Capítulo 06

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Beanard


Cheguei em casa e um silêncio doloroso dominou o lugar que um dia foi repleto de felicidade. Eu gostaria de reviver cada momento ao lado do meu irmão, só aprendemos o valor do tempo ou de um momento quando se torna uma simples lembrança. Não queria subir as escadas e passar em frente ao antigo quarto do Hátila, cada cômodo desta casa me fazia lembrar dele, mas aquele quarto era uma tortura.
Eu me sentei no sofá e liguei a televisão.

― Beanard. ― A voz da minha mãe me fez sobressaltar. Olhei para trás, encarando o seu semblante preocupado. ― Não deveria estar no hospital, cuidando do seu irmão?

Ele não era meu irmão!

― Hmm, ele não está sozinho. A sua querida Azlynn ficou no meu lugar. ― Respondi seco.

― Eu preparei uma torta de carne, vou tomar um banho e ir para o hospital. Bean, está tudo bem?

― Relaxe, dona Norris. Eu estou bem, também preciso de um banho e descansar um pouco.

Era difícil encarar a minha mãe. Ela estava agindo normalmente de novo, ignorando os eventos assustadores que resultaram na volta do meu "irmão".
Quando o meu pai morreu a sua atitude foi semelhante. A minha mãe queria ocupar o vazio que nosso pai deixou em nossas vidas e passava dos limites.

― Eu concedi algumas entrevistas, falei sobre o resgate do seu irmão e da sua recuperação.

― E pediu um pouco de privacidade? ― Indaguei, virando-me para assistir a matéria que passava no jornal local. ― O Hátila não está normal, você percebeu a diferença, né?

― É claro que percebi, mas no momento precisamos apoiar o seu irmão e não questionar o seu comportamento estranho, devemos agradecer a Deus pelo milagre que recebemos.

Balancei a cabeça em negativa e comecei a rir.

― É devemos agradecer a uma divindade pela maldição. ― Debochei.

― Beanard Gardner, peça perdão a Deus pela blasfêmia. ― Ela esbravejou.

― Sinto muito informar, mãe. O seu Deus cristão não é único que existe.

Ela abriu a boca para me repreender, mas desistiu. E ficou me analisando de uma maneira inquietante, seu lábio inferior começou a tremer.

― Mãe, qual é o problema?

― E-eu… vou tomar um banho e ir para o hospital, a torta está em cima da mesa. ― Ela começou a subir as escadas. ― É melhor se alimentar, e recuperar as suas energias.

Eu queria ser como ela.
O seu companheiro morreu? Você pode esquecer, planejando festas para ocupar o seu tempo.
O seu filho mais velho sofre um grave acidente na floresta e volta completamente mudado? Era simples, faça uma torta e conceda entrevistas às emissoras.
A raiva começa a fervilhar meus pensamentos, a falsidade sempre me cercou.
Azlynn não era quem dizia ser, Glenda nem sequer ligou para saber do meu irmão. E o Vanitas… bom, não poderia confiar nas suas falsas palavras.
A única solução era encontrar um exorcista ou alguém que pudesse expulsar aquele demônio. Eu tinha que falar com o sacerdote da Catedral. Ele poderia acreditar na minha história, afinal, não era o papel da igreja lutar contra seres das trevas?
Eu me levantei, a minha decisão já estava tomada e nada me faria desistir.

"Beanard…"

O quê?
Senti um calafrio assustador no corpo.
Era a voz de uma criança.
Olhei para os lados procurando quem estava me chamando.

VANITAS - Memento mori Onde histórias criam vida. Descubra agora