hehe, eu tô vivendo muitas aventuras ultimamente. sem tempo pra sonhar ou inventar, mas eu tô tentando.
•
O dia amanhace lento. E me pego pensando em problemas que não deveriam me preocupar tanto assim, por exemplo, minha integridade ideológica. O trabalho de massa, minha função favorita, consiste em traduzir as causas do partido da linguagem acadêmica para a linguagem comum e acessível, de forma que mais pessoas comuns se conscientizem sobre nossas idéias e ideologia. O público alvo maior são os trabalhadores, pessoas que vendem sua força de trabalho em troca de migalhas. É um trabalho que se assemelha ao de um joalheiro, ao que recebe uma jóia bruta e tem a missão de lapidá-la, de forma que não perca sua gema. Nós facilitamos o debate, sem perder de vista o cerne da coisa, sem distorcer.
Fora eu quem teve a brilhante idéia de promover uma excursão à Moscou com outros músicos filiados ao Partido Comunista da Áustria. Estava crendo que esse evento passaria despercebido pelo radar das autoridades fascistas russas. Apresentei a ideia para alguns camaradas, e eles a acharam genial. Nos apresentaríamos com Prokofiev e Shostakovich, e seria uma noite bonita de música e comunismo entre camaradas. Entrei em contato com alguns amigos na Rússia, principalmente jornalistas, que foram quem tornaram possível a excursão. Nos receberam no aeroporto, arranjaram a hospedagem e nos ofereceram suporte técnico. Era incrível ver a articulação dos atuais comunistas russos, de modo que a herança soviética não tinha sido de um todo perdida. Seriam três dias de apresentação. Planejamos tudo para ser dentro de um salão de festas discreto em um hotel barato à oeste de Moscou, lugar que nos foi arranjado pelo Sindicato dos Jornalistas.
Era uma tentativa arriscada, mas eu nunca tive medo, então não imaginei que meus camaradas fossem tê-lo. Mas tiveram. E tiveram tanto medo ao ponto de entrarem em estado de pânico quando fomos violentamente reprimidos, e veja, nem sequer foi pela polícia russa. Fomos expulsos pela máfia russa, o que era um pouco mais digno ao meu ver. Eles nos bateram, quebraram instrumentos e nos disseram para não nos apresentar no terceiro dia. Do contrário, estariamos desrespeitando uma ordem de Makarov.
Seja lá quem fosse esse qualquer, não tive medo algum, apenas um pouco de dor de dente e um hematoma terrível no lado esquerdo do rosto.
No terceiro dia, tudo o que restara do KPO na Rússia era eu própria e meu violino. Estava preparada e firme para me apresentar no terceiro dia para qualquer operário que viesse, para qualquer um que quisesse me ouvir tocar. E quando ninguém apareceu para tal, não me enfureci. Sabia que estava cercada de covardes por todos os lados. Apenas peguei meu violino e saí pelas ruas de Moscou, tocando para moradores de rua, para os passantes, para aqueles que precisavam de música numa noite fria. Quando retornei a Áustria, já estava expulsa do partido e banida de alguns outros grupos. Nenhum dos antigos amigos queria ser visto comigo, e fui acusada de pôr a vida de todos em risco. Isso são coisas que não pretendia contar à König, pelo menos não por agora. Ele ficaria preoucpado a toa e me tiraria a paz.
Contento-me em deixá-lo dormir sob meus lençóis. Tantas lembranças se afloram em minha memória, mas nenhuma como esta, porque quando nos deixamos ainda era impossível sonhar com a intimidade que uma casa vazia proporciona. Aos dezoito, eu não poderia simplesmente deixá-lo me deflorar na sala de estar. Hoje podemos fazer o que quisermos, da varanda à cozinha, somos dois velhos conhecidos descobrindo uma nova forma de convívio. E ele parece tão mais pesado agora, seu corpo inteiro afunda meu colchão e sua respiração é forte, combinando com a robustez de seu corpo macio, quente e acolhedor. O braço musculoso desleixado contendo minha cintura em seu abraço, o cochicho de seus suspiros rente ao pé do meu ouvido. Engalfinhada nele, eu planejo o restante do nosso dia antes que Rex acorde, tecendo então o mirabolante plano de levá-lo até a casa de seu pai.
König resistiria, mas eu saberia manejá-lo à minha vontade da maneira que sempre fiz. Era necessário. Os passarinhos cantam na rua e ali nós ficamos, cada um com seus segredos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
edelweiss | a könig storie.
Fiksi PenggemarKönig não podia escapar. O passado sulfúreo que emana dos muros e que flutua nas ruas de Viena o perseguiria para sempre. A luz amarela dos postes antigos que resplandecem nas calçadas molhadas, e evocavam a necessidade precípua que todo austríaco c...