46: Em meio a floresta

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    Meus pés protegidos do frio congelante por um par de coturnos escuros eram engolidos a cada passo pela grossa camada branca de neve que cobria todo o chão a minha frente, meus olhos atentos consumidos pela ansiedade observavam cada mínimo cantinho entre os altos e largos troncos de arvores. A cada passo continuo meu corpo se adentrava ainda mais no centro da densa floresta, cometendo talvez a maior loucura da minha vida.

   Apenas uma mochila cheia com roupas e o básico de produtos de higiene vinha pendurada em minhas costas, as chaves que eu havia pego em minha casa estavam em minha mão onde meus dedos se pressionavam na parte pontuda da chave maior fazendo a leve dor me manter na realidade e longe de cair em um mar de ansiedade e pensamentos ruins. 

   A alguns metros a frente estava a pequena cabana de campo, rodeada de arvores em um centro aberto que no verão se tornava o lugar ideal para um acampamento. Agora o branco do inverno trazia uma imagem triste para o lugar que em minha lembrança possuia a grama mais verde e as flores mais coloridas da floresta. 

   Esse lugar foi construído por meu pai como um lugar disponível para se passar o tempo livre, na temporada para caça de animais ele e alguns amigos vinham para esse lugar, passavam três dias e praticavam com suas espingardas antes de retornarem para suas vidas tradicionais na pequena cidade. Já nas férias de verão papai trazia a mim e Bryan para acamparmos por um fim de semana, nós acendíamos uma fogueira em frente a cabana e nos enfiávamos em sacos de dormir enquanto observavamos com uma vista privilegiada todo o céu com estrelas brilhantes antes de pegarmos no sono.

   O lugar era pequeno mas com cômodos bem divididos para aconchegar quem estivesse ali. Na entrada uma pequena sala possuía uma lareira suficiente para esquentar todo o lugar quando acesa, em seguida um pequeno corredor ficava entre um quarto no lado esquerdo e no direito um pequeno banheiro, após eles estava a cozinha.

   Lembro de alguns moveis que já ficavam organizados para receber quem viesse para cá, mas se levarmos em consideração que já tem aproximadamente uns três ou quatro meses que ninguém aparece, tenho certeza que tudo deve estar empoeirado. 

   Quando entrei no lugar tive total certeza de que essa era a coisa mais insana que eu estava fazendo, literalmente, me entregando em uma bandeja para o assassino que tanto vem me perseguindo. Já estava cansada de lutar e principalmente de ver pessoas inocentes perdendo a vida por minha culpa. 

   Quando Spencer foi encontrada perto da casa de Bryan o aviso marcado em vermelho na parede dizia "Você é a próxima minha querida ratinha" e lembrando bem desde o inicio em seus bilhetes assustadores eu era a própria "ratinha" a qual ele se referia. Acredito também que a morte de Karter não foi apenas de forma aleatória, já que ele havia sido assassinado da mesma forma que meu pai.

   Tudo estava ligado e tudo se rodeava a mim. 

   Minha casa revirada, minha madrasta desaparecida, o rato morto que recebi assim que cheguei na pousada, o aviso encontrado no espelho de meu quarto, a volta do assassino no dia em que eu e Cristopher estávamos em minha casa. Posso estar errada, mas tudo tem girado em torno de mim.

   Não tinha certeza de como ou porque ainda estava viva, mas sabia que não tinha haver com dinheiro, esse perseguidor foi capaz de revirar minha casa e mesmo assim todas as coisas valiosas ainda permaneciam lá. Talvez vingança por algo feito por meu pai ou até mesmo quem sabe, Madeline. Talvez fosse apenas um psicopata que escolheu atormentar minha família e agora tem feito isso comigo para me ver beirar a loucura. 

   Assim como desde o inicio, eu não sabia, não fazia ideia e provavelmente não tinha nada que se aproximasse de respostas certas e explicações que fizessem sentido. 

   Mas agora eu já estava exausta e não tinha mais o que perder, meu plano suicida era de ficar aqui, no meio da floresta deserta esperando que de uma vez por todas o assassino batesse em minha porta em uma manhã e que finalmente isso acabasse. 

   Sei que Bryan sentiria minha falta e talvez me odiasse por nunca mais voltar para ele, mas eu me sentiria melhor acreditando que não havia mais razões para que alguém fosse ferido para me atingir de alguma forma. 

   Agora só me restava esperar. 

   Tirando algumas teias de aranha de cima do interruptor, acendi a lâmpada da sala tendo a visão do pequeno espaço com apenas um sofá, uma mesa de centro de madeira e uma cadeira de balanço sob um tapete vermelho escuro em frente a lareira de tijolos. Joguei minha mochila sobre o sofá vendo uma leve fumaça de poeira sobrevoar no ar quando o peso atingiu o estofado. Soltei uma leve risada imaginando que pelo menos teria a limpeza para ocupar minha mente por enquanto.

   Entrei pelo corredor priorizando o quarto para ser olhado primeiro, a porta de madeira rangeu um pouco quando foi aberta antes de me revelar uma cama de solteiro, uma cômoda de quatro gavetas com um abajur e um espelho na vertical preso a parede, acima da cômoda estava a janela escondida por uma cortina de tecido cinza. 

   O banheiro possuía apenas um pequeno espaço para o box, o sanitário e um armário acoplado abaixo da pia de porcelana com um espelho manchado com camadas de poeira. 

   A cozinha tinha apenas um fogão e uma geladeira simples, uma mesa de madeira com quatro lugares no centro e um armário de duas portas que provavelmente guardava panelas e outros utensílios. 

   No canto da cozinha tinha uma pequena porta que dava para uma improvisada dispensa que agora só continha uma boa quantidade de madeira disponível para a lareira, agradeci mentalmente por ver que tinha o suficiente para passar um bom tempo.

   Sem demoras, acendi com um pouco de dificuldade a lareira que não demorou cinco minutos para esquentar toda a pequena cabana. Apreciando o calor confortável me sentei no sofá, puxei um pequeno pedaço da cortina e deixei minha atenção presa entre as arvores da floresta que me cercavam.

   Espero que meus pais possam me perdoar por desistir dessa forma, torço para que consiga encontra-los onde quer que eles estejam, anseio a cada segundo para sentir os abraços protetores me envolverem, me reunir com minha família, me sentir em paz, principalmente sem ter medo da minha própria sombra. 

   Não desejo essa tortura psicológica nem mesmo para o meu pior inimigo. 

   Cada vez que eu me via no reflexo de um espelho a minha pele estava mais pálida, minhas olheiras mais escuras e profundas, meu cabelo com mais friz pela falta de atenção e meus lábios mais ressecados. Cada vez em que eu saia do banho minhas roupas pareciam mais folgadas, os ossos da minha clavícula mais visíveis na pele e o frio era capaz de me atingir mais ainda pela perca de peso constante. 

   Eu parecia um zumbi, me deteriorando cada vez mais, afundando em uma definitiva depressão traumática que me tirava a vontade de tudo, me arrancava a felicidade e o animo, a fome, o sono e a vontade de sobreviver. 

   Porque eu deveria continuar insistindo em um labirinto sem saída? As portas para fugir não existiam mais e agora só me restava ficar nesse sofá, olhando pela janela e esperando que o psicopata assassino aparecesse entre as arvores. 

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É oficial migos e migas, entramos na reta final da obraaa. 🫠

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