UM DIA PARA ESQUECER

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⚠️ ALERTA ⚠️

Possíveis gatilhos e conteúdo sensível!

Não foi prazeroso escrever esse capítulo, aliás , senti muita raiva... mas precisava dele para o desenvolvimento da história.

Então, preparem o lencinho e arma de estimação, se resolverem seguir adiante.

Um pequeno spoiler: essa é a última tempestade, antes dos ventos começarem a soprar favoravelmente do jeito que vocês querem.

VOTEM E COMENTEM!

E por favorzinho, não me odeiem!
❤️🥰❤️🥰

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Néftis

Quando pedi para Seth investigar as masmorras de Atlys, imaginei receber de volta apenas o cadáver da minha mãe, se tivesse sorte. Porque diferente da prisão daqui, aquele lugar era insalubre para qualquer ser vivo e eu duvidava que minha progenitora tivesse sobrevivido ali por mais de mil ciclos. Eu era apenas um filhote recém-nascido quando ela foi deixada naquele lugar para morrer. Mesmo que Jendayi não tivesse dito isso, mas ficou bem óbvio. Não haveria como ela lidar comigo depois que todos soubessem da minha existência. Agora como ela lidou com minha mãe é que é um grande mistério. Como ninguém jamais a procurou?! Não deveria ser tão fácil assim relegar alguém da realeza ao esquecimento.

Só que as coisas não saíram como previ e para o modo que me preparei psicologicamente. Todas as minhas defesas caíram por terra quando recebi de volta, não um cadáver sem vida, mas ainda um ser com aspecto de cadáver, respirando só pela força de vontade mesmo. Estava tão magra que sua pele se grudara aos ossos. Ela fedia a um bueiro imundo, mesmo eu tendo reparado que aqueles que a resgataram, tiveram o cuidado de fazer uma reparação em sua higiene, mas algo muito pobre para o que ela realmente precisa. No entanto, mesmo suas faces sujas e debilitadas deixavam transparecer o quanto se parecia com aquela naga miserável.

Néftis?! — meu macho me chama em minha mente e só agora percebo que Eliot me olha com cara assustada.

— Não me diga que ela não vai… — não consegui terminar a frase. Simplesmente não passava em minha mente que ela não fosse sobreviver. Era um golpe duro demais.

— Pare, querida…! — Seth me pede e só agora percebo que ele está segurando minhas mãos e não apenas isso, está tentando abri-las. Mas o quê?! Olho para baixo e vejo uma poça com meus fluidos se formando. Sequer senti a dor das unhas dilacerando minhas palmas, mas elas estavam lá, firmes na carne e meu macho estivera tentando me fazer parar, enquanto me mantive em transe.

— Filha, ela chegou a tempo de ser salva! — o curandeiro me fala com sua voz mais compassiva — Temos tecnologia suficiente para isso e mesmo que não tivéssemos, sei que seu companheiro daria um jeito. — ele sorri, o que me faz relaxar e afrouxar as mãos. Seth se apressa em usar um regenerador em minhas feridas e é nesse momento que meu novo pai avisa: — Ela vai precisar de um banho, para que possa ver melhor suas feridas e possa usar o regenerador com mais segurança. Sugiro chamar as servas…

— Não! É melhor não fazer alarde! — interrompo-o — Eu mesma faço isso.

— Tem certeza?! — Meu macho parece ter sérias dúvidas sobre minha capacidade emocional para lidar com essa situação e não posso tirar sua razão, já que há pouco estive sangrando minhas próprias mãos sem nem mesmo perceber.

— Ela é a minha mãe…eu posso fazer isso! — tentei ser o mais convincente possível, porque dada a situação que ela se encontra, nem eu mesma tenho certeza de poder fazê-lo sem me quebrar no processo.

Os dois se entreolham e se afastam do meu caminho. Pego minha frágil mãe no colo e uma náusea me atinge com força ao sentir seu cheiro fétido tão de perto. Ignoro isso, aliás ignoro qualquer protesto que meu corpo possa fazer diante dessa situação. Não se trata sobre mim, é ela quem suscita cuidados.
Há uma área de banho perto dos aposentos onde estou instalada e é para lá que a levo com todo esmero. Céus! Ela não pesa quase nada, não mais que um filhote subnutrido. É só pele e ossos.

