Capítulo 1.3

45 2 0
                                    

   Tudo estava branco, não havia cenário algum. Eu andava perdido, sem rumo,sem objetivo. Passei meses caminhando naquele vazio infindável até que, enfim, encontrei uma silhueta distante. Ao me aproximar, vi uma garota loira. ela virou para mim, sorriu e tudo ao nosso redor se transformou em um campo cheio de flores brancas. Ela andou em minha direção em meio as flores, e estas mudaram sua cor para um vermelho e em seguida.. murcharam. Ela parou na minha frente e ficou em silêncio enquanto me observava com aqueles olhos azuis. Ouvi então sons de batida no chão o fazendo tremer, como um gigante caminhando ao nosso redor. Ela continuou me observando, mesmo com todo aquele estrondo ficando cada vez mais alto.
   Quando olhei para cima, realmente havia um gigante caminhando... e o próximo passo seria justamente em cima de nós dois. O pé do gigante desceu jogando todo seu peso em cima de nós, eu me desesperei enquanto a garota simplesmente não reagiu, continuou olhando para mim.

   Eu acordei..
   Foi apenas um sonho...
   No outro lado do lugar estava o zumbi preso pela algema em seu braço. Ele batia a cabeça contra a parede fazendo o mesmo barulho dos passos do gigante no meu sonho... talvez foi esse barulho que interrompeu o meu sonho.
   Era o terceiro dia em que eu estava ali esperando eu me tornar um deles, mas nada.. nada aconteceu. Eu e o morto vivo já havíamos feito até mesmo uma amizade.
   — Bom dia Brian.
   Brian fora o nome que dei aquela coisa. Ele não era agressivo, gostava de me ouvir reclamar da vida e as teorias de como o mundo ficou na merda. Ele era um bom amigo.
   — Já era pra ter acontecido alguma coisa. Eu tô cansado de ficar aqui, a comida tá acabando e eu quero ver se existem sobreviventes.
   O morto-vivo apenas observava com o olhar frio.
   Eu bati a laterna na mão para que ela ligasse e a guardei na mochila.
   — Eu não sei se algo aconteceu e agora os zumbis não infectam as pessoas. Se for o caso, eu posso arrumar uma namorada humana pra você.
   O morto-vivo apenas observava.
   — E se eu for o único vivo? Não não não... devem existir mais pessoas. — Coloquei algumas latas de comida na mochila e peguei um facão que havia no lugar. - Vou sentir sua falta amigo.
   O morto vivo apenas observava.
   Eu subi novamente as escadas de madeira depois de três dias naquele porão. Senti um odor insuportável assim que saí de lá. Na sala estava o corpo do morto-vivo que eu havia "matado", mas agora ele fedia muito mais. Por algum motivo, os mortos-vivos não carregavam o mesmo odor que os mortos. Aparentemente o que mantém eles vivos também retarda a decomposição, não vi o suficiente para dizer se chega a interromper a decomposição em certo ponto. E como consegue fazer um morto realizar várias funções? Os órgãos ainda funcionam..?
   E se eles não estiverem realmente mortos, mas sim sendo controlados? Eu não sei...
   Saí da casa rapidamente para evitar continuar sentindo aquele odor. Eu estava agora do lado de fora, vendo o sol nascer naquela manhã. Estava com frio, sentindo falta da metade da minha camisa que havia usado algumas vezes, mas confiante que logo encontraria uma nova.
   Comecei a entrar na cidade, rumo ao centro. Objetivo? Encontrar uma alma viva, alguém que me explicasse tudo e me impedisse de entrar na loucura. Não queria ter que conversar com zumbis novamente, embora o pensamento de levar aquele morto-vivo como parceiro tenha passado na minha cabeça. Uma das ideias idiotas que eu havia pensado durante esses três dias.
   Caminhei com cautela pelas ruas vazias, vi quilômetros de carros abandonados formando um trânsito infernal e conseguia imaginar a situação. Uma fuga de carro da cidade não era uma das melhores ideias, o desespero de todo mundo e a mesma ideia em massa de sair de carro da cidade foi a causa dessa fila quilométrica de veículos parados, mas ir a pé era pior ainda. A cidade silenciosa era enfeitada de cadáveres, a maior parte sendo apenas o esqueleto do indivíduo. Não era a melhor mensagem de boas vindas que a cidade oferecia, mas que escolha eu tinha?
   — Olá? Alguém? — Gritei ouvindo minhas palavras ecoarem no silencio da cidade.
   Fiquei sempre atento para não chamar atenções indesejáveis. Nas mãos, o facão, pronto para me defender de qualquer coisa que apareça.
   O padrão de carros abandonados em fila começou a mudar a medida que eu me aproximava do centro. Agora haviam carros capotados espalhados, não só pelas ruas, mas até mesmo dentro de edifícios. Algo havia arremessado aqueles veículos e em poucos passos eu já pude ver o motivo.
   — Meu... Deus...
   Havia uma cratera gigante logo a minha frente. Pela destruição ao redor, talvez uma bomba gigante fosse o motivo. Mas até então era só uma intuição minha. Um sentimento negativo me fez querer sair daquele lugar imediatamente. Assim, sem pensar muito, virei de costar para a cratera e voltei a caminhar pelo mesmo trajeto que havia feito para chegar até ali.
   — Ei, o que você tá fazendo aqui?
   Uma voz distante chamou minha atenção. Sem demorar muito eu me virei na direção da voz e encontrei um homem barbudo e todo magro e usando uns trapos para esconder as partes íntimas.
   — Senhor! Que bom que encontrei um ser humano vivo! — Disse me aproximando dele rapidamente. — Eu não me lembro do que aconteceu, eu tô... perdido, confuso..
   — Não, você não vai tirar ela de mim. Ela é tudo o que eu tenho e não é um zumbi de merda que vai acabar com o nosso amor. — Ele retrocedeu alguns passos cambaleando até um monte de ossos que havia ali próximo e em seguida beijou aquela caveira apodrecida. — Não se preocupe meu bem, eu tô aqui para proteger você.
   Eu assisti a situação sem falar nada, tentava entender o que diabos estava acontecendo.
   — Senhor.. tá tudo bem. Eu não sou um zumbi. — Eu disse me aproximando do sujeito devagar e mostrando as mãos para cima, para mostrar que eu não estava armado.
   — Some daqui! — Ele disse me jogando uma pedra pequena.
   — Mas senhor....
   O louco então correu para cima de mim segurando uma faca de cozinha. Eu segurei meu facão, não iria atacar aquele cara, mas também não deixaria ele me atacar. Após ver o facão, ele caiu para trás e voltou se arrastando até a pilha de ossos, a qual ele abraçou.
   — Por favor... Não nos mate, eu só quis protejer ela...
   Eu até pensei em ajudar, em tirar aquele sujeito dali daquele lugar perigoso, mas aquele lugar já havia afetado ele e eu não queria ser o próximo. Decidi ir embora e deixar para trás o "casal". Já tinha a prova que ainda existiam pessoas, e, se eu tiver sorte, encontraria alguém um alguém mais são da cabeça.

A Última Era: Além Da Catástrofe (I)Onde histórias criam vida. Descubra agora