A babá

Capítulo 1

-Ô seu Zé, hoje o senhor vai pagar aquela cervejinha geladinha pra mim né? Ta um calorão de matar hoje.-Vejo o senhor de meia idade me lançar um sorriso divertido antes de cruzar os braços.

-Você não toma jeito né sua menina.-Diz divertido antes de assobiar para um dos garçons do bar.-Traz mais um copo aí meu bom.-Diz lançando um aceno com a mão para o homem.

-Senta aqui menina.-Diz a tia Maria pegando mais uma cadeira. Já beira perto das duas da tarde e o sol de rachar é tampado pela grande lona que faz uma espécie de varanda, com diversas mesas ocupadas por várias pessoas aqui da comunidade. Colocando minhas sacolas em um braço só, vou até eles e agradeço quando o homem traz o meu copo. Sem cerimônia, encho meu copo com a cerveja e dou um longo gole, vendo como ambos riem quando eu engasgo.

-Cuidado menina.-Diz seu Zé, meu tio.-Mesmo morando em um bairro chique igual aquele lá você ainda insiste em vir pra cá né menina.-Diz negando com a cabeça.

-Até parece que só porque melhorei de vida ia deixar de vir pra o lugar que cresci e tenho orgulho de dizer que é minha verdadeira casa.-Digo pegando com um palito de madeira um pedaço da linguiça coberta com farofa.

-Não tem jeito mesmo, essa menina é igualzinha a mãe dela.-Diz minha tia Maria bebendo mais um gole de cerveja.-O que você faz por aqui? A essa hora você deveria estar la no salão ensaiando, mesmo tendo sido a rainha do desfile desse ano não pode bobear não menina, você sabe que metade daquelas meninas de lá são puro ninho de cobra e pra tentar te passar pra trás pouco custa.-Diz enquanto aceno com a cabeça, engolindo a linguiça e bebendo um longo gole da cerveja, que desce trincando de gelada.

-Eu tô ligada tia, mas hoje não pude ir porque tive que ir no bazar da dona Ana comprar algumas roupas de frio.-Digo animada enquanto ambos riem.

-Pra quê roupa de frio nesse calorão menina? Nem na época de inverno o Rio fica realmente frio.-Diz meu tio divertido.

-Ces lembra que estava pra sair a documentação pra que eu e os meninos pudéssemos ir pra os Estados Unidos? Então.-Digo empolgada.-Saiu!-Digo rindo ao ouvir minha tia dar um baita grito.

-E quando que vocês vão pra lá?-Pergunta meu tio eufórico.

-A mamãe conseguiu comprar as nossas passagens pra esse sábado agora.-Digo batendo palmas.-E o melhor de tudo, é que eu consegui um emprego lá pra trabalhar com uma família super rica!-digo animada antes de ser abraçada por minha tia.

-Eu fico tão feliz por você minha menina.-Diz me abraçando tão forte que quase fico sufocada.-Nessa sexta então vamos preparar um churrascão pra você e pros meninos de despedida, vou chamar todo o pessoal aqui da comunidade pra poder ajudar. -Diz segurando as lágrimas.-Eu vou pedir a bombinha pra uma das vizinhas pra poder encher a piscina na laje pras crianças poderem se refrescar.

-Vai ter aquele pagodinho de lei?-Pergunto vendo os mesmos rirem antes de ela acenar com a cabeça.

-Um forrozinho também.-Diz meu tio.-Vou separar uns dvds com aqueles antigos dos bons mesmo.

-Ai sim ein, quando o seu Zé pega os DVDs é sinal de que é alguma comemoração especial.-Diz uma voz atrás de mim animada. Sorrio ao ver a dona Roberta com sua caixa cheia de geladinhos pra vender.

-E é sim dona, eu vou viajar pros Estados Unidos!-Digo vendo a mesma dar pulos de alegria antes de me dar um beijo imenso na bochecha.

-Você merece tudo isso minha linda.-Diz me fazendo sorrir feliz. Não há dinheiro nenhum no mundo que me faça trocar todo esse calor e amor do pessoal que ajudou a me criar quando minha mãe, meus irmão e eu passávamos necessidade.-Se ficar muito rica não vai esquecer da gente não ein, se não eu varo lá e te dou umas chineladas.-Diz me fazendo rir.