Arranco os trapos velhos que cobrem pobremente seu corpo e me deparo com uma fêmea em seu pior estado de miséria. Novamente tive que conter as ânsias de vômito. Meu estômago teimava em se revolver. A pobre criatura estava sendo comida viva por vermes. Onde havia ferida, lá tinha as coisas asquerosas e até mesmo em suas partes íntimas, nas partes superficiais. Pelos deuses! Não lhe deixaram tomar um banho sequer nesses milhares de ciclos?!
Nesse momento percebi que essa vingança não pertence a mim, mas a ela. O que Jendayi fez a mim não foi nada comparado ao que fez com ela.

Lavei-a cuidadosamente, primeiro amolecendo as crostas em sua pele e removendo os vermes. Apertei um botão na lateral da piscina para que toda a água podre fosse levada embora e esta fosse desinfetada e tornasse encher de água limpa. Refiz o processo, esfregando a pele frágil com delicadeza, procurando os pontos sujos que deixei para trás na primeira lavada. Esvazio a piscina, outra vez e volto a recomeçar; agora hidratando a pele e os cabelos necessitados.  Já consigo ver suas feições direito, ela já parece com uma pessoa e não com um animal.

Não consegui desembaraçar seus cabelos por completo e tive que cortá-los pouco abaixo dos ombros. Não tive como salvar o restante. Dou uma última avaliada em seu corpo parcialmente submerso, para ver se não deixei nenhuma sujidade para trás, inclusive em suas partes íntimas. Não havia mais nada. Os ferimentos continuam ali, porém agora estavam devidamente higienizados.
Seco-la completamente e ela continua parecendo um objeto inanimado. Se não fosse por estar respirando, juraria estar dando banho no que chamam de boneco.

Depois disso, enrolo-a numa roupa de banho e levo-a de volta para Eliot. Ele e Seth estão andando de um lado para o outro e só agora me dou conta de quanto tempo se passou desde que a levei. O dia está quase amanhecendo. Passei horas com ela na ala de banho. Estou com os nervos em frangalhos e agora sou eu quem precisa, ao menos, se lavar.

— Cuide dela, pai! — Peço, mesmo sabendo que irá fazê-lo e é desnecessário esse pedido — Seth, preciso de um banho, mas estou incapaz de fazer isso sozinha! — falo em sua mente, já sentindo minhas pernas afrouxarem.

No segundo seguinte, estou em seu colo. Inesperadamente, ele me leva num lavabo mais simples, mas ali perto. Certamente, ciente de que o outro local reavivaria lembranças das feridas recém-abertas. Não é como se tivesse se passado muito tempo, enfim, elas ainda estão vívidas em minha mente. Porém, sou-lhe grata por esse zelo.
Após o banho e vestir roupas novas, ele me leva para uma área aberta, com vista para o horizonte. Aqui não seremos vistos. Temos estado aqui de vez em quando. Ele praticamente me obriga a sentar um pouco e beber um líquido nutritivo.

— Néftis… — o modo como pronuncia meu nome já não indica bom presságio. Sei que há algo mais que precisa ser dito e estando preparada ou não, tenho que ouvi-lo — obtive informações de que seu pai foi vendido como escravo por Jendayi…mandei investigar, mas até agora não encontrei nada… — ele prossegue, um tanto cauteloso no falar.

— Está tudo bem…— sorrio amargamente, incerta se posso ter esperanças de que ele seja encontrado com vida.

Ele me compreende e recebe minha frustração, não como uma medida negativa, mas como algo que não pode ser controlado e apenas me abraça.
Estou tão cansada! Só quero esquecer a parte tenebrosa desse dia.

NÉFTIS E O CEIFADOR DE MUNDOS: Contos Alienígenas Onde histórias criam vida. Descubra agora