O início do "senado por elas"

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Era terça-feira, Soraya se arrumava para voltar ao senado depois do ocorrido. Sua assessora já lhe ligara para avisar que tinha muito trabalho naquele dia e a agenda estava cheia. Ajeitou o cabelo em frente ao espelho da sala, pegou sua bolsa e suas chaves penduradas e saiu de seu apartamento indo para o carro. Vestia uma calça social preta, blusa branca com decote em V, um blazer branco e um salto baixo branco. Para complementar o look até o carro, um óculos de sol bem escuro. Cumprimentou o porteiro de seu prédio como sempre fazia, entrou no carro, ligou uma música para animar aquele dia: escolheu I wanna dance somebody - Whitney Houston. Começou a cantar enquanto dirigia para o trabalho.

Já no senado, antes da sessão começar, Simone conversava com Eliziane, Leila Katia e Isabella, colegas senadoras.
—Então fica combinado assim, assim que acabar a sessão todo mundo no refeitório. Eli você vai ajeitando as coisas que já deixei separado lá na cozinha por favor? —Simone pergunta a amiga que confirma. —Ok, obrigada. Eu vou dar um jeito de levar até o refeitório.
O grupo de mulheres se dissipa com a chegada de Soraya e o início da sessão plenária.
—Oie —Simone diz baixo quando Soraya passa ao lado dela.
—Oi —Soraya responde
—Como você está? —Simone pergunta a percebendo abatida
—Estou bem. —Soraya responde com um sorriso não muito convincente e em seguida se dirige à frente do salão quando o presidente chama seu nome para falar na tribuna.
—Quero dar a palavra agora à nossa querida colega Senadora Soraya Thronicke, que junto a mais 3 colegas senadores aqui presentes foram vítimas de um atentado ontem. Quero deixar meus cumprimentos desde já para vocês nessa difícil situação.
—Bom dia Sr.presidente, em seu nome cumprimento todos os presentes e as pessoas que nos assistem. Hoje eu quero falar em comemoração e homenagem à síndrome de down, aos avanços que estamos tendo, aos esforços. Mas antes disso, eu gostar e ia só de destacar a sensação que eu senti e sinto aqui por alguns assuntos: primeiramente sobre a desconfiança que o povo brasileiro tem para com os políticos e crença de que nenhum político presta, Depois não estou aqui para julgar, nem para emitir nenhum juízo de valor, principalmente porque eu não tenho nenhum conhecimento dos fundamentos da prisão do ex presidente e os demais, com certeza deve ser uma prisão temporária ou preventiva, e até que seja julgado todo mundo é considerado inocente. E por último a sensação que nós temos um fato/notícia, e eu dei a notícia sobre isso agora numa comissão, e tenho a sensação, que acho que é de poucos aqui, sobre o como somos hostilizados por estarmos torcendo para que a operação lava jato dê certo, para que tudo corra bem, é interessante essa sensação de que dentro de uma casa de leis nós somos minoria, infelizmente. E é importante lembrar sobre a renovação que vai ser cobrada la na frente, e reforço que tem muitos políticos bons aqui dentro, que admiro, sigo e acompanho. Mas quando se fala em renovação, quando não damos a resposta que o povo quer, é bom que se esclareça que não tem uma renovação autêntica, muitos foram reeleitos, e "novatos" mesmo só temos 9 na casa. Então, se vieram pessoas viciadas ou não, é bom que o povo saiba que se não dermos uma resposta em pouco tempo, vão falar que não houve renovação e nós jogar na vala comum. É porque não houve essa renovação que o povo pensa. Só isso Sr. Presidente.
—Senadora Soraya, quando vossa excelência puder me conceder uma fala... —Eliziane a interrompe
—Sim, claro. —Soraya confirma com a cabeça.
—Senadora, eu queria lhe cumprimentar, e aproveitar a oportunidade de fazer isso aqui no plenário, pois ontem acabei não tendo como fazer isso, mas queria lhe cumprimentar pela forma como vossa excelência está conduzindo a comissão: tem garantido o contraditório, as prerrogativas dos senadores dessa casa, e tem feito uma excelente condução na comissão, falo com experiência nos momentos em que eu já participei da comissão. Vossa excelência sempre nos assegurou com muita dignidade, firmeza, seriedade, coerência e serenidade, o que é muito peculiar de nós mulheres às nossas prerrogativas, na condução, nas intervenções e nas nossas falas. É muito difícil nós mulheres chegarmos ao espaço de poder e comandar comissões. Temos nessa casa sua presença conduzindo comissão, temos nossa querida Simone que está com muita maestria conduzindo a principal comissão dessa casa CCJ. E para nós chegarmos e ocuparmos essas posições de poder não é uma tarefa simples. Então meus cumprimentos e muito sucesso em sua presença e atuação aqui nessa casa.
