Katherine estava a poucos minutos do fim de seu expediente, mal podia esperar o momento de finalizar o artigo da semana e ir para casa descansar, no entanto, já previa que sua mente não lhe daria o descanso devido, visto que seus pensamentos estavam totalmente voltados para um único nome: Jacqueline Carlyle.
A escritora teclava em seu laptop as últimas palavras e pontuações, bebeu um gole do café ao seu lado, sentindo o amargor descer por sua garganta e automaticamente lhe fazer ficar mais desperta, assinou o artigo e enviou para sua chefe. "Ufa, finalmente..." suspirou em alívio. Levantou-se para ajeitar as coisas em sua mesa e recolher o que precisava guardar em sua bolsa, mas sua atenção foi capturada pelo silêncio do andar, que reverberava ao fundo barulhos de salto alto tinindo de um lado para o outro, um som insistente e ansioso; a jovem percebeu que a editora ainda estava em sua sala, com uma feição pouco amigável, andando de um lado para o outro em seu escritório, Katherine se perguntou o que poderia haver de errado, a mulher parecia nervosa e parcialmente angustiada, queria poder ir até lá e perguntar se estava bem, se poderia ajudá-la em algo, mas resistiu, não podia se dar ao direito dessa intimidade, não é porque haviam dormido juntas uma noite que as coisas mudariam de repente.
- Ela continua sendo sua chefe, Katherine. - Sussurrou para si mesma.
A escritora pegou seus pertences e visualizou o celular que vibrou no mesmo instante, na tela pode ver uma mensagem de sua amiga de infância, Jane, que a convidava para tomar uns drinks quando saísse da revista. A jovem sorriu de imediato e apesar do cansaço pensou que não seria uma má ideia, precisava mesmo conversar com alguém de confiança, falar sobre a noite inesperada; entender e, quem sabe, dar algum sentido para esse momento de sua vida. Respondeu confirmando e jogou o celular dentro da bolsa enquanto caminhava até o elevador.
Esperava o elevador subir, enquanto contava os andares, o silêncio era quase gritante e parecia que o prédio inteiro estava vazio, mas ainda tinha uma sensação estranha de estar sendo observada. O barulho do elevador a despertou de seus devaneios, fazendo-a entrar com certa pressa, no entanto, a porta foi impedida de ser fechada por uma mão ágil que a segurou, fazendo Katherine dar um leve salto em surpresa, avistando Jacqueline adentrar e parar ao seu lado.
- Está fugindo de mim, Katherine? - Disse a mais velha olhando-a de canto.
- E-eu? Não. Por que estaria? Eu... - a jovem parecia nervosa em se ver sozinha com a mulher outra vez. Desde a última noite, ambas se deixaram absorver pelo trabalho e quase não se encontraram pelo escritório, não tiveram tempo suficiente de pensar ou sequer de lembrar. Mas Katherine mantinha Jacqueline em seus pensamentos, ainda que não quisesse, a presença da mulher, agora, mais do que nunca, a fazia sentir-se agitada, era como se seu corpo fosse traindo a si próprio, fraquejando.
- Entendo. Não te vi hoje o dia todo. Achei que estava tentando me evitar. Quer me dizer alguma coisa? - o tom de Jacqueline era ilegível, assim como seu rosto.
- Jacqueline, eu... eu estou muito confusa. Eu... eu não sou... gay. - A jovem disse de cabeça baixa, visivelmente acanhada.
- E você acha que eu sou? - a editora a fitou, virando-se diretamente para ela.
- Eu... eu não sei, Jacqueline. Isso nunca aconteceu antes. Eu só... estou preocupada. Você é casada. Eu sou sua funcionária. - A mais nova dizia quase sem pausas, deixando evidente seu nervosismo diante da figura imponente da mulher que se aproximava cada vez mais de si.
- Sim, Katherine... Você é minha... escritora. - A mulher se aproximou ainda mais da jovem, seus corpos minimante distanciados, o calor do ar que saia de suas bocas podia ser sentido, assim como a tensão que se fazia presente. Jacqueline aproximou-se do ouvido de Katherine, que instintivamente fechou os olhos e deixou morrer um gemido em sua garganta. - Não se esqueça disso. - A mulher de cabelos loiros afastou-se assim que o elevador se abriu, deixando ali uma jovem visivelmente afetada por sua proximidade, pelo tom de sua voz, pelo cheiro de seu perfume que reverberava e pela delicadeza de seus lábios ao roçar levemente em seu ouvido.
