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     A água gelada impacta minha temperatura corporal mesmo com o traje grosso de mergulho. Apesar de ainda ser por volta das três ou quatro da tarde, o meio aquoso escuro passava a impressão de que já era de noite. Pessoas com talassofobia não conseguiriam ficar dois minutos nesse exato ponto sem terem um ataque de pânico pois não era possível ver absolutamente nada. Não era possível ver um palmo à frente de você.

     Poderíamos estar sendo observados agora por alguma criatura e nós nunca saberíamos já que a visibilidade era mínima e tudo que eu podia ver era um breu sem fim. Nada era visto ao meu redor e o pior, nem abaixo. Eu não conseguia ver nada abaixo de mim além da escuridão infindável.

     Era perturbador. Xavier realmente sabe planejar bons encontros.

     Por sorte, pensamos no fator da luminosidade e trouxemos lanternas de longo alcance que foram essenciais para que nos encontrássemos no campo visual um do outro. Os itens eram de fato potentes, já que agora eu conseguia ver claramente o meu redor até um determinado ponto. Conseguia ver alguns pequenos cardumes de peixes nadando rapidamente, provável que estavam fugindo de outro predador maior. Liguei o interfone do uniforme de mergulho para conseguir falar com Xavier.

     — Temos que ser rápidos com sua missão ecológica. A menos que você queira morrer hoje.

     — Beleza. Me segue, tenho quase certeza que é por aqui.

     Eu o seguia enquanto ele ia nadando diretamente ao fundo do lago e eu observava tudo atentamente. Era surreal.

     O local parecia milenar. Tudo indicava isso, pelo menos passava essa sensação. Eu comparei com a ideia de ver um castelo medieval antigo: histórico, impotente, colossal. As plantas longas e os musgos cobrindo as enormes pedras denunciavam que poucas pessoas estiveram lá e que tudo isso estava aqui há mais tempo do que poderíamos imaginar. Era inexplicável estar aqui.

     Recobrei minha consciência quando Xavier chamou por mim, pedindo que eu ficasse mais perto, já que eu estava impactada com todo o ambiente. A escuridão e o frio, que aumentavam à medida que nos aproximávamos do fundo, deixavam tudo com um clima ainda mais mórbido. Mesmo contra minha vontade, me aproximei de Xavier e continuamos nadando.

     Longos minutos se passaram até que eu pudesse começar a avistar o fundo do corpo d'água, onde tinha ainda mais plantas e pedras cobertas por uma camada grossa de musgo, além de peixes lanternas, que fugiram assim que perceberam nossa aproximação. Fincamos nossos pés no fundo e eu me permiti levantar o rosto para tentar ter uma noção de quantos metros abaixo estávamos. E eu não consegui sequer ter uma estimativa porque eu não pude ver a superfície do lago.

     Nós tínhamos virado parte dele. Poderíamos sumir aqui e provavelmente ninguém nunca nos encontraria.

     Xavier acenou para que eu me mantivesse próxima novamente e pediu que eu me atentasse para alguma garrafa de vidro. Eu revirei os olhos mas não respondi nada. O poupei de ouvir uma resposta nada agradável.

     Eu sou muito madura.

     Ao contrário de Xavier, que só pensava na droga da garrafa, eu prestava atenção aos arredores para calcular quais seriam os potenciais locais em que poderíamos nos esconder caso algum predador decidisse nos caçar nesse empreitada. Por sorte, o lago tem diversas grutas e bolsões de ar em que poderíamos nos abrigar por alguns minutos e depois arriscarmos voltar à superfície nadando em um ambiente desconhecido e entupido de vários tipos de criaturas que talvez nem se soubesse da existência.

     Só continuei com passos lentos atrás dele, focando em qualquer movimentação irregular da água, enquanto ele procurava a garrafa por entre as algas. Tudo tranquilo.

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⏰ Última atualização: May 20, 2023 ⏰

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