—Muito obrigada senadora, e vou dizer que MS se orgulha de ter duas mulheres, tanto que somos a maior bancada feminina dentro do senado, acho que nunca houve isso antes. E é muito orgulho ter a Simone Tebet na presidência da CCJ. E para dizer também que as diferenças ideológicas, eu acredito que estamos entrando em um novo capítulo, e isso eu tenho que dar não a palmatória. Ontem em um jantar no quartel com o ministro da defesa, o senador Randolph disse do apreço que tem pelos militares, todo mundo levando conjuntamente, pensando no Brasil acima de tudo e sem viés ideológico. E eu fico muito contente porque tudo que for para o bem do Brasil e do brasileiro, nós não podemos olhar sigla na testa de nenhum parlamentar.
—Senadora Soraya, gostaria de primeiro agradecer aos elogios e reconhecimento ao meu mandato. Tenho certeza que vossa excelência vai honrar a população do MS aqui nessa casa, vai dignificar os votos e a confiança que recebeu, e dizer que com relação à essas prisões na manhã de hoje, acho que a lei vale para todos, independente de quem seja ou do partido que pertença, respeitado o rito legal, assegurado de defesa a todos, porque não tem nada pior que uma injustiça. Não se deve linchar ou bater em ninguém, as vezes na ansiedade, as pessoas querem caminhar para uma justiça com as próprias mãos, isso não é correto. –diz um colega senador
—Pela ordem senadora Soraya. —Simone pede a fala
—Pode falar senadora Simone. —Soraya aceita dando uma piscadinha disfarçadamente para ela, que percebe e olha para baixo para disfarçar o sorriso involuntário que sairá em seu rosto.
—Primeiramente quero agradecer ao elogio que me fez senadora Soraya, e dizer que como a senadora Eliziane falou, você é uma parlamentar importantíssima aqui dentro, mal começou seu mandato e já fez muita coisa, enviou recursos ao MS, comanda a CRA, autora de alguns projetos. E eu como sul-mato-grossense digo que você fez e faz por merecer por todos os votos que recebeu e honra nosso estado MS aqui. —Simone diz e vê um sorriso surgir no rosto de Soraya que estava com um semblante triste antes.
Soraya agradeceu a todo apoio que recebeu dos colegas senadores e foi se sentar. A sessão continuou, e Simone foi para a frente representar a bancada feminina de qual é presidente.
—Obrigada presidente pela palavra, quero parabenizar a capitã do nosso time que é a senadora Rose, ela fala por todas nós senadoras, ou pela grande maioria das parlamentares do congresso nacional. Quero deixar muito claro aqui que ninguém está aqui atrás de privilégios, aliás a mulher nunca teve privilégios no Brasil, nem antes e nem depois da nossa constituição cidadã. O que nos queremos e exigimos é que nossos direitos sejam atendidos, e não vamos admitir retrocesso no Brasil! Foi se o tempo em que a filha precisava da autorização do pai para casar, que a mulher precisava da autorização do marido para trabalhar, e o tempo que só o homem branco tinha direito ao voto. Hoje a realidade é outra, nossa constituição garante a todos, homens e mulheres, igualdade de direitos e deveres. Nós não fugimos de nossas responsabilidades ou deveres, é por isso que nós mulheres, que somos poucas no congresso nacional estamos aqui. No dever que temos de trabalhar por um país, não só pelas mulheres e família brasileira, mas todo o povo. Nós tivemos grande avanço na legislatura passada, e com a ajuda dos homens do congresso, nós garantimos que a cota destinada ao preenchimento das vagas de 30% das mulheres nos partidos e coligações, fosse assegurado também 30% do tempo de televisão e do recurso necessário. Graças a isso num sistema proporcional, a câmara dos deputados pela primeira vez na história do Brasil passou de 53 mulheres para 77. São 25 pontos percentuais. E no senado, tivemos um retrocesso: de 13 para 12. Justamente porque no sistema majoritário não cabe falar de cota, consequentemente esse é um exemplo claro de que as cotas funcionam no Brasil. E os casos excepcionais de laranjas, que devem ser punidos no rigor da lei, e não servem de desculpas para retrocesso e para um congresso nacional formado em sua maioria por homens! Nós estamos na ordem da análise mundial num dos últimos países com representatividade de mulheres no congresso, somos os últimos da América e um dos últimos do mundo. Então eu repito: nós da bancada feminina, e tenho certeza que com a ajuda da maioria dos senadores dessa casa não vamos aceitar, enquanto estivermos aqui. Muito obrigada Sr.presidente. —Simone discursa
—Sr. Presidente, eu solicito que sejam lidos e colocados para votação os seguintes requerimentos de sessão especial de minha autoria. —Soraya em seu direito de fala começa a ler a lista que tinha em sua mão.
