Akaza não entende totalmente o que o faz escolher seguir com esse cominho, lembrar de um passado humano não devia importar, era admitir uma fraqueza da qual ele foi liberto. Ainda, ele não pode esquecer daqueles míseros vestígios de alguém que não parecia ter sido realmente ele, é como ser um estranho, um expectador em um corpo autônomo.
As palavras nunca são o que ele realmente quer gritar, os movimentos nunca são aqueles que ele realmente deseja realizar. Mas a emoções, essas são suas, crescem em seu peito, tragam seu ar, ecoam em sua mente, ainda que não entenda totalmente o que as gerou, elas não desaparecem, apenas crescem em sua insistência, quando a dor chega, quando seus olhos estão embasados de lágrimas, ele quer correr de volta para aquela mansão velha, exigir para que pare, contudo, ele não é covarde, essa fraqueza ele a esmaga e ele suporta cada sentimento, enxuga aquelas lágrimas e continua seu caminho.
É como Kokushibo disse, os gatilhos sempre estiveram lá, a diferença é que ele nunca os buscou e os explorou com propósito. Agora, há tantas pequenas coisas, objetos, palavras, rostos e vozes que trazem um flash, esses que crescem e se moldam, até que uma história ganhe forma. A neve, aquele mesmo floco que brilha como sua busula, é como aqueles grampos que enfeitam os fios escuros da pequena mulher, aquela que aquece seu peito e ao mesmo tempo, quase o faz desmoronar. Ele apenas sabe, para sua história, não houve finais felizes, deveria ser óbvio, ele já está ali há um tempo, seu mundo é uma tragédia por si, há a emoção das batalhas, a raiva, a carne e o sangue, mas não sentimentos como aqueles que vem com as lembranças, o cuidado de um toque gentil, uma risada de felicidade, o olhar de carinho.
O tempo passa, os dias se somam. Ele teve uma noiva, ele sabia quem havia sido, mas ele ainda não consegue lembrar seu nome, as vezes ele a ouve, suas palavras baixas em seu tom doce. O homem, ele foi seu mestre, aquele que o ensinou o estilo marcial que ainda utiliza, um homem bom demais para um criminoso. Akaza falhou com ele, nunca um homem assim apreciaria ter seu estilo manchado por carmim, sua técnica foi criada para proteger, até que ele a retorceu em algo tão feio, para matar, para a dor, tirando mais vidas que ele tinha anos para contar.
As boas memórias não é tudo, aceitá-las, é um todo, como tudo que há, seu oposto logo vem. As lembranças ruins são inevitáveis, essas são como ver por um filtro vermelho, ele destrói a caverna em que está da primeira vez, quando a dor das chicotadas ecoam em suas costas, na pele lisa que uma vez estave retorcida por cicatrizes. Os sentimentos o devastam, a violência sempre foi seu escape, pelo menos, até onde ele pode lembrar.
Ofegante, seus olhos traçaram os dedos pintados, a tinta que maculam sua carne. Naquele outro tempo, eram três listras, ele foi um ladrão, um criminoso, era isso ao que aquelas tatuagens implicavam. Imagine então agora, onde essas marcas cobrem todo seu corpo, o que isso significava para ele? Essa nunca foi uma questão que o preocupou, ele não se importou em ser um monstro, e era isso que ele era afinal, um monstro.
Por um tempo, ele permanece, preso por suas especulações, atormentado por todas as questões. O antes e o agora, se confundem, ele não consegue traçar seu caráter e convicções. O que o liberta é o cheiro do sangue, a presença de outro demônio, o tremular dos espíritos de luta. É mais fácil se agarrar ao que lhe é normal, a constante de todos aqueles séculos. Assim, ele parte, pronto para lutar, para deixar seu corpo falar o que seu coração grita e sua boca muda é incapaz de preferir.
Não há uma prévia, ele não espera quando vem. O puxão em sua mente é quase físico, o faz tropeçar em meio ao confronto, o caçador, apenas um fracote sem importância quase consegue sua lâmina em seu pescoço por esse deslize. Antes que o outro possa fazer algo mais, Akaza o mata, seu crânio rachando com a força do golpe, quando o caçador cai, lá ele fica, ao seus pés, rapidamente deixando o sangue fluir pelo chão revirado. Então, há outro puxão, Akaza afunda seus dedos em seus cabelos tentado parar aquilo, foi doloroso, quase como o mestre ao comandar suas células, para punir, forçando o sangue através da pele.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Antes e Depois (Hiatus)
FanfictionKokushibo morreu e assim permaneceu. Até que não foi. Ele acorda anos antes, ainda um oni, mas com todas suas memórias do que aconteceu e aconteceria. Isso muda algo?