O direito de permanecer calada

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É muito difícil localizar o Kennedy, porque eu percebo que, apesar de estarmos meio ficando, eu não sei sequer o sobrenome dele. Já é fim de noite, quase madrugada, e o Harvey's está completamente morto e vazio. Eu me ajeito na banqueta, apoiando os cotovelos na bancada.

— Qual é? Não podem existir tantos Kennedys assim na cidade — reclamo desligando a chamada.

Deixo o celular cair no balcão com um suspiro. É o terceiro hospital que eu tento, ainda falta um bocado. Preciso saber como ele está.

Viro um gole de uísque na boca, que Tabitha me serve como cortesia da casa ao perceber o quanto estou frustrada. Christian conseguiu estragar o que era para ser a minha noite, e eu o odeio em dobro por isso. E o odeio em triplo por ter ferido o Kenny. E o odeio em quadruplo por respirar. É tão errado assim desejar a morte de alguém?

— Sinto dizer, mas é a última dose, Kardashian — a barista avisa. — Vou fechar o bar em cinco minutos.

Solto um grunhido arrastado.

— Nem tenho onde passar a noite. Se eu voltar para casa o Christian me mata, e não estou dizendo isso de um jeito figurativo.

— É tão sério assim?

Assinto.

— Ele não hesitou para atirar no mágico.

Tabitha suspira.

— Pode ficar lá em cima por umas noites se quiser — oferece. — Tem um sofá velho do Harvey que ninguém usa mesmo.

***

A casa abandonada do Harvey não é o lugar mais limpinho e aconchegante para se acomodar. Na calada noturna, parece sombria e mal-assombrada, mas é onde passo a noite escondida de Chris.

Não durmo. Perco a madrugada em claro ligando para um hospital e outro, sem conseguir qualquer informação sobre Kenny. O dia amanhece e eu estou parecendo um urso panda exausto.

Pode parecer loucura, mas eu preciso de notícias dele. Notícias que só o Chris pode dar, então junto a minha coragem para voltar para casa e encará-lo.

— Olha quem resolveu aparecer. — Christian apoia no batente ao abrir a porta. — Sempre voltando como uma cadelinha com o rabo entre as pernas, né? Depois daquele escândalo que você fez na frente de todo mundo, pensei que não ia ter estômago para me encarar.

— Do escândalo que eu fiz? — Consigo dizer. — Você atirou no meu vizinho!

— Ah. Relaxa que seu amante está bem. Está sendo transferido do hospital direto para a delegacia. — O tom de voz agressivamente irônico. Eu engulo em seco. Não acredito que isso está acontecendo. — Parece que meus instintos nunca erram, afinal. Mencionei que o cara estava em condicional? Foi bem fácil enquadrá-lo assim.

— Você prendeu ele!?

— Claro, boneca. — Sorri de canto. — Eu levo meu trabalho a sério. Agora é a sua vez. Mãos na parede.

— Chris...

— Mãos na parede! — Ele ordena mais sério.

Eu estou tão acostumada a receber esse tipo de ordem dele, que simplesmente não consigo evitar. Faço. Encosto as duas palmas e engulo em seco.

— Barbara Vazquez. — Ele puxa as minhas duas mãos sem qualquer delicadeza e as prende atrás do corpo com uma algema. — Você está detida por falsificação, roubo qualificado e desrespeito a autoridade.

— O quê?

— Tem o direito de permanecer calada. Tudo que você disser pode e será usado contra você.

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