para levar uma mulher que está sob nossa proteção.--Vaugh e Leo levantaram as orelhas e mostraram os dentes, descontentes.--Não vamos deixar ele ter essa chance. Vamos fazer patrulhas ao Norte e Oeste, enquanto Foxy está fazendo ao Sul e Leste. Stone está ficando pelos arredores da comunidade, e Kyan na cidade. Vamos correr!

Kor não mudou, preferindo permanecer sobre as duas pernas. Ignorou a parte dele que se perguntou o porquê. Há apenas algumas semanas atrás, o pensamento de não estar em sua forma animal fazia sua pele se arrepiar. Agora, sentia que seu lado humano era necessário.

Durante o dia e parte da tarde, correram pelas fronteiras até a terra se tornar uma segunda pele sobre seus corpos. Cruzaram com os vigias de Foxy e Kyan em algum momento, até que o sol se pôs e satisfeito com o primeiro dia, liberou seus vigias. Estava cansado, mas não sentia que podia ir para casa. Precisava vê-la. Caminhou pela trilha de suas terras e seus ouvidos captaram o ruído do motor de um carro vindo em sua direção. Não pensou, apenas se viu parando no meio da estrada, e os faróis do carro o iluminaram. Ouviu um freio e uma porta se abrindo.

–Kor?--a voz de Faye soava confusa.--Eu quase te atropelei. Tudo bem?--ela hesitou parando com qualquer que fosse a expressão que estava em seu rosto.

–Faye.--ele andou em sua direção, parando a poucos centímetros dela. Sua mão tocou seu rosto e ela o fitava com olhos surpresos. Fechou os olhos e respirou seu cheiro. O farol do carro os iluminava, envolvendo-os em uma luz amarela e forte. Ele engoliu em seco, abrindo os olhos e absorvendo as perfeições das linhas de seu rosto.--Saia comigo.--se viu pedindo. Faye arregalou os olhos e uma cor bonita surgiu em suas bochechas.

–O que?

–Um encontro.

–Mas... Você me assustou.--ela parecia atordoada.

–Não estava pensando. Vim vê-la e ouvi o carro.--ele se justificou.

–Você é louco.--ela riu, balançando a cabeça.

–Saia comigo.--ele se repetiu, subitamente ansioso. Ela mordeu o lábio inferior e uma sombra passou por seus olhos a fazendo recuar.

–Kor, eu não sei quanto tempo vou ficar em Mayce.--falou. Ele piscou, pensando ter ouvido errado. Suas mãos caíram e ele se viu perdido.

–O que quer dizer?

–Tem coisas sobre mim, sobre os motivos que me fizeram vir para cá, que não contei a ninguém.--ela disse, baixo, quase como se estivesse contando um segredo e estivesse incerta.

–Charlie, sabe?

–Ela e Roan me buscaram na rodoviária.--ela deu de ombros.--Acho que desconfiaram que algo não estava certo.

–Alguém te machucou?--ele perguntou, uma onda de raiva e proteção lhe sufocando. Ela se abraçou e seu rosto tentou esconder a tristeza que lhe tomou.

–Eu não.. posso falar.--disse.--Não estou pronta.

Eles se entreolharam, ambos afogados em medo e confusão e tentando disfarçar ao mesmo tempo.

–Saia comigo.

–Você não me ouviu?

–Eu também tenho... coisas que não contei a ninguém.--ele confessou.--Não precisamos falar sobre essas coisas, as minhas ou as suas. Podemos apenas sair e falar sobre o tempo.

–O tempo?--ela arqueou as sobrancelhas, achando graça.

–Ou podemos não falar nada.--ele sugeriu.--Só quero te levar em um encontro.

–Você me confunde.--ela balançou a cabeça, com um sorriso no rosto.--Tudo bem, eu aceito.

Kor se sentiu o macho mais sortudo do mundo naquele momento. Ela o fitava intrigada e seu peito subia e descia rapidamente. Ele voltou a se aproximar e encostou seus lábios em sua testa.

–Eu venho te pegar amanhã à noite.--falou. Ela assentiu e ele a acompanhou de volta ao carro.

Kor a observou até seu carro virar e não poder mais ver as luzes traseiras. Começou a andar até estar próximo o suficiente, tirou as roupas e mudou para sua forma de lobo.

O lobo viu o carro estacionado ainda quente. Subindo a varanda, deitou montando sua vigília. Ali, o mais próximo de sua companheira que podia estar, finalmente fechou os olhos, descansando.

Na manhã seguinte, ele acordou com o nascer do sol, não querendo assustá-la como na primeira vez. Correu por alguns quilômetros ao redor de sua cabana, marcando mais o território com suas garras. E quando se deu por satisfeito começou a correr em busca de respostas.

O Coração de KorOnde histórias criam vida. Descubra agora