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     Acordei com os primeiros raios de sol batendo em meu rosto. O céu ainda não estava claro, devia ser por volta das cinco da manhã. Não precisei me mexer muito para saber que a mão esquerda de Xavier descansava na minha cabeça, que estava apoiada no seu peito, como se ele a tivesse acariciado até dormir. O rapaz ainda dormia tranquilamente, alguns de seus fios loiro escuro caíam em seu rosto e seus lábios estavam um pouco abertos.

     A boca dele. Eu beijei ele ontem.

     O choque de ter relembrado os acontecimentos de ontem me fizeram tirar cuidadosamente sua mão que me mantinha perto dele e me sentar nos cobertores, evitando fazer barulho para que ele não acordasse. Eu observava o horizonte que começava a ser iluminado enquanto repassava mentalmente tudo que aconteceu ontem.

     Eu e Xavier nos beijamos.

     Talvez eu devesse ser internada.

     Isso é tão confuso, eu não sei como reagir agora. Eu não sei o que vai acontecer depois, o que Xavier pode querer que aconteça. Eu não sei nem o que eu espero acontecer agora. Eu não sei mais o que eu quero. Não sei se estou preparada para ter o que quer que adolescentes comuns tenham depois do primeiro beijo.

     Talvez seja prudente eu retornar ao plano de sair do país e voltar depois de décadas na esperança de Xavier já estar casado e em um relacionamento estável ou estar morto. Mas por enquanto, eu resolvi pensar no que fazer agora no sentido literal.

     Eu ainda estou sentada ao lado de um Xavier adormecido em cima do telhado da minha residência às cinco da manhã. Pela primeira vez na minha vida, eu pensei no que Enid faria se ela estivesse no meu lugar com Ajax. Ela com certeza voltaria a dormir em seus braços e ficaria agarrada a ele até ele acordar.

     Mas eu não sou Enid.

     E quando Xavier acordou, eu não estava mais no telhado.



                                          ...


     Xavier Thorpe


     Eu acordei por volta das sete e meia da manhã, quando ouvi alguns corvos fazendo barulho nos parapeitos do telhado. Não me tomou muito tempo para notar que Wandinha tinha ido embora. O lado dela do lençol já estava frio então ela com certeza voltou para seu quarto há algumas horas. Me sentei nos lençóis e coloquei as mãos no rosto, pensando no que fizemos.

     Eu e ela nos beijamos ontem.

     Foi o melhor momento da minha vida.

     Talvez eu já tivesse fantasiado como seria beijar aquela garota obsessiva e complexa, mas eu nunca pensei que fosse tão bom. Me senti como se eu finalmente estivesse fazendo algo certo na minha vida. Senti como se tudo fizesse sentido agora e como se eu finalmente tivesse criado coragem para fazer algo que eu sonho em fazer desde que eu a vi pela primeira vez. No caso, eu não quis beijar ela quando éramos crianças, mas eu queria me aproximar dela e eu em tese consegui fazer isso.

     Eu não consigo descrever com palavras quão incrível Addams é e quão incrível foi sentir seus lábios nos meus, suas mãos agitadas bagunçando meus cabelos, sua respiração ofegante e seu rosto descansar em mim. Mas o mais importante, como foi surreal vê-la sorrir.

     Ela tem o sorriso mais lindo que eu já vi.

     Não foi um sorriso exagerado nem aberto ao ponto de mostrar seus dentes, mas um sereno formado apenas com o levantar de seus lábios. E era tão ela. Era tão característico e fazia tanto sentido com ela que eu não consigo imaginar esse mesmo sorriso em nenhuma outra garota, apesar de ser um bem comum.

Trust - Wandinha e XavierOnde histórias criam vida. Descubra agora