Parte XII

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- Me diz uma fala brilhante sobre, uh, ângulos ou iluminação ou algo assim, aquela abobrinha francesa que você diz aos clientes - escuta ao atender um número desconhecido. - Preciso conquistar o Jongho.

- Yeosang, é você? - Hongjoong franze o cenho, olhando de volta para o celular por um segundo - Quer dar em cima do Jongho? O fotógrafo?

- Rápido Hongjoong, eu tenho talvez dois segundos antes de perder minha chance de transar - a voz de Yeosang ecoa entre o som estridente da música do clube que aparentemente está.

Olhando para a xícara de café na mesa, sua mente imagina o contorno da silhueta de Seonghwa no sofá, o rosto enterrado nos travesseiros e os membros jogados para todos os lados; ele vê sua sombra sobre o chão da cozinha, o vê entrando pela porta todas aquelas vezes nestes anos: um adolescente rebelde a princípio, e depois com rugas começando a espreitar no rosto: uma nova pessoa, mas tão profundamente apaixonado quanto quando começou. Aquele que passou a vida fugindo, não para longe, mas para continuar, não para apagar, mas para reacender.

Pensa vagamente sobre arte, passa pelas aulas teóricas e de história que teve, as falas praticadas que lançava aos compradores, os seminários, os coquetéis e os leilões, e não consegue.

- Eu não sei - diz.

- Jesus Cristo. De todas as pessoas no planeta não esperava isso de você - Yeosang murmura, desligando.

Hongjoong ri, guarda o celular no bolso, pega sua mochila e as chaves do carro novamente e sai de seu horário de trabalho muito cedo.

- Estou saindo - Hongjoong anuncia, jogando as chaves do prédio na mesa de Yunho.

- Quando vai voltar? - pergunta, com os olhos arregalados. - Christie vai ligar mais tarde para falar sobre aquele Edward Munch...

- Volto já. - é tudo que diz antes de se ver do lado de fora, ao ar livre. Ele dispara pela via expressa, sai do carro ainda com seu terno Sinclair, camisa desabotoada, mangas arregaçadas até os cotovelos e começa a pintar um vagão de trem. Assim como da primeira vez, segura o bico muito perto da superfície, fazendo as cores não serem tão anunciadas e as linhas opacas e suaves. Mas é bom o suficiente.

À medida que o sol se põe, grafiteiros passam e começam a se juntar a ele.  Alguns deles são jovens, ainda em seus uniformes do colégio, alguns mais velhos, meio barbeados, em jeans e regata. Eles não falam, não se importam com quem você é, de onde você vem, o que você traz. Há apenas o cheiro de tinta e o calor corporal fervente da criação. E ali em meio ao frenesi, ao barulho brilhante, com mil memórias e emoções e vontades explodindo de uma só vez, Hongjoong estende a mão e toca a tinta molhada no ferro enferrujado, quieto e ofegante. 

Colocou o polegar na pele sob a borda ondulada da tinta velha, uma faísca se transformando em um incêndio. Ele fecha os olhos e sente, sente aquele velho tamborilar de sangue sob seu dedo, chamando seu nome, puxando-o para mais perto, como aquela imagem do sol tecida na superfície do lago a uns 20 quilômetros acima de você.

Juntos, eles completam um trem inteiro antes que o patrulheiro apareça, e então vão embora tão rápido quanto se juntaram. Hongjoong deixa sua mochila para trás, deixa tudo para trás, menos o formigamento no peito e a tinta pegajosa na mão, sem ideia de qual caminho tomar, mas certo de onde está indo.

𝐀𝐁𝐘𝐒𝐒 | seongjoongOnde histórias criam vida. Descubra agora