A sessão já estava no final e Eliziane faz sina para Simone de que estava indo ao refeitório preparar as coisas. As outras mulheres já tinham ido. Simone fez sinal de jóia para Eliziane confirmando e ficou esperando Soraya, que assim que terminou foi se sentar em seu lugar.
—Tá ocupada agora Yaya? —Simone pergunta vendo ela guardar os papéis de sua mesa em uma pasta.
—Por agora não, só a tarde. Por que?
–Preciso que me acompanhe até o refeitório. —Simone pede
—Para almoçarmos? Tudo bem.
—Não necessariamente um almoço... —Simone diz e Soraya a olha estranhando. —Só vamos comigo, Ok?
—Tudo bem. —Soraya confirma e as duas saem juntas conversando até o refeitório. Chegando lá Simone abre a porta para Soraya entrar e as duas se sentam em uma mesa encostada na parede.
—Vamos pegar o self service? —Soraya pergunta
—Espera um minuto. —Simone responde segurando a mão dela para ela não levantar.
Soraya olha para a mão de Simone barrando seu braço e quando ergue a cabeça de novo vê Eliziane se aproximando atrás de Simone e se senta junto a elas. Depois chega Leila, Katia, Rose e Isabella, e se sentam também.
—Hoje é o almoço das mulheres! —Eliziane diz
—Temos que nos unir aqui dentro. —Leila complementa.
—Sei que deve ter sido bem difícil passar pelo que passou ontem, só nós sabemos que essa vida política não é fácil. Mas se nos unirmos, formarmos uma força feminina entre a gente pode facilitar um pouco, tanto lá dentro do senado também porque somos a minoria...Enfim, eu e as meninas compramos um presentinho para você. —Eliziane volta a falar e coloca uma caixinha em cima da mesa.
—Um presente para mim? De todas vocês? Obrigada, não precisava gente... —Soraya diz pegando a caixinha e abrindo. Desamarra o laço vermelho e tira a tampa da caixa: pega uma caneca com os dizeres "força feminina no senado." e uma peça no formato de flor de rosa de cristal que funciona como luminária.
—Uau, muito obrigada meninas, eu amei. —Soraya agradece. —Porque estão me presenteando?
—Para firmar nossa amizade... Na verdade, para firmar o grupo de nós mulheres. Mas para dizer que você pode contar com todas nós para o que precisar. Estaremos aqui e iremos nos apoiar sempre, não importa o que aconteça. —Eli responde
—E não vamos deixar aquele bando de homem mal educado nos controlar aqui dentro. Vamos reagir.—Leila diz e as outras concordam
—Nós somos amigas da Simone desde que entramos todas juntas em 2015, e você é amiga da Simone, então é nossa amiga também. —Rose diz
—Tá, agora vamos comer que eu tô morrendo de fome. —Simone diz e as mulheres caem na risada
Leila pega os lanches que tinha reservado com Simone e coloca em cima da mesa: bolo de milho, pão com patê, frutas picadas e suco natural.
Começaram a comer enquanto conversavam.
—Vamos fazer um brinde ao nosso mais recente grupo das mulheres do senado. —Katia diz erguendo o copo e elas brindam juntas.
Soraya olha para Simone como quem sabia que aquele encontro era ideia dela e Simone pareceu entender o olhar de Soraya e piscou para ela com um sorrisinho suave que foi retribuído.

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