Capítulo 7

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Bento

      Bom dia? Que horas são? Que dia é esse?

      Ok, eu apaguei mesmo com os remédios, mas não imaginava que duraria a noite inteira, o que tecnicamente é ruim e bom ao mesmo tempo

      Normalmente, minhas noites são bem perturbadas: acordar ao meio da noite e ficar sem sono e, daqui a pouco, apagar ou ter sonhos estranhos e assustadores. Dormir a noite inteira vai entrar para história ultimamente

      Me levanto para fazer minhas necessidades higiênicas e não higiênicas. Faço tudo que preciso e escuto batidas seguidas na porta

- Sessão de quimio - escuto atrás da porta uma voz feminina

    Abro a porta e lá está o meu médico, Antônio. E a Joana atrás dele, parecendo um poste ao lado dele

- Bom dia - digo, bem desanimado -, ótimo jeito de se acordar: colocando um tubo na minha veia

    Vejo a Joana revirar os olhos

- Se você quiser, a gente esquece suas sessões e o câncer dentro de você se manisfesta e Bum! Morreu

     Riu com o comentário e sim, ela está falando sério

     Me deito e me sento ao mesmo tempo na cama, esticando o braço

     Sinto uma picada e fecho os olhos. Odeio ver, sempre olho para o lado ou fecho os olhos

- E aí? - escuto o meu médico dizer - Você já procurou um psicólogo como te indiquei?

    Balanço levemente a cabeça, negando

    Qual é o problema das pessoas acharem que eu estou depremido só porque fico mais no quarto, lendo e fico mais calado? Tudo bem, isso pode indicar depressão? Sim, mas eu não quero procurar um psicólogo por isso, eu já me acostumei

- Eu estou bem assim - respondo - A minha vida hoje em dia é bem monótona: sessões de quimioterapia, ficar num quarto de hospital, ter que ver as pessoas mais próximas de mim com máscaras. Então isso não é um pedido de ajuda - ou é -, tá tudo bem

      Bom. Odeio ter que admitir, mas, infelizmente, isso é verdade. Ficar trancado num quarto é o mínimo que posso fazer, é sério, eles reclamam disso; eu estaria surtando, então isto não é nada em comparação

- Seu estado está melhor - ele comenta, do nada -, um pouco melhor

    Ótimo. Resumindo de novo: quase nada, mas tudo bem

     Toc, toc, toc... Minha atenção volta para porta

- Entra - digo baixo, mas o suficiente para escutarem

     Meu irmão entra de imediato e se senta no chão, tão rápido que meus olhos não conseguem acompanhar

- Você não acredita! - ele diz, e antes que eu pergunte o que é ele me responde - Sabe aquela vaga de emprego que você tanto queria? Pois bem, aquele garoto que sempre implicou com a gente?  Ele tá com a vaga

     Balanço a cabeça, indicando que continuasse. Ele quer continuar

- Então, ele é péssimo. Tipo, péssimo mesmo. Você com certeza é melhor

       Era, corrijo mentalmente. Eu era melhor do que o garoto, que na verdade se chama Zangado -um apelido que eu e meu irmão demos a ele na quinta série por conta do seu tamanho- na natação e em tudo, não querendo me gabar mas já me gabando

       Ele quase se afogava tentando boiar. Tentando boiar! A coisa mais simples da natação!

- Coitados dos alunos - digo, e meu irmão solta uma risada - É sério. É capaz d'eles se sentirem no Titanic - e foi aí que eu escuto gargalhadas por toda a sala.

      Meu irmão olha para o medicamento entrando no meu sangue

- E aí? - ele pergunta - Não querendo parecer insensível, mas... Isso dói?

- Pouco - respondo

- Ótimo - ele diz, e então apoia a cabeça no cotovelo - Eu sei que a gente se viu ontem, mas eu já tenho mais novidades que um site de fofoca

      Só espero ele conta as "boas novas"
     
     
     

    

WHITE ROSE GARDENS · HELOISA CARDOSOOnde histórias criam vida. Descubra agora