um visconde enfeitiçado (II)

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A manhã começou bem agitada no último dia em Aubrey Hall. A maioria das pessoas preparava suas coisas para ir embora pela tarde, deixando tudo organizado para poderem, então, aproveitar os dia sem se preocupar com isso depois.
Com os Dragoner não foi diferente, Clarice e Lilyan que estavam no mesmo quarto despertaram quando o amanhecer chegava e iluminava as janelas. E arrumaram suas coisas bem a tempo de suas outras irmãs invadirem seu quarto. Sarah e Ginny entraram nos aposentos animadamente, sorrindo aos quatro ventos.

- Estão atrasadas para o desjejum - lembrou Ginny se sentando na cama arrumada de Clarice.

- Ginny Dragoner! Quantas vezes eu tenho que dizer que eu odeio que se sente ou se deite em minha cama arrumada? - esbravejou a irmã - eu acabei de arrumar, não estamos em casa, sai já daí!

A irmã pulou da cama e quando ia se sentar na cama de Lilyan ela balançou a cabeça negativamente com calma para a mais nova.

- Droga! - soltou e Lilyan arregalou os olhos

- Ginny! - brigou e a irmã fechou a boca rapidamente se dando conta do que disse.

- quem anda te ensinando essas coisas, criança? - perguntou Sarah, parada perto da porta.

- não sou mais criança - rebateu Ginny - posso debutar na próxima temporada.

- não sei que animação é essa para debutar - falou lilyan enquanto encarava as unhas e começava a andar para a porta - ah, se eu pudesse não debutar essa temporada, nem em nenhuma.

Sarah deu uma risadinha e assentiu, quando Clarice ia abrir a boca lilyan saiu pela porta e as meninas a seguiram para o desjejum.

Lilyan se sentou a mesa perto da família para o café e os Bridgerton se juntaram a eles. Benedict pegou um lugar ao seu lado, a esquerda, e Eloise a sua direita.

- Bom dia, Lady Dragoner - comprimentou Benedict, cortês

- Bom dia, senhor Bridgerton- desejou ela, se servindo de bolo.

~

N

a maior parte das vezes, na maior parte dos dias. Anthony sempre teve certeza de que um dia ele teria que casar. Talvez porque sua mãe o lembrasse disso todos os dias desde sua existência... desde que seu pai infelizmente, se foi. Talvez porque mesmo com algum dia livre em sua agenda, ao final dele, sempre acabava trancado no escritório, na casa Bridgerton, no número cinco, trabalhando, porque ele era o responsável pela família, por todo aquele peso nos ombros, e devia sempre se lembrar de que um dia teria de finalmente cumprir todos os seus papéis de uma vez, todos eles a risca.

Casar-se.
Não ficar na vida de libertino para todo sempre, conseguir herdeiros. Mas nunca, amar. Por que tão apressado agora para que isso finalmente acontecesse quando passou parte da sua vida inteira se lembrando, mas não dando tão importante atenção, mesmo sabendo que deveria?
Porque ele achava que não poderia jamais ser melhor que o pai, jamais passar da idade que ele passou, sendo um homem tão forte e mesmo assim ter morrido como morreu. Jamais conseguiria amar alguém como ele amará sua mãe infinitamente, todos os dias, lhe demonstrando. E foi assim que partiu, colhendo uma flor no jardim, para sua querida esposa, para demonstrar mais uma vez o quanto a amava.
Sentir na veia que ele não merecia uma mulher que o amasse, que fizesse de tudo por ele, que vivesse, acima de tudo, por ele. Acreditar não merecer, não conseguir retribuir, não conseguir querer, gostar, desejar.

E foi quando tudo isso se tornou uma missão, um compromisso, se tornou um dever a ser cumprido. Um legado que deveria ser deixado porque era assim que funcionava, era assim que tinha de ser. Não porque queria, porque precisava, porque sim.

Não soube como, mas saiu de transe e acompanhou quando uma silhueta de cabelos ruivos levantou da mesa de café, agradeceu e saiu pelos corredores grandes de Aubrey Hall...
Ah, Aubrey Hall, seu lar de infância. Onde guardará as mais lindas e sinceras lembranças de sua infância, adolescência e parte da juventude. Mas também, cravada em cada parede lapidada, os gritos, os corações partidos, os pulmões sem ar e ardência nos olhos. Tudo de uma vez. Sendo por anos, uma sensação que Anthony não aguentava sentir. E talvez ainda não aguentasse completamente.

Ele se impulsionou, mesmo sabendo que Clarice ao seu lado tinha lhe dito alguma coisa, apenas acenou com a cabeça, depositou o guardanapo sobre a mesa e saiu,  seguindo o lado oposto por onde Lilyan havia saído minutos atrás. Mas por coincidência, a encontrando exatamente onde queria ir.
Ele parou, respirou, a olhou e se aproximou de vagar, dando atenção ao quadro que ela olhava tão atentamente.

— É seu pai? - perguntou, mesmo sem desviar a atenção. Anthony se perguntou como ela sabia que era ele, ou não sabia? -

— sim. - respondeu Anthony, baixo, voltando a atenção para ela

— parece especialmente com você - sussurrou, com um suspiro, melancólico e se virou pra ele - o que o encomoda, lorde Bridgerton?

— perdão? - perguntou, confuso.

— percebo o quão distante o senhor está, quieto, perdido - explicou, olhando pra ele, com aqueles olhos atentos.

Os pares de olhos mais atentos que Anthony já viu em toda sua existência, insistentes, amados, cravados nele. Sempre parecia ler sua alma.

— Receio não saber do que a senhorita está falando - murmurou, sentindo se apertar - estou bem, não tenha dúvidas.

Ela parou, torceu os lábios fracamente, suspirou e então ele pensou nunca ter visto a voz dela tão doce.

— se você olhar para o horizonte, haverá uma casa sobre a colina. Guiando como um farol, é um lugar onde você estará seguro para sentir a nossa graça, a graça deles... - murmurou, baixo, penetrante - e se você perdeu seu caminho, vou deixar a luz acesa. Eu sei que você está perdido e fora de si, mas muitos precisam que você seja... forte. Esconder-se da verdade não fará você se sentir bem, eu sinto sua dor. Se você não sentir a graça dele, então perdeu seu caminho. Permita-se sentir, Anthony, permita que doa, que te tome por inteiro e que quebre cada parte do seu ser. Só assim, você verá isso com outros olhos. Só assim vai deixar isso pra trás, ressignificar, viver.

Ele não soube o que sentir, não soube o que dizer. Estava perdido, quebrado.

— Eu vou deixar a luz acesa.

Ela sorriu, leve, de lado. Colocou a mão em seu ombro e depois se afastou. Anthony olhou pra ela, nunca sentiu tanto a presença de seu pai. Nunca... quis tanto alguém.

Culpa do amor - Anthony Bridgerton - 1° Livro  Onde histórias criam vida. Descubra agora