Capitulo 07

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Beanard


Eu esperei a minha mãe sair de casa e iniciei uma procura no sótão, queria descobrir a verdade e todas as respostas que precisava estava dentro do baú e foi terrível arrastá-lo até meu quarto e esconder as "evidências" dentro do meu closet. O mais interessante era o grimório, ele se comunica comigo.
Eu poderia estar passando por um surto psicótico ou um estresse pós traumático, e tudo não passar de uma ilusão?
Sim, poderia!
O problema eram as fotografias que comprovam que não fiquei louco, encontrei várias fotos dos meus avós maternos ao lado de pessoas desconhecidas. E todas datadas, a última foto foi tirada em 1964. Eram meus avós segurando um bebê… minha mãe!
Fiquei sentado na minha cama, olhando aquela foto não querendo aceitar as mentiras que me cercam.
A minha mãe era uma bruxa.
Era uma descoberta perturbadora, porque a dona Norris sempre foi uma mulher devota à igreja. Não fazia sentido a minha mãe ser descendente de uma longa linhagem de bruxas.
Ela nunca falava sobre meus avós, só tinha dois porta-retratos deles no pequeno balcão da sala de jantar.
O meu pai também evitava falar dos sogros e sempre ficava desconfortável quando o Hátila iniciava as suas perguntas sobre o passado da nossa família.

― Eu vou encontrar um lugar mais seguro para guardar as fotos. ― Murmurei comigo mesmo.

A minha mãe não pode imaginar que encontrei o baú, acho que guardá-lo no meu closet foi uma péssima idéia.
Tudo bem, só pretendia ficar com o grimório, os documentos que estavam nas patas e tem o porta-jóias que ainda não verifiquei.
Eu corri até o closet e me abaixei para pegar o porta-joias. Ele era pesado, feito de madeira e tinha um estilo retrô.
As jóias estavam todas protegidas por um tecido de cetim. Havia alguns anéis e vários pingentes com o símbolo da Lua Tripla, mas um pingente em especial ganhou minha atenção. Era uma chave prateada e personalizada, a sua base tinha o símbolo da Lua Tripla e no centro da lua cheia havia uma estrela de cinco pontas cravejada com pedras azuladas. A corrente era trançada e grossa, com certeza para aguentar peso do pingente que tinha mais de cinco centímetros.
Muito maneiro, coloquei a corrente ao redor do meu pescoço e continuei a vasculhar o porta-joias.
Encontrei um saquinho de veludo e decidi abrir para ver o que tinha no seu interior. E não foi nada surpreendente, era outra corrente, mas… mas… o pingente… era um crucifixo cravejado por rubis.
O meu corpo começou a tremer novamente, senti um vazio estranho no peito e um desespero angustiante. Eu segurei o crucifixo, analisando com cuidado. Imagens bizarras chegam na minha cabeça: mulheres sendo queimadas em grandes fogueiras, homens enforcados e sangue… muito sangue.
Eu me levantei assustado, derrubando a corrente no chão.
Que porra foi isso?

"Os caçadores", o grimório sussurrou. "Eles estão chegando".

Um zumbido muito forte no meu ouvido esquerdo me fez gemer de dor. A minha cabeça latejou e perdi os sentidos por alguns minutos.
Respirei profundamente, esperando a dor diminuir.

"Esconda-se, eles estão chegando". O grimório voltou a sussurrar.

Era a corrente com o crucifixo que estava me torturando. E não conseguia ignorar o péssimo pressentimento que foi me consumindo, era melhor colocar aquele baú no sótão novamente e ficar longe do crucifixo de sangue.
Joguei a corrente bizarra dentro do porta-jóias e guardei no baú. Alguns objetos deviam permanecer no mesmo lugar, era melhor manter alguns monstros no sótão e não tentar libertá-los.
Eu estava pronto para arrastar o baú para seu devido lugar, mas ouvi o telefone residencial tocando. 
Caralho, agora não era o momento!
Respirei fundo e desci correndo para atender a ligação. A televisão ainda estava ligada, transmitindo uma reportagem ao vivo.

― Uma criança de apenas nove anos foi encontrada morta. A brutalidade do assassinato está assombrando as autoridades. O corpo de Allana Sullivan estava próximo do lago Loch, local muito frequentado por turistas e por amantes da natureza que gostam de apreciar as trilhas seguras da floresta.

O telefone tocou novamente e quase morri de susto. Atendi a ligação e ouço a voz da minha mãe.

― Filho, estamos voltando para casa. Hátila recebeu alta. Eu tentei ligar no seu celular, por que não atendeu?

Ah, esqueci o celular em cima do sofá.

― Desculpa, não estava com meu celular.

A minha mãe continuou falando do outro lado da linha, mas minha atenção ficou presa na reportagem.

― Allana foi brutalmente esquartejada, o seu corpo foi encontrado sem os olhos, a língua e sem o coração. Símbolos misteriosos foram desenhados na sua pele, as informações que recebemos é que a criança pode ter sido vítima de um ritual satânico.

E novamente aquele zumbido no meu ouvido me fez ranger os dentes de dor.

― Beanard, ainda está na linha?

― Sim… pode ficar tranquila… ― Droga, que dor. ― Mãe, você está assistindo o noticiário?

― Oh, não estou. Eu só percebi uma agitação no hospital.

― Encontraram uma criança morta próximo do lago.

― O quê? Não posso acreditar.

― Sim, o nome dela era Allana Sullivan e tinha nove anos. ― Contei, bastante impressionado com o noticiário.

― Agora faz sentido, a nossa cidade está ficando muito obscura, eu sinto cheiro de sangue no ar ― Retorquiu.

Cheiro de sangue no ar?

― Você conhecia a criança ou a família dela? ― Quis saber.

― Não conheço nenhuma família com o sobrenome Sullivan. ― A sua voz ficou rouca. ― Não saia de casa, Beanard. Estou assinando uma documentação no hospital e pretendo chegar o mais rápido possível.

― Tudo bem, mãe. Eu vou ficar em casa, não se preocupe.

― Ótimo, eu te amo e não abra a porta para ninguém.

A minha mãe desligou a chamada.
Alguma coisa anormal estava acontecendo lá fora, eu me aproximei da janela e fiquei observando a rua. E não notei nada de diferente no clima ou na vizinhança, a única coisa estranha que aconteceu foi sentir na minha boca um gosto característico que somente o sangue tem.
Será que mordi a língua e não percebi?
Era melhor ignorar aquele gosto ferroso na minha boca e levar o baú até o sótão, antes que a minha mãe chegasse. E me preparar psicologicamente para aceitar um demônio na minha casa. Eu tinha um grimório, e não poderia procurar a igreja. As imagens dos homens enforcados chegaram na minha cabeça.
Com certeza era uma péssima idéia contar para o sacerdote sobre o Vanitas. Eu sei que não vivemos mais no século XV e a inquisição não voltará, mas a igreja pode me considerar um pecador. 
O grimório Gardner pode me ajudar a expulsar o demônio e trazer o meu irmão de volta. Peguei meu celular em cima do sofá e voltei para o meu quarto.
Vanitas vai se arrepender, vou encontrar uma maneira de mandá-lo para o inferno.

VANITAS - Memento mori Onde histórias criam vida. Descubra agora