Capitulo 10

411 72 14
                                    

Vanitas

A minha maldição destruiu qualquer resquício de sanidade que eu ainda poderia ter. Eu fiquei olhando a jovem bruxa se afastar, sentindo o seu perfume adocicado no ar. O meu movimento foi involuntário, não queria tocá-la… a minha intenção era completamente diferente.
Eu senti um leve formigamento no corpo.
Pelos Deuses, não deveria ter me impressionado com a beleza dos seus cachos que atingiram um tom de folhas de outono na luz do sol.
Algumas mechas eram levemente avermelhadas.

― Está pronto para conhecer o seu novo lar? ― Norris indagou mantendo um sorriso no rosto.

Os seus olhos estavam inchados devido às lágrimas, mas a sua expressão parecia mais relaxada.
Eu apenas afirmei com a cabeça.
A única referência de lar que conheci se perdeu no tempo e minha solidão foi torturante durante 900 anos, quando conheci o espírito dourado me senti… acolhido. E naquele momento acreditei que minha solidão teria fim e aprendi que luz acolhe a escuridão e elas podem se tornar grandes aliadas.

― Azlynn só ficou envergonhada, algumas bruxas mantêm a sua pureza para participar de rituais de fertilidade, não precisa ficar preocupado.

Soltei uma risada sarcástica. Elas continuam com os festivais de fertilidade?

― As bruxas ainda escolhem os seus coniugis por rituais repletos de orgias?

Norris enrubesceu, pegando a mochila que estava na parte de trás do carro.

― Eu não faço ideia como funciona.

― Bom, eram ocasiões muito esperadas pelos Covens. ― Expliquei. ― As bruxas tinham a sua magia conectada com o parceiro, algumas ligações se tornavam fortes como um castelo e nenhum poder existente conseguia separá-los. Elas trepavam com vários parceiros em uma única noite até encontrar um coniugis que a sua magia aceitasse a ligação, algumas bruxas dormiam com 5 machos ou mais.

― Hátila, eu não precisava de tanta informação…

― Vanitas! ― Corrigi, ganhando um olhar surpreso da Senhora Gardner. ― Foi como o seu filho me chamou, e gostei do significado do nome.

― Obrigada por ser honesto comigo.

― A honestidade está ligada aos seres de honra, não estou sendo honesto. É um aviso para não esquecer a minha verdadeira natureza. ― Sorri, caminhando em direção a casa e acrescentei na língua dos mortos: ― Pelle sub agnina latitat mens saepe lupina*.

***

A sala principal da casa era ampla, completamente diferente da cabana que foi meu refúgio e também uma prisão durante o passar dos séculos. Azlynn estava sentada num imenso estofado azulado, ela evitou me encarar ou falar comigo. O cômodo tinha cores suaves, transmitindo uma sensação de tranquilidade. A única singularidade que senti no ambiente foi o cheiro forte de magia arcaica.
 
― O lugar é simplório… ― Murmurei.

― Ah, não somos ricos. ― Norris respondeu, analisando os meus movimentos. ― Eu sinto muito!

― Está tudo bem, sempre morei em uma cabana na floresta. Ela foi meu lar e minha prisão, gosto de lugares simples…

― Como? Você morava em uma cabana na floresta? ― Azlynn levantou-se, me encarando com uma expressão abalada.

― Sim, era meu refúgio. A divindade que me amaldiçoou conhecia a localização da cabana.

A jovem bruxa ficou pensativa por alguns minutos, mordendo o lábio inferior. O gesto foi chamativo, muito atraente e não consegui controlar aquela sensação quente percorrendo o meu corpo. Ela tinha lábios bonitos e um sorriso capaz de enganar até mesmo a inteligência dos Elfos de Ellyllon.
O cheiro de magia ficou mais forte, me despertando do feitiço luxurioso da bruxa. Pelos Deuses da Calamidade, eu deveria ficar longe daquela mulher.
Um barulho na escada chamou minha atenção.
Beanard desceu os degraus.
O garoto me encarou daquela maneira desafiadora. Ele tinha coragem ou era muito inconsequente.

VANITAS - Memento mori Onde histórias criam vida. Descubra agora