Capítulo DEZOITO

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STONE

O sentinela andou pela floresta em direção a sua casa que ficava em uma parte montanhosa da reserva, para qualquer um que não conhecesse a área, seria quase impossível avistá-la, e mesmo que a encontrasse, teria dificuldade em encontrar a entrada. Foi uma construção desafiadora, que exigiu paciência, trabalho e planejamento. Poucos o visitavam ali pois sabiam que apesar de ser um macho extremamente acessível, quando se retirava para sua casa, era porque queria ficar sozinho. De fato, fazia anos desde que alguém pisou os pés em suas terras. Cada indivíduo tinha seu pedaço de terra ali, era um benefício de se fazer parte do clã. Alguns preferiam viver na comunidade, outros, como ele, se isolavam mais na floresta. Roan, como Alpha, tinha que estar na comunidade.

Respirou o ar puro e seu lobo se esticou em sua mente satisfeito. Stone sabia que deveria permitir seu animal sair mais, correr solto. Mas tinha muito trabalho para fazer, muitas responsabilidades na cidade. Sua presença no dia a dia do clã era quase que desnecessária. Nos últimos nove anos acabou assumindo a posição de Executor do clã, quando Kor se mostrou indisponível para a função. Não reclamou, mesmo não sendo sua natureza. O Alpha precisava dele. Então, simples assim, se tornou o executor.

Mas seu irmão estava lentamente de volta, e com certeza uma certa humana podia ser a razão para isso. Companheiros, uma raridade de fato. O lobo rosnou em sua mente e ele ignorou. Ultimamente ambos viviam em desacordo. E seu controle já precário, balançava. O lobo queria a ruiva. O homem sabia que não era tão simples. O lobo estava confuso. O homem estava frustrado.

O vento mudou de direção e ele parou, chocado consigo mesmo por não ter sentido a pequena presença antes. Virou lentamente e correu ao redor, surpreendendo a pequena loba que o seguiu. Ele a ergueu pelo cangote e mal conteve o sorriso.

–O que faz aqui, pequena?--perguntou para a loba que se contorceu, de língua para fora. Ele levou a loba para os braços e ela lambeu seu nariz, abanando o rabo.--Aiden, sua mãe sabe que está aqui?

A loba rosnou. Stone suspirou, cansado e ansioso para ir para cama. Estava tão perto...

–Vamos te levar de volta.--falou, colocando-a no chão e a loba começou a morder seu sapato de couro. A fitou e um aperto no peito o fez perder a respiração por um minuto.

A menina estava começando a segui-lo.

Queria dizer que não era nada fora do comum, que era um sentinela e as crianças costumam admirar tal posto, na esperança de um dia se tornarem um. Mas os filhotes, ficavam na área permitida pelos adultos e onde Aiden estava não era o caso. Ela estava ali por causa dele. O lobo parecia protetor com a pequena, rondando sua mente em alerta. A menina era um mistério para ele, já que a mãe se recusava a dizer quem era o pai e ela por sua vez não parecia curiosa quanto a sua origem. Filhotes eram muito apegados aos pais. Aiden apenas era apegada à mãe e agora... estava se apegando a ele.

Finalmente avistou o dormitório feminino após uma caminhada de vinte minutos. Era um prédio de quatro andares e quarenta quartos, construído em tempo recorde e que supervisionou pessoalmente. Se tornou necessário após o ataque de Beur, já que muitas mulheres, filhas e mães que perderam seus familiares, não queriam mais viver em uma grande casa, sozinhas. Ali, os órfãos e mães se encontraram e formaram uma família única e funcional. Uma voz alarmada o fez apressar o passo e logo avistou o cabelo flamejante de uma ruiva entre várias mulheres igualmente preocupadas. Aiden correu na direção da mãe e a mesma se virou sentindo a presença da filha.

–Aiden!--gritou, se ajoelhando no chão e pegando a loba. Lágrimas derramaram em seu rosto e ela amassou a filhote contra si.--Onde se meteu? Você sabe que não deve sair sozinha!

A loba chorou e lambeu o rosto da mãe, pedindo desculpas.

–Stone, você a achou?--Geeny, uma das fêmeas mais queridas do dormitório e responsável pelas crianças perguntou. A atenção de todos se voltou para ele. Ele não percebeu que havia se aproximado e estava observando as duas até ser chamado. Limpou a garganta, desviando os olhos.

–Ela me seguiu.--confirmou. Kate levantou e Aiden se contorceu em seu colo. Geeny se adiantou a pegando.

–Vou levá-la para um banho. Deve estar exausta.--falou, olhando para a pequena com censura e ao mesmo tempo carinho.

Kate assentiu e agradeceu as mulheres pela preocupação que causou, se desculpando por Aiden. As mulheres apenas pareciam aliviadas por Aiden estar segura e se dispersaram, deixando os dois sozinhos. Kate o fitou e Stone se obrigou a permanecer frio e distante. Mas como todos os dias que a via, ela parecia estar ainda mais bonita. Alta e elegante. Com a pele perfeita que contrastava com a cor vermelha de seu cabelo. Usava um suéter rosa que subia até o pescoço e jeans claro. Parecia uma modelo e um sonho.

–Peço perdão por Aiden. Ela finalmente começou a mudar de pele, e agora mal consigo mantê-la sob minhas vistas.--ela falou. Seu rosto ainda estava manchado pelas lágrimas. Stone balançou a cabeça, irritado consigo mesmo.

–Foi um erro meu. Estava distraído e não a vi me seguindo.--explicou.--A trouxe assim que a peguei.

–Oh, que bom.--ela assentiu. Eles se entreolharam num silêncio desconfortável.--Minha filha parece estar apaixonada por você.--ela corou, rindo sem jeito.--Foi todo aquele sorvete que trouxe para o dormitório. Geeny passou dias reclamando sobre isso. As crianças ficaram loucas de açúcar.

–Acho que devo a Geeny um pedido de desculpas.

–Obrigada, pelo sorvete, sabe. Nós não tínhamos isso lá.--ela confessou. Stone sentiu um gosto amargo na boca. Elas nunca tinham provado sorvete?

–Quantos anos Aiden tem?--ele perguntou. Kate endureceu, os muros subindo diante de seus olhos.

–Quase cinco.--ela disse.

–Ela parece mais nova.

–Ela não estava se desenvolvendo bem onde vivíamos.--ela respondeu.--Lobos não nasceram para ficar em locais fechados.

–É verdade.

–Mas ela vai ficar bem. Geeny me garantiu que o importante foi tirar ela cedo de lá. Logo não vai mais se lembrar de nada de antes.

–Isso é verdade. Geeny é formada em psicologia, uma muito boa.

–Ela tem sido ótima com Aiden.--ela afirmou, olhando para os pés.--Como meu irmão tem estado? Soube que ele é seu vigia.

–Ele tem se saído muito bem. Não diga a ele, mas se continuar nesse caminho e se provar para o Alpha, poderá subir.

–Subir? Se tornar um sentinela?!--ela o fitou surpresa.

–Sim, claro. É o próximo passo.

–Isso é bom, eu acho.--ela pareceu pensar no que havia ouvido. Stone queria tocar em seu rosto, limpar suas lágrimas e a sacudir.

Ela não sentia o que ele sentia?

–Precisamos conversar.

Seu tom saiu um pouco mais duro do que deveria, mas não podia mais esperar. De repente a conversa com Kor voltou a sua memória. Ela precisava saber.

O Coração de KorOnde histórias criam vida. Descubra agora