Bento
Bom dia? Que horas são? Que dia é esse?
Ok, eu apaguei mesmo com os remédios, mas não imaginava que duraria a noite inteira, o que tecnicamente é ruim e bom ao mesmo tempo
Normalmente, minhas noites são bem perturbadas: acordar ao meio da noite e ficar sem sono e, daqui a pouco, apagar ou ter sonhos estranhos e assustadores. Dormir a noite inteira vai entrar para história ultimamente
Me levanto para fazer minhas necessidades higiênicas e não higiênicas. Faço tudo que preciso e escuto batidas seguidas na porta
- Sessão de quimio - escuto atrás da porta uma voz feminina
Abro a porta e lá está o meu médico, Antônio. E a Joana atrás dele, parecendo um poste ao lado dele
- Bom dia - digo, bem desanimado -, ótimo jeito de se acordar: colocando um tubo na minha veia
Vejo a Joana revirar os olhos
- Se você quiser, a gente esquece suas sessões e o câncer dentro de você se manisfesta e Bum! Morreu
Riu com o comentário e sim, ela está falando sério
Me deito e me sento ao mesmo tempo na cama, esticando o braço
Sinto uma picada e fecho os olhos. Odeio ver, sempre olho para o lado ou fecho os olhos
- E aí? - escuto o meu médico dizer - Você já procurou um psicólogo como te indiquei?
Balanço levemente a cabeça, negandoQual é o problema das pessoas acharem que eu estou depremido só porque fico mais no quarto, lendo e fico mais calado? Tudo bem, isso pode indicar depressão? Sim, mas eu não quero procurar um psicólogo por isso, eu já me acostumei
- Eu estou bem assim - respondo - A minha vida hoje em dia é bem monótona: sessões de quimioterapia, ficar num quarto de hospital, ter que ver as pessoas mais próximas de mim com máscaras. Então isso não é um pedido de ajuda - ou é -, tá tudo bem
Bom. Odeio ter que admitir, mas, infelizmente, isso é verdade. Ficar trancado num quarto é o mínimo que posso fazer, é sério, eles reclamam disso; eu estaria surtando, então isto não é nada em comparação
- Seu estado está melhor - ele comenta, do nada -, um pouco melhor
Ótimo. Resumindo de novo: quase nada, mas tudo bem
Toc, toc, toc... Minha atenção volta para porta
- Entra - digo baixo, mas o suficiente para escutarem
Meu irmão entra de imediato e se senta no chão, tão rápido que meus olhos não conseguem acompanhar
- Você não acredita! - ele diz, e antes que eu pergunte o que é ele me responde - Sabe aquela vaga de emprego que você tanto queria? Pois bem, aquele garoto que sempre implicou com a gente? Ele tá com a vaga
Balanço a cabeça, indicando que continuasse. Ele quer continuar
- Então, ele é péssimo. Tipo, péssimo mesmo. Você com certeza é melhor
Era, corrijo mentalmente. Eu era melhor do que o garoto, que na verdade se chama Zangado -um apelido que eu e meu irmão demos a ele na quinta série por conta do seu tamanho- na natação e em tudo, não querendo me gabar mas já me gabando
Ele quase se afogava tentando boiar. Tentando boiar! A coisa mais simples da natação!
- Coitados dos alunos - digo, e meu irmão solta uma risada - É sério. É capaz d'eles se sentirem no Titanic - e foi aí que eu escuto gargalhadas por toda a sala.
Meu irmão olha para o medicamento entrando no meu sangue
- E aí? - ele pergunta - Não querendo parecer insensível, mas... Isso dói?
- Pouco - respondo
- Ótimo - ele diz, e então apoia a cabeça no cotovelo - Eu sei que a gente se viu ontem, mas eu já tenho mais novidades que um site de fofoca
Só espero ele conta as "boas novas"
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WHITE ROSE GARDENS · HELOISA CARDOSO
Teen FictionSusanah Andrade, uma jovem e sonhadora aspirante à atriz, foi contratada para um ótimo papel no novo projeto da comunidade teatral aonde trabalha. Encenando no hospital contra o câncer, Francisco de Braga, Rio de janeiro, ela atua como uma dos pacie...