Quando desejava, Aksel podia se transformar em um tritão. Este era de longe o dom mais desconcertante e maravilhoso que a bruxa lhe dera, mas o deixava constantemente incomodado, apesar do efeito bonito que suas escamas tinham, não era prático usá-las no dia a dia. Levava um tempo para se livrar delas e ele sempre se sentia vulnerável e exposto enquanto esperava com que secassem para desapareceram sob a pele, deixando-o nu aonde quer que estivesse.
Oculto pelo manto da noite e embalado pelas ondas, que gentilmente o jogavam contra o casco do Benevolente, sem ser visto por ninguém, o capitão não estava realmente incomodado agora com sua cauda. Ela era negra e lustrosa, invisível para os olhos distraídos.
Aksel rondou o navio, espiando as vigias. Os piratas de Drake sempre foram preguiçosos e a maioria descuidada. As vigias estavam vazias e não parecia ter ninguém em nenhuma das amuradas. Aksel usou a corda de um dos botes e a corrente da âncora para se içar pelo casco, as barbatanas se arrastando na madeira molhada, fazendo com sentisse cocegas.
Chegando ao topo se jogou por cima da amurada, caindo no deque com o barulho inconfundível de um corpo molhado tocando o chão. Uma vez uma foca havia invadido seu navio. O barulho nada elegante o fazia se lembrar dela. Assim como o patético movimento de se arrastar que Aksel se obrigara a fazer para se esconder atrás dos barris, para ter tempo de sumir com as escamas e ganhar pernas de novo.
Talvez não tivesse sido dos seus planos mais inteligentes, mas agora já estava em execução.
Ele se recostou em um dos baús e esticou as barbatanas negras, usando uma rede esquecida por ali para tentar diminuir a umidade. Não demorou muito. Logo as escamas foram sumindo como se não passassem de uma ilusão, um sonho vaporoso, e as pernas dele estavam de volta. Aksel aguardou um pouco mais, mas como nenhum pirata apareceu, arriscou-se a sair do esconderijo.
Imaginou que Drake, se tivesse realmente capturado Una, só poderia estar mantendo-a em algum compartimento no porão, talvez em barris ou alguma outra coisa que servisse de aquário. Se não fosse isso, a teoria de Aksel estaria completamente errada e ele teria se arriscado a toa.
Desceu as escadas rumo ao porão sem cruzar com viva alma e se perguntou se Drake teria alojado todos os tripulantes no palácio ou hospedado em algum lugar no porto, deixando o navio a esmo, mas a ideia parecia um tanto arriscada, principalmente caso ele estivesse em posse da bruxa.
O porão do Benevolente era úmido e cheirava a podridão. No centro dele havia uma espécie de aquário com paredes de vidro grosso e sujo que Aksel não fazia ideia de onde Drake poderia ter conseguido, mas ali estava. Uma rede velha cheia de fungos e algas apodrecidas estava jogada ali perto, um esqueleto de peixe boiava na água turva. Embora enojado, Aksel se aproximou, tocando as paredes de vidro para manter o apoio no chão com limo escorregadio.
Uma pequenina mão acompanhou o reflexo da dele, então um rosto pálido, com olhos esbugalhados surgiu no topo do aquário, um tentáculo branco ajudando-a a manter o equilíbrio.
— Olá, velha amiga! — Aksel sussurrou, aliviado por vê-la. Ela parecia indefesa ali e muito pequena. Bem, ela era pequena, pelo que se lembrava. Seu corpo era do tamanho de uma criança, com cabelos brancos que pareciam algas e da cintura para baixo Una tinha tentáculos como se fosse uma espécie de polvo albino. O poder dela não residia na aparência ou na voz, mas em sua própria magia, coisa que ela não parecia possuir muito agora que estava fora do mar e presa no porão imundo de um navio pirata.
— Príncipe! — Una sibilou com sua voz molhada, exibindo dentinhos pontiagudos enquanto sorria. As guelras em seu pescoço abriram e fecharam e ela fechou uma mão diminuta ao redor do punho dele, com seus dedos de ventosa. — O outro pegou seu rosto, não pude lutar contra ele. — ela parecia pesarosa.
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O Devorado
RomanceE se a pequena sereia se apaixonasse pelo príncipe errado? O herdeiro do trono da Dinamarca está em busca de um elixir miraculoso que resolveria todos os problemas de um homem. Serena, sua companheira de viagem, é a sereia que um dia o salvou de um...