Capítulo 2 - Ratos no porão

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— Você foi muito ousada aparecendo para ajudar o corsário — comentou Erik, jogando-se na cama de sua cabine. Ele já estava andando de um lado para o outro e falando fazia uns quinze minutos, de forma que a pausa foi bem vinda. Ele entrelaçou as mãos na altura do peito e suspirou. — Ele disse uma coisa interessante, sabe? — falou o príncipe olhando para o alto.

Do outro lado da pequena cabine, enroscada em uma manta enquanto lia um livro, estava Serena. Toda sua atenção estava voltada para a leitura, pois Serena vinha achando já há algum tempo que seu orgulho não merecia ficar tão vulnerável aos caprichos do príncipe, afinal todo mundo no castelo parecia saber dos sentimentos dela por ele — exceto o próprio Erik — desde que ela aparecera pela primeira vez lá, na praia do castelo, de forma que agora ela vinha se ocupando em tentar mostrar ao príncipe que existiam coisas mais importantes na vida dela do que ele, como por exemplo, o livro de romance que fingia estar lendo.

O fato de ter fugido escondida com ele para a Espanha e de ter embarcado no Príncipe Dinamarquês sem contar para ninguém não queria dizer nada.

— Você está me escutando? — perguntou Erik, erguendo-se nos cotovelos.

Serena fingiu estar surpresa, marcando a página com um dedo. Erik fez uma careta.

— Você anda bastante estranha desde que embarcamos. Está arrependida de ter vindo comigo? — ele parecia genuinamente ansioso diante da perspectiva dela estar arrependida por ter fugido do castelo. Seus olhos azuis percorreram as paredes da cabine como se pudessem identificar a origem da súbita mudança de comportamento da amiga — você está constrangida por estar dividindo o quarto comigo? — Erik arregalou os olhos conforme novos pensamentos cruzavam sua jovem e aventureira cabeça. Serena quase podia ver os fios de raciocínio fazendo caminhos de minhoca na testa dele. — Meu Deus, Serena, eu não quis ser inadequado... Juro que quando ofereci que ficasse na cabine comigo não pensei que pudesse te deixar constrangida ou manchar sua reputação. Prometo que do que depender de mim ninguém nunca saberá... — Erik mordeu os lábios parando de falar abruptamente enquanto ela acenava os braços no ar, tentando calá-lo.

Às vezes Erik queria muito ouvir a voz da amiga, mas Serena tinha um pequeno grande problema: era muda.

Quando ele finalmente se calou, ela suspirou e lentamente gesticulou para ele que não se importava de compartilhar a cabine e que só estava distraída com o livro.

Afinal, você fala demais. Ela acrescentou com um rolar de olhos.

Erik fez um muxoxo.

— Desculpe se eu me empolguei. Mas se você se sentir incomodada comigo ou com a cabine, promete que me avisa?

Ela adorava quando ele a encarava com aqueles olhos grandes, cheios de ternura. Às vezes ela sentia que esse garoto príncipe poderia obter o que bem entendesse se simplesmente a olhasse com vontade. Serena corou, então tentou esconder o rubor com um dar de ombro casual, que fez com que seus cabelos caíssem ao lado das bochechas em longas ondas louro avermelhadas.

Ela deixou o livro de lado e se acomodou melhor na cadeira.

O que você disse que o corsário contou de interessante?

Erik voltou a se deitar, tamborilando os dedos.

— Ele estava contando sobre um capitão pirata, o Devorador. Disse que ele é filho de uma sereia e que encanta as pessoas, homens e mulheres.

Serena franziu a testa.

Nunca ouvi tal coisa antes.

— Nem eu! — suspirou Erik — mas fico me perguntando que tipo de conhecimento esse homem deve ter. Esse capitão, o Devorador, digo.

O DevoradoOnde histórias criam vida. Descubra agora