Sra. Ret

20. Teto de Vidro

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Meus pais não gostaram dele.

Em boa parte da refeição, ignoraram a presença de Filipe. Toda vez que, ostensivamente, passam por cima dele, abro a boca para me opor e o pé de Filipe cutuca o meu por de baixo da mesa. E ele balança a cabeça de leve. Então, eu continuo sentada, fumegando, a raiva crescendo minuto a minuto.

A situação há muito passou do ponto de ser apenas desconfortável. Apesar de Sofia ter se esforçado para cobrir o silencio. Ret, por sua vez, foi além do esperado, abandonando seus camisetões e vestindo uma camiseta casual manga comprida, para esconder as tantas tatuagens. Jeans e tênis simples completavam seu visual de conhecer os pais. E nada de correntes de ouro grossas estilo Gang-Gang. Dessa vez, apenas uma fina corrente de prata com um delicado crucifixo pendia em seu pescoço.

Levando-se em consideração que se recusou a vestir gala num evento tomado por realeza hollywoodiana, fiquei impressionada. Apesar de tudo, ele voltara a platinar o cabelo, de forma que realçou sua juventude duvidosa. Ficou claro que, naquele momento, ele teve vontade de parecer mais novo. Me ver namorando com alguém com 15 anos a mais, talvez nunca tivesse nem mesmo passado pela cabeça do meus pais. E agora, lá estava eu, casada com Filipe, que tinha quase a idade deles. Complicado.

Aquele cabelo, o jeito como ele ficava diferente... Na maioria dos homens, eu não teria gostado. Ret não é a maioria dos homens. Para ser bem franca, ele estava absolutamente maravilhoso, mesmo com alguns hematomas que quase desapareciam sob os olhos.

O modo educado com que lidou com o comportamento abismal dos meus pais somente reforçou a minha crença nele. Meu orgulho por ele ter escolhido ficar comigo. Mas voltemos à conversar do jantar...

Sofia estava detalhando seus planos de aula para o semestre que se aproximava. Meu pai assente e ouve com atenção, fazendo as perguntas apropriadas. Marcos se apaixonar por ela estava além dos sonhos mais loucos dos meus pais. Ela já era parte da família há muitos anos. Eles não poderiam estar mais contentes. Mais do que isso, porém, ela parecia fazê-los enxergar o filho sob uma nova ótica, percebendo as mudanças ocorridas.

Quando Sofia falou do trabalho de Marcos e das suas responsabilidades, eles prestaram atenção. Nesse meio-tempo, Ret esta apenas do outro lado da mesa, e eu sinto saudades. Havia tanto ainda para conversarmos que eu nem sabia por onde começar. Mas já não haviamos coberto a maior parte?

Então, qual era o problema? Eu tinha a estranha sensação de que havia algo errado, algo que me escapou. Filipe se mudou para Porto. Tudo iria ficar bem. Mas não estava. As aulas logo começariam. A ameaça ao plano pairava sobre a minha cabeça porque eu assim permiti.

- Emili? Algo errado? - papai estava na ponta da mesa, o rosto crispado de preocupação.

- Não, pai. - digo, com um sorriso forçado.

Não havia menção ao fato de eu ter batido o telefone na cara dele. Suspeito que isso tivesse sido classificado como ecesso de raiva de uma garota com o coração partido ou algo do tipo. Papai franze o cenho, primeiro na minha direção, depois na de Filipe.

- Minha filha vai voltar ás aulas na semana que vem.

- Ah, sim - diz Filipe - Ela mencionou isso, senhor Goellner.

Meu pai avalia Filipe por sobre os oculos.

- Os estudos dela são muito importante.

Um panico gélido se apodera de mim conforme o horror se desenrola diante dos meus olhos.

- Pai. Para. -sussurro

- Sim, senhor Vinicius - diz Ret - Não tenho intenção de interrmpe-los.

- Acho bom mesmo. - papai cruza as mãos diante dele, se preparando para passar um sermão daqueles. - Mas o fato é que jovens apaixonadas têm uma tendencia horrivel a não usar a cabeça.