Katherine soltou o ar de seus pulmões assim que se viu sozinha novamente no elevador, seu corpo realmente era seu pior inimigo naquele momento, suas pernas pareciam quase bambas, o calor que subia era indescritível e podia sentir o rubor em suas bochechas. "Que mulher... maldita..." .
(...)
- Kath??? Oi??? Você está me ouvindo?? - Jane balançava as mãos em frente ao rosto da amiga que parecia ter adentrado outra dimensão.
- Jan, desculpa! Sim. Eu estou te ouvindo.
- Ah, é? Então o que foi que eu acabei de dizer? - perguntou desconfiada.
- Que você... é... o trabalh... não, a faculdade...
- Está vendo!!! Caramba, Kath, faz quase um mês que a gente não se vê e você nem aqui está praticamente. O que está acontecendo com você? Eu nunca te vi assim. - a amiga perguntou com certo tom de preocupação.
- Comigo? Ah... nada. Acho que é só cansaço, tenho trabalhado tanto, amiga. - Tentou desconversar e enganar a si própria.
- Katherine LeBlanc, te conheço desde os 5 anos de idade, você acha mesmo que consegue me passar a perna com uma desculpa fajuta dessas? Vamos, pode ir começando a falar. - A jovem batia as mãos agitadas, bebendo um gole de seu drink logo em seguida. - Isso está me cheirando a romance...
- Não é bem isso, é só... aconteceu uma coisa essa semana. Há dois dias, na verdade. E eu não sei como isso foi acontecer, porque não podia ter acontecido. - a jovem passava a mão pelo rosto.
- Ai meu Deus... você voltou com seu ex? Porque eu juro que eu vou começar a te xingar agora mesmo.
- Não, Jan... antes fosse, acho que isso não seria tão grave...
- Meu Deus, o que poderia ser mais grave que isso? Você dormiu com seu chefe?
Uma pausa visivelmente reveladora foi feita, Katherine sequer olhava para a amiga, que pendia os lábios em um O perfeito, tamanho o choque diante da falta de argumentos e expressividade de Katherine, que já se entregava e condenava instantaneamente.
- K-A-T-H-E-R-I-N-E!!! Você dormiu com seu chefe!!! Meu Deus, você dormiu sim. - a jovem ria descontroladamente, enquanto a outra tentava cobrir o rosto que queimava como brasa.
- Não, Jane. Para! Eu não dormi...
- Como não?? Olha sua cara pegando fogo!
- Eu dormi com A minhA chefe. - A jovem disse quase em um suspiro.
Jane não podia acreditar nas palavras da amiga, um sorriso instantaneamente se instalou em seu rosto ao ponto de fazer suas bochechas doerem, era como se não fosse possível parar de sorrir naquele instante ou evitar dar um riso em alto e bom som, que foi exatamente o que acabou fazendo. - Amiga... você pegou aquela mulher... maravilhosa...??? Olha... venceu, amiga. Você venceu.
- Eu não venci nada, eu nem gosto de mulher. Só aconteceu, foi o acaso e não vai se repetir. Ela é casada, com um homem, aliás. Então, é isso. - Katherine tentava a todo custo desconversar e convencer a amiga e, quem sabe, a si mesma, de que aquilo havia sido somente um acontecimento casual em sua vida.
- Amiga, por favor. Se aconteceu uma vez, vai acontecer outra. E pra você estar nessa negação absurda é sinal de que foi muito bom e você só está com medo de dizer isso pra si mesma. Acorda!!! E vamos comemorar, porque se você não saiu do armário, a Jacqueline logo te arranca dele. - Jane ria, puxando a amiga para a pista de dança, que fez somente assentir e tentar se divertir com aquela situação, afinal, no fundo ela sabia que Jane estava correta, só não estava pronta para admitir para si mesma que Jacqueline Carlyle a estava fazendo perder os sentidos e que aquela mulher era sim o seu caminho de perdição ou, talvez, sua estrada para o paraíso.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Por trás de seus olhos
Fiksi PenggemarJacqueline Carlyle é editora chefe da Revista Scarlet, uma grande influência no mundo jornalístico. Uma mulher que inspira coragem e luta por aquilo que acredita, sem medo de correr riscos. Mas os dias da editora estariam prestes a mudar após a cont...