-Nunca que eu esqueceria de vocês.-Digo terminando de beber meu copo de cerveja.-A senhora sabe se o Caio tá em casa?-Pergunto ja pegando minhas sacolas.

-Menina eu acho que tá, eu não vi ele saindo hoje não. Da uma passadinha lá.

-Então eu ja vou indo, tenho que contar pra ele as novidades.-Digo animada.-Obrigada pela cerveja e a linguicinha tios, na sexta eu varo lá na casa de vocês pra cobrar o meu churrasco.-Digo me despedindo de ambos com um forte abraço. Pego o dinheiro do geladinho e dou a dona Roberta, ela abre a tampa de isopor e pego um de morango. Nada melhor que algo bem geladinho pra ajudar a me refrescar.

Subo o morro animada enquanto penso na reação do meu preto quando eu contar as novidades. Desde de criança Caio e eu crescemos juntos, foi natural começarmos a nos gostar na adolescência e depois de ficarmos com algumas pessoas e percebermos os nossos sentimentos um pelo outro, começarmos um relacionamento. Olho a pequena sacola dentro das várias outras com um enorme sorriso que trato logo de disfarçar. Antes de eu viajar pra lá eu pretendo fazer uma surpresa e tanto de despedida pra o meu preto, principalmente agora que tenho mais certeza do que nunca de que ele é o homem certo pra mim.

Além de que já me sinto mulher o suficiente pra dar esse próximo passo. Sei o quanto ele vai ficar feliz com isso ja que desde o início do nosso relacionamento ele sempre quis ser o meu primeiro. Hoje a noite vai ser o momento perfeito já que os meninos vão estar dormindo na casa de seus amigos novos e ricos de condomínio e eu vou ficar com aquele casarão todo só pra mim, só faltava mesmo essa lingerie perfeita.

Avisto a casa dele no alto do morro e me apresso mais com um sorriso de ponta a ponta. Hoje é a folga dele então não duvido nada que ele esteja dormindo. Pego a chave reserva de dentro do meu bolso da casa dele e abro com cuidado o portão, desço as escadas antes de ir até a porta de sua casa. Está tudo tampado, o que confirma a minha teoria.

Seguro com minha outra mão meu geladinho antes de abrir a porta de sua casa. Quando a abro, estranho ao ver um sapato feminino ao lado do sapato dele.

Tiro meu chinelo e pego esse sapato feminino, o avaliando. Ponho minhas sacolas no canto da casa e com o coração acelerado, sigo o som dos barulhos, segurando com forca meu geladinho quando abro com tudo a porta de seu quarto.

Sinto meu coração se destrocar quando o vejo em cima de uma maldita qualquer. Ele me olha surpreso enquanto a maldita me olha com um grande sorriso.

-Você disse que ela ia estar ensaiando hoje!-Diz ele alterado para a garota que apenas me olha com um sorrisinho debochado.-Preta... não é isso que você tá pensando.-Diz me encarando com um olhar desesperado e sem que eu pense, jogo com força o sapato na cara dele, acertando em cheio. A maldita me olha surpresa quando jogo meu geladinho na cara dela, me amaldiçoando por isso.

-Dela eu esperava tudo, mas de você, porra, você conseguiu me decepcionar pra caralho.-Digo sentindo minha voz embargada.-Vocês dois se merecem mesmo.-Digo enxugando a maldita lágrima que cai de meu olho.-Eu espero que vocês dois queimem no quinto dos infernos, não ouse nunca mais sequer me ligar.-Digo saindo dali, pegando as pressas minhas coisas, saio sob os protestos do mesmo daquele lugar e com a visão repleta de lágrimas, desço um pouco o morro e subo no ônibus que acaba de parar em um dos pontos, não me importando pra que bairro ele vá, contanto que seja pra fora desse, tá valendo.

Após pagar a passagem, passo pela roleta e me sento em qualquer um daqueles bancos, deixando finalmente minhas lágrimas serem derramadas com mais e mais frequência. Eu realmente não esperava essa traição vinda de alguém que cresci e que confiei o meu coração.