"Não foi o fim do mundo, mas algo dentro de mim morreu." — Animicida.
9 anos atrás
Vermelho.
Roxo.
Verde.
Colorações que se encontram em cada hematoma do meu corpo.
No banheiro, através do espelho, vejo as marcas que já haviam sumido e estão visíveis novamente. Passo a mão delicadamente em meu braço esquerdo e penso:
Até quando isso será assim?
Começou a escurecer, daqui a pouco ela estará em casa e mais uma vez me encontro aflita, aguardando o momento em que sentirei dor novamente, sem poder gritar pedindo ajuda, sem esperanças de um dia sair dessa casa e me ver livre dela. Sei que ninguém virá em meu clamor, ou irá me salvar, não até que seja maior de idade e me liberte, eu mesma, dessa tortura.
Já são sete horas e estou deitada no sofá com os olhos fechados, mergulhando nos últimos minutos de paz da noite. Este é um dos momentos em que mais sinto falta do meu irmão, mas preciso passar por tudo isso em silêncio para não colocar a vida dele em risco. Sei a influência que Marina tem sobre as pessoas e não seria muito difícil ela fazer mal a ele.
Imersa em meus pensamentos, tomo um leve susto quando olho para o lado me deparando com minha tia. Com seus olhos arregalados, tentando me causar mais pânico, ela se aproxima. Nem parece irmã da minha mãe, que era uma mulher linda e cheia de graça, com a alma leve. Já ela, é apenas uma mulher que lembra o diabo em pessoa.
Sua expressão deixa claro que ela não está satisfeita, e tenho certeza de que o que seguirá não será nada bom. Luto para não deixar transparecer as fisgadas de dor em meu corpo enquanto tiro os fones, abandonando a música de James Arthur — "Train Wreck", que mais parece um prenúncio do que está por vir. Olho para ela de baixo a cima e, quando estou prestes a encarar seu rosto, meu olhar trava assim que vejo um cinto em suas mãos, um dos meus piores pesadelos, do qual não consigo me livrar.
Meu subconsciente grita dizendo:
Corre... Corre... Corre...
Mas é aquele ditado: "Se correr o bicho pega, se ficar, o bicho come."
— Ayla, é uma pena você me lembrar tanto da minha irmãzinha. — com certeza fala isso por eu ser a cópia da minha mãe. — Como eu poderia olhar para você e não fazer nada...
Marina me encara com um sorriso diabólico nos lábios, seus olhos faiscando com uma malícia gélida. Me sento no sofá, forçando-me a encará-la, enquanto me esforço para controlar minha expressão e esconder o medo que estou sentindo, porém sua expressão ameaçadora parece diluir qualquer tentativa de dissimulação.
— Não vai falar nada? — se inclina em minha direção e segura meu queixo com força. Mesmo sentindo dor em seu aperto, me mantenho calada. — Levanta. — ordena, soltando meu queixo bruscamente.
— Tia, mas eu não... — minhas palavras são interrompidas abruptamente quando uma chicotada atinge meu braço esquerdo, provocando uma dor ardente que me faz calar instantaneamente.
Admito que doeu mil vezes mais do que das outras vezes.
O que mais odeio é que ela me veja assim... vulnerável. Nesses anos que Marina vem me batendo sem um motivo aparente, descobri que ela realmente é uma pessoa ruim. Ela tem prazer em observar meu sofrimento e infelizmente, hoje estou em desvantagem. Tudo o que fizer comigo essa noite, será mais intenso do que das outras vezes, já que meu corpo ainda não se recuperou da surra anterior.
— Só um castigo para aprender a não me chamar mais de tia! — Marina rosna com irritação, como se eu fosse a única válvula de escape para sua raiva incontrolável.
Como queria me livrar desse tormento... o que fiz para merecer algo assim?
— O que eu te fiz? — pergunto, minha voz vacilante, mas ainda repleta de resistência. Quero uma resposta, a mesma que uma parte de mim tema o que pode vir a seguir.
Ouço o som do chicote cortando o ar, um estalo acompanhado por uma queimação insuportável em cada lado dos meus braços. O engasgo vem junto com a dor aguda. Meus olhos lacrimejam, mas me recuso a chorar, ainda que cada golpe encontrado rasgue não apenas minha pele, mas também minha determinação.
Não vou dar esse gostinho a ela, não mesmo! — exclamo mentalmente.
Sempre que me contenho para não chorar, parece que a deixa ainda mais irritada e, por mais que doa, prefiro suportar a dor a mostrar fragilidade.
Esboço um sorriso fraco e minha visão fica um pouco turva, fecho os olhos com força e abro novamente. Observando seu rosto, vejo uma mistura de irritação, raiva e o mais puro ódio em seu semblante. Ela me empurra com força no sofá, arrancando minhas roupas com agressividade e me causando dor em cada toque. Quando percebo, estou nua diante dela, sem qualquer proteção.
Marina começa a me golpear com o cinto, nos braços e pernas. Me curvo sobre meus joelhos quando atinge minha barriga e um grito escapa de meus lábios ao senti-la chicoteando minhas costas diversas vezes. Admito que ela é muito esperta, sempre atinge em partes do meu corpo que não podem ser vistas.
Meus pensamentos se tornam um turbilhão de desespero, enquanto cada estalo do cinto é como um trovão em minha mente. Minhas unhas se cravam no tecido do sofá, e meu coração bate descontroladamente no peito, como um pássaro encurralado. A dor se entrelaça com minha respiração ofegante, e meus olhos se enchem de lágrimas, mas eu me recuso a soltar um único soluço. Não vou dar a ela a satisfação de ver minhas lágrimas.
Cada golpe é um lembrete cruel de minha impotência, uma contagem regressiva para a próxima chibatada. Minha pele arde, meu corpo treme, mas a determinação em não ceder permanece inabalável. As lágrimas continuam a se acumular, mas eu engulo, como se minha própria saliva fosse uma barreira contra a humilhação que ela deseja infligir.
Quando ela finalmente para, sai do cômodo sem dizer mais nada e me levanto com dificuldade, sentindo todo meu corpo ardendo. Algo molhado começa a deslizar pelas minhas costas e encaro meu braço esquerdo, notando o sangue e, provavelmente, minhas costas estão em pior estado. Terei que usar roupas que cubram meu corpo inteiro por mais algumas semanas e, felizmente, estamos em uma época mais fria.
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Decepções e as Sombras do Passado
Romans"Irei me esconder nas sombras do passado, mas não levarei ninguém comigo." Ayla Ricci já foi feliz e sonhadora, mas tudo mudou quando ainda muito nova, percebeu que a vida pode ser bem difícil e a realidade se mostrou nada parecida com o que imagina...