Parte III

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- Há um ser histérico no meu escritório -  Hongjoong diz, após refazer doze passos até a bancada de trabalho de Yeosang no final do corredor - Na minha cadeira. Com os pés na minha mesa.

Yeosang sequer se incomoda em desviar o olhar de seu telefone e encarar Hongjoong, acenando com uma caixa de algum suco verde alarmante em sua direção.

- Ah, deve ser Choi San, senhor. Ele está esperando por você aqui desde, uh, três da manhã? Pelo que ele alegou.

Hongjoong fechou os olhos com força e os abriu novamente, respirando longa e profundamente.

- Poderia ter pedido ao segurança que reboque o carro dele.

- Aí ele ficaria preso aqui para sempre - diz com desdém - A menos que tenhamos uma ordem de restrição, o que francamente não temos, é ilegal—

- Está demitido, Yeosang - Hongjoong diz - Arrume suas coisas.

Yeosang finalmente deixa de mexer em seu telefone e dá a Hongjoong aquele olhar inexpressivo que quase o faz acreditar ter feito algo indescritivelmente irracional.

- Não deveria pelo menos me pedir para encontrar um substituto, senhor?

- Hongjoong! - aparece o homem escandaloso que Hongjoong passou a vida inteira evitando - Vamos almoçar! - gritou ainda mais alto.

Hongjoong se vira para Yeosang uma última vez.

- Espero que já não esteja aqui quando eu sair.

No meio da tarde, estão sentados no fundo de uma churrascaria. San tagarela constantemente, enquanto Hongjoong paira entre ignorar como o resto do restaurante olha em suas direções ou pedir a San que abaixe o tom voz pela enésima vez.

- Não é lindo? - diz, lhe mostrando uma fotografia de sua mais nova compra através de seu iPad, quase derrubando o garfo da mesa. Está pendurado na parede de seu apartamento em Tóquio, potencialmente. Ou Manchester.  Hongjoong parou de acompanhar as aventuras imobiliárias de San anos atrás.

- Sim, é lindo. - responde correndo os olhos ao longo do quadro. Uma única gravura gravada de uma ponta a outra em 16x31. Dois metros de tinta encáustica se transformam em marés, o peso dela como um pêndulo, puxando seus olhos de volta à origem.

É arte, sem dúvida, mas não arte útil. As cores são muito barulhentas, sufocantes sob sua própria presença, e a pincelada muito áspera. Hoje em dia as pessoas compram arte para impressionar, arte impossível de entender. Arte que com o tempo será esquecida juntando dinheiro e poeira, arte como a nova moeda da cultura.

Ali estava um grito que sob a água parada não ressoaria mais do que meras bolhas quebrando na superfície, pelo menos não enquanto o artista ainda estiver vivo. Uma tentativa ingênua, do tipo que Hongjoong mais se ressente.

- Comprei por cem mil! -  San exclama, orgulhoso.

Hongjoong lhe olha, fatiando seu filé mignon como se estivesse planejando juntá-lo novamente.

- San, sinceramente, você não simplesmente sai jogando esse tanto de dinheiro em um zé-ninguém-

- Com exceção desse, isso é um ótimo trabalho - San protesta, mastigando sua boca cheia de ervilhas com grande fervor. Ficou bom em se recuperar das objeções de Hongjoong ao longo dos anos, embora provavelmente essa seja a única coisa que o mais velho tenha a lhe oferecer, por obrigação a amizade.

- Não - diz - Isso é sua mente tentando te enganar para esconder o fato de tudo não passar de um forte desejo de chupar o pau de quem quer que você tenha comprado isso.

𝐀𝐁𝐘𝐒𝐒 | seongjoongOnde histórias criam vida. Descubra agora