Furacão rosa

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Existe uma palavra de maior intensidade, mas que ainda seja sinônimo de tortura?

Punição? Não sei.

Só sei que já estou a meia hora nesse falatório sem conseguir prestar a mínima atenção a nenhuma sílaba sequer que deixa a boca das mulheres ao meu redor na mesa.

Ino, Tsunade, Shizune. Todas empenhadas em conseguir os melhores resultados da reunião semanal das superiores. Eu também deveria estar com minha atenção totalmente nisso. Pelas expressões sérias, até mesmo no rosto de Ino, tenho absoluta certeza de que o assunto tratado é importante.

Mas não é isso acontece.

Vez ou outra uma delas me questiona e respondo monossílabas ou apenas meneio a cabeça como um boneco inanimado. Estou totalmente no automático e isso é desastroso, considerando a minha posição entre elas.

A sucessora de Tsunade alheia a suas responsabilidades e completamente submersa em sua própria mente fantasiosa.

O impacto da noite passada foi maior do que eu esperava. Claro, ainda nos encontramos pela manhã no apartamento durante um breve café e apesar de Kakashi aparentemente ter decidido fingir que nada aconteceu — decisão coerente e premeditada — é exatamente isso o que me incomoda.

Soa irônico, eu sei. Mas eu queria que ao menos ele tivesse alguma atitude para falar a respeito, nem que isso significasse me prensar na parede e amarrar meus pulsos. Não sou movida apenas por gestos, acredito neles e sei que em algumas ocasiões são melhores do que palavras, porém estas não podem faltar. Alguma hora a carência de um desestabiliza o outro e tudo se perde.

Eu tenho necessidade em ouvir o que eu sei que ele tem a me dizer, porém ainda sou covarde para fazer a mesma coisa. E ele não fica atrás.

Tenho a sensação de que estamos apenas aguardando um primeiro passo que não acontece porque ficamos olhando um para os pés do outro, metaforicamente é claro. Esperamos a mesma coisa, mas nenhum dos dois sai do lugar ou se digna a se mexer pelo menos.

Eu sei que por Kakashi se tratar de um ninja anbu e carregar um amargo passado nas costas, não será com facilidade que terei algo assim dele. E eu o compreendo. Compreendo acima de qualquer sentimento que eu possa ter a mais por ele agora, porque para alguém que perdeu tudo lá atrás de maneira tão trágica, deve ser ainda mais difícil saber que lá na frente há algo esperando por ele. Assustador, quem sabe.

Nessa noite eu não dormi e acredito que Kakashi também não. Eu me coloquei em seu lugar e procurei pensar como ele, me sentir como ele. Eu quis verdadeiramente entendê-lo antes de considerar a mim mesma.

Não quero me apegar a uma relação futurística quando ainda não decifrei totalmente quem ele realmente é no presente. Não quero mudá-lo ou exigir que se abra para mim quando eu mesma não faço isso. Mas eu posso dizer que estou disposta a tentar enxergar do seu ângulo.

Nosso ponto de vista às vezes é falho ou precipitado, porém quando decidimos mudar a posição por uma pessoa é um passo gigantesco e às vezes maior do que nossas próprias pernas. As perspectivas mudam, o futuro muda, os medos antigos se afundam e novos surgem aos bocados. Mas então o que nos leva a sacrificar o nosso precioso conforto por algo impreciso? Afinal, o comodismo é um termo deveras pejorativo, mas que está presente na vida de quase todos.

Eis a questão. Tudo está mudando ao meu redor, mas eu ainda estou acomodada ao casulo meramente confortável que criei para eu mesma, com medo do que posso enfrentar ao sair dele.

Um passo no escuro é precipitado, mas um passo para a fora da escuridão é o certo e o que desejo primeiramente.

Eu quero entendê-lo; há apenas essa certeza em mim neste momento. E se isso significa deixar meu ponto de vista, meu confortável casulo e permitir as mudanças em mim mesma, que seja! Estou farta de indecisões e recuos, é hora de posicionar o meu alvo e atirar para acertar.

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