Capítulo 21

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Susanah

Acordo num pulo. Minhas mãos tremendo e suada, consigo sentir as batidas do meu coração acelerado

De novo. Eu preciso resolver isso hoje, de novo

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- Corta! - Márcia grita

Relaxo os ombros, e olho para o meu par que estou contracenando

- Até que você não foi tão ruim - digo, colocando as mãos na cintura

- Eu sou ótimo - rebate Gabriel - E, agora eu vou ligar para minha namorada

- Vai lá, apaixonado - digo, e vou para o camarim. Essa, depois de várias, é a última cena que fizemos hoje

- Susanah - escuto a voz insuportável da minha diretora falando o meu querido nome - Amanhã a gente vai gravar cenas em outro lugar além do hospital. Então, em vez de chegar de uma hora da tarde chegará de dez da manhã

Assinto, franzindo minha testa quando um sorriso -nada comum- aparece no rosto dela

- Você é uma pessoa em qual eu acho muito boa - ela comenta, e meu Deus, isso é um teste de robô aonde fizeram um igual a ela, só que ele sabe sorrir ou algo assim? - Mas, por enquanto não vai ter aumento

Assinto. Eu nem pensei na possibilidade, ela tinha acabado de falar, nem tempo tive de pensar. De qualquer forma, acho que ela está falando isso e, está tentando comover com o seu... Bem, sorriso

- Ok - digo - Estarei aqui. Sempre estou, não é mesmo?

Ela toca no meu ombro, e, eu estremeço

- Boa garota - diz, e seu sorriso fica maior - Até amanhã

Forço um sorriso, e me desvencilhou dela ou do robô clone capaz de sorrir

- Até amanhã - digo, andando com passos largos e ligeiros

Entro no camarim, pego a minha mochila, tiro o figurino, coloco minha roupa e, quando eu saio do camarim a única coisa que digo é só um: "Tchau"

- Susanah - escuto meu nome

Me viro para trás e, o Bento está poucos passos de mim

- Oi - digo, segurando a alça da mochila com ansiedade

- Posso falar com você? - ele pergunta

- Desculpa - digo -, mas eu preciso realmente ir - penso numa solução

Pego o meu telefone na mochila, e digito o número do meu celular e mando para ele

- Eu te mandei o meu número - digo, colocando o celular na cintura - Pode me ligar ou mandar mensagem quando quiser

Ele assente

- Ok e brigado. Desculpa por atrapalhar, tchau

- Tchau - digo, me virando e indo atrás da minha bicicleta

Tiro o cadeado, subo em cima dela ajustando a alça da mochila e, decidindo colocar o telefone dentro dela

Começo a pedalar em direção ao portão, sentindo o vento frio no meu rosto quente. Vou na direção oposta da qual eu tinha vindo

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Desço da bicicleta, meus músculos meio doloridos por causa do movimento repetitivo de minutos

Entro dentro dos muros altos empurrando a bicicleta. Prendo com o cadeado em um poste próximo, e começo a caminhar

As sombras das lápides, junto com a iluminação alaranjada do pôr do sol torna o lugar ainda mais assustador

Ando no caminho aonde não há grama até a barraquinha de flores

- Oi, Dona Dulce - digo, encontrando a vendedora da barraquinha

Ela abre um sorriso, fazendo as rugas nos cantos dos olhos e nas bochechas se intensificarem. Seu cabelo cinza balançando na briza

- Oi, Susanah - ela diz, animada - Ah... O que aconteceu com o seu cabelo?

Sorrio de volta, e balanço a cabeça de forma que finjo ter cabelo

- Eu precisei raspar por causa de um trabalho do teatro, mas, não se preocupe: ele volta rápido - digo, colocando o peso do corpo para um pé

- Ah - ela diz, movendo um vaso de lugar - Espero que volte logo, amo seus cachinhos

Meu sorriso aumenta. Às vezes até esqueço o porquê estou aqui

- Vim comprar o de sempre - digo, tirando o dinheiro da bolsa e, deixando meu sorriso desaparecer

Ela se vira, e pega o "de sempre" na enorme prateleira, cheia de variações de flores

- Um buquê de rosas brancas saindo - ela diz, levemente animada e desanimada

Entrego o dinheiro e, pego o ramalhete

- Obrigada, até breve- sorrio rapidamente, mas meu sorriso some quando me viro para as centenas de lápides

- Até, querida - ela responde

Saio caminhando entre as lápides. Depois de anos eu ainda me confundo por causa da quantidade

Ando uns dez minutos, completamente em silêncio só com o som dos passarinhos piando nas árvores

Respiro fundo ao encontrar o que eu estava procurando. Me agacho à frente da lápide

Rute Andrade Costa
1976-2016

Coloco o buquê à frente da lápide. Me sento na grama mesmo

Deveria ir embora? Sim, mas eu sinto que devo ficar aqui, fazendo companhia, mesmo que isso me doa muito

Às vezes eu odeio o fato de eu ter lembrado a única e memorável vez que minha mãe falou que queria rosas brancas na sua lápide. Ela não disse qual frase que deveria ter escrito na lápide ela queria ou, tipo, ela ter dito diretamente para mim

Ela tinha comentado com uma das poucas amigas dela. Não era para eu ter ouvido, mas, como na época eu conseguia escutar através de paredes, eu escutei

"Quando eu morrer eu quero rosas brancas no meu enterro e na minha lápide"

Por que diabos eu tive que lembrar? É horrível o fato que eu me cobro para vir aqui, trazer suas rosas. Só assim eu acho que fiz o mínimo

WHITE ROSE GARDENS · HELOISA CARDOSOOnde histórias criam vida. Descubra agora