Capítulo 14

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Gwyneth B.

Rocei meus dedos nos meus próprios lábios, depois contra o pescoço, a clavícula, todos os lugares onde Azriel havia me beijado naquela noite, algo que havia se tornado quase um ritual diário. Azriel não me visitou desde aquela noite em que partiu com uma expressão atordoada sem a mínima explicação, e como de costume, deixou para trás um rastro de confusão e dúvidas na minha cabeça. Eu o chamei de volta naquele dia, várias vezes, mas ele não veio, assim como não veio quando o chamei no dia seguinte, e no seguinte, e no seguinte... e única coisa que consegui pressupor era que havia algo de muito errado naquilo tudo, eu só não sabia o quê. E aparentemente Azriel não tinha o mínimo interesse em me explicar nada, e nem em me ver, já que não respondia mais aos meus chamados há dias.

Talvez ele tenha se arrependido de ter me beijado afinal, ou pior, ele pode ter finalmente se cansado de brincar de casinha com a humana e decidido ir embora de uma vez da minha vida. Algo em meu peito pareceu rachar ao pensar em tais hipóteses, engoli a seco o bolo de espinhos venenosos que se formou em minha garganta, e respirei fundo para não deixar uma lágrima fujona descer pelo meu rosto. Estava magoada, confusa, ansiosa e eu odiava isso. Eu não estava dormindo à noite por sentir a falta dele tão desesperadamente a ponto de achar que poderia falecer de abstinência, e o mais surpreendente era que eu sequer estava tentando me convencer do contrário, eu estava com saudades de Azriel e não sentia a necessidade de negar o fato.

Eu o queria comigo, me abraçando, confortando, e beijando outra vez, eu precisava daquilo, daqueles lábios nos meus assim como precisava de oxigênio, porque tudo mudou quando ele me beijou. Havia algo diferente, eu sentia em minhas veias, em meu peito, um calor físico todas as vezes em que pensava nele, a saudade descomunal, a urgência de minhas necessidades por ele não estavam mais dentro do normal. Tudo bem que meus sentimentos pelo Demônio das Sombras sempre tiveram uma natureza muito mais intensa do que qualquer outra coisa que já experienciei, mas isso... não, não era normal.

Me obriguei a levantar da cama para fazer algo para o café da manhã. Já era quase meio dia, mas eu não estava com a mínima vontade de comer comida de verdade, só queria me afundar num bolo de chocolate sem cobertura acompanhado de um belo café com leite.

Talvez eu precisasse de um pouco de ar puro ao invés de ficar em casa pensando em Azriel, o único problema era que eu não queria fazer nada que não fosse ficar em casa pensando em Azriel. Que droga.

*

Apertei o sobretudo bege contra o corpo para me manter seca enquanto fugia da chuva, meus cabelos amarrados em um rabo de cavalo ricocheteavam nas costas na medida em que eu acelerava meus passos até estar quase correndo em direção à biblioteca. Eu sabia que não conseguiria relaxar ficando em casa esperando pacientemente que meu belo Demônio de estimação aparecesse e me explicasse que merda estava acontecendo, então ele que se foda, eu encontraria a resposta sozinha.

Os degraus da escada antiga estavam escorregadios, então tomei cuidado ao subir em direção ao portão de madeira com vidros retangulares que permitiam espiar o interior do lugar. A porta rangeu quando a abri, e em seguida atingiu um pequeno sino acima do batente, avisando a quem estivesse lá dentro que o estabelecimento tinha um novo visitante. Esta biblioteca era enorme, a maior da cidade, realmente enorme, como um casarão ou um museu. A decoração colonial permanecia intacta, perfeitamente preservada ao longo dos anos em que o lugar esteve de pé. Incontáveis fileiras de estantes de madeira escura se estendiam pelos corredores sem fim, e pessoas comuns andavam silenciosamente por entre as prateleiras, alguns só de passagem, outros procurando por um livro em específico.

Passando entre as mesas cheias de pessoas silenciosas que devoravam os livros que tinham em mãos juntamente com seus cafés, me dirigi ao balcão onde estava uma senhora de óculos redondos e pele branca enrugada.

The Devil's Dagger • GWYNRIEL AUOnde histórias criam vida. Descubra agora