01: O mistério

322 47 372
                                    

    O único som que predominava no quarto agora era o das gotas de chuva se chocando em minha janela se misturando com os soluços que saiam de minha garganta.

   Em minhas mãos eu segurava uma foto pequena onde na imagem se podia ver um homem com seus vinte e poucos anos segurando nos ombros uma bebezinha que ria mostrando os poucos dentes que já tinha na boca.

   As pessoas citadas na foto eram eu e meu pai quando eu tinha menos de dois anos de vida. Essa com certeza é minha foto favorita, os cantos um pouco amassados provam que a carrego comigo para todos os lugares possíveis dentro de minha mochila já que através disso eu consigo sentir ao menos um pouco que meu pai ainda está comigo.

   Hoje completa quarenta e sete dias de sua morte, um mês e meio que todo o brilho da minha vida foi tirado da forma mais horrenda de mim, a sensação de estar quebrada nunca mais se deixou de fazer presente desde que eu vi seu corpo ser enterrado, eu perdi minhas forças naquele dia, perdi minhas esperanças e perdi também a vontade de continuar lutando.

   Meu pai era a única pessoa que eu tinha de bom na vida depois que minha mãe morreu de uma doença no sangue quando eu tinha treze anos, ele tendo que cuidar de mim sozinho assumiu também o papel de mãe e por mais atrapalhado e perdido que ele estivesse, ele sempre se saia maravilhosamente bem.

   A fase de luto pela perda da mulher que tanto amávamos nos aproximou ainda mais, nos tornamos inseparáveis e ouso dizer que melhores amigos, não havia nada ao qual eu não contasse pra ele e esperasse sua ajuda, papai foi meu refúgio em dias tristes e me deu forças para aguentar cada sentimento de saudades que existia em meu coração.

   Em um dia quando eu já tinha por volta de dezesseis anos ele me apresentou uma moça, Madeline era dois anos mais velha que ele e sua atual namorada, por não possuir filhos nessa certa idade e também para agradar seu companheiro, Madeline me tratava como se eu fosse biologicamente dela, pelo menos no início.

   Mas desde que eu a conheci me senti insegura, como se tivesse a impressão que ela queria roubar verdadeiramente o lugar que um dia minha mãe ocupou em nossas vidas.

   Percebendo minha insegurança papai sentou e conversou comigo em uma noite, disse que estava feliz em sua nova união e me assegurou que em seu coração um espaço especial sempre estaria guardado para a mulher que me deu a vida. Percebendo que ele precisava de minha aceitação para seguir feliz eu os apoiei.

   Com pouco tempo em que eles ainda estavam se conhecendo Madeline se mudou para nossa casa, e foi aí que a máscara de madrasta amorosa e carinhosa finalmente começou a cair.

   Tentei contar a meu pai as incontáveis vezes que Madeline me fazia de sua escrava particular e me humilhava enquanto estávamos sozinhas, mas de todas as minhas argumentações, nenhuma foi levada a sério.

   Meu coração e meu instinto nunca deixaram de me avisar que essa mulher não era digna de confiança. Mas enquanto eu não pude provar isso tive que aguentar em segredo tudo o que ela fazia contra mim.

   Depois de três anos que eles estavam juntos meu pai foi assassinado.

   Só em lembrar da cena do corpo sem vida jogado no chão coberto por sangue eu já sinto um calafrio percorrer em minha espinha e todo o meu corpo se arrepiar, dor, escuridão, é tudo o que associo aquele momento.

   Eu estava por perto na hora que um homem desconhecido saiu de um beco escuro e golpeou a nuca de meu pai com um tijolo diversas vezes, eu não presenciei a cena porque precisei usar rapidamente o banheiro da padaria ao lado, mas lembro de quando sai do pequeno espaço fechando a porta atrás de mim com uma pequena placa com o desenho de uma bonequinha de vestido, indicando ser o banheiro feminino, estranhei quando vi a padaria vazia diferente de quando eu havia entrado, ao olhar para a janela de vidro vi um amontoado de pessoas com expressões assustadas olhando para algo no chão.

Em Meio Ao MistérioOnde histórias criam vida. Descubra agora