Mestre Joris tinha a reputação de ser o melhor tutor de toda a Europa. Ele se gabava de ter estudado nos melhores colégios, tinha uma longa lista de indicações e o rei pagava uma pequena fortuna para que ele ensinasse o jovem príncipe a ser o mais sábio, inteligente e honroso homem de toda a Dinamarca. Mestre Joris, no entanto, começava a duvidar da capacidade de levar essa missão a cabo uma vez que estava balançando de um lado para o outro dentro de um navio.
Um navio no qual não deveria estar.
Enquanto o príncipe, em mangas de camisa, dependurava-se tal qual um lêmure exótico nos cabos dos mastros, parecendo mais feliz do que jamais estivera em qualquer uma de suas lições.
— Mestre Erik, por favor! — lamentou-se o tutor escorando-se em um barril quando o príncipe saltou de um cabo para o outro. — Seu pai vai me mandar para o exílio...
Erik, com a cabeleira negra bagunçada pelo vento e a pele que antes era de porcelana agora morena pelo sol, aterrissou na frente do mestre parecendo muito satisfeito consigo mesmo.
— Você se preocupa demais, Joris. Sinta a deliciosa brisa do mar! — disse ele passando um braço ao redor dos ombros do mestre e levando-o até a amurada onde uma chuva de gotículas salgada os molhou.
Joris enxugou o rosto, consternado, utilizando um de seus muitos lenços.
— Não é isso, jovem Erik, mas uma questão de princípios. Não fui contratado para mentir para o seu pai, fingindo que estamos visitando ótimos internatos na Espanha, quando na verdade pegamos um navio para... para... — ele engasgou com a palavra, horrorizado por sequer pronunciá-la em voz alta. — o Novo Mundo!
Parecia um sacrilégio quando dito por ele.
— Você disse que se eu embarcasse sozinho iria correndo contar para o meu pai. — retrucou Erik, cruzando os braços. — Não me deixou opção.
Joris pareceu ofendido.
— Quando o herdeiro do trono da Dinamarca resolve embarcar em uma missão potencialmente suicida, é dever de seu tutor real cuidar dele e da coroa!
Uma sombra passou pelo rosto de Erik, não durou muito tempo e não foi o suficiente para o empertigado mestre perceber, mas ela estava lá, tão real e palpável quando os olhos azuis que enfeitavam o rosto do príncipe.
— Não foi uma mentira tão grande assim — Erik deu de ombros — nós fomos mesmo para a Espanha. E iremos para o Novo Mundo por uma boa causa!
O tutor parecia prestes a argumentar, com certeza usando um de seus longos discursos, mas foi interrompido pelo grito de um dos marinheiros.
— Homem ao mar!
Imediatamente todos os marujos correram para a amurada oposta a de Erik e de seu mestre, debruçando-se e lançando cordas. Um deles saltou amarrado por um cabo. Quando Erik conseguiu abrir espaço entre a tripulação viu que a água estava tomada por escombros do que um dia deveria ter sido um bote. Agarrado em uma prancha de madeira, um marujo atarracado boiava a esmo, talvez morto.
Apreensivo Erik assistiu ao resgate até o náufrago estar deitado no chão do Príncipe Dinamarquês, seu navio comprado com o acúmulo de todas as suas mesadas. O navio que seu pai sequer desconfiava que tivesse arranjado, muito menos que velejava. E que agora inclusive resgatava náufragos misteriosos!
O capitão do Príncipe Dinamarquês constatou que o homem estava vivo, embora em condições muito frágeis, e ordenou para que fosse alojado em uma das cabines enquanto o médico não desse um parecer sobre o caso.
Excitadíssimo com toda a agitação, Erik acompanhou o médico junto de Mestre Joris até uma das cabines, servindo de auxiliar. Pegou água, panos, ajudou a cortar a roupa do moribundo e ficou fascinado pelas tatuagens que cobriam o tronco dele.
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O Devorado
RomanceE se a pequena sereia se apaixonasse pelo príncipe errado? O herdeiro do trono da Dinamarca está em busca de um elixir miraculoso que resolveria todos os problemas de um homem. Serena, sua companheira de viagem, é a sereia que um dia o salvou de um...