Capítulo 16

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Autora: Esse é curtinho, mas hoje mesmo tem outro, prometo <3



Gwyneth B.


Azriel obedeceu meu pedido, ele foi embora, mas antes disso arrancou e levou consigo um pedaço do meu coração. Não me orgulho do fato de ter chorado por horas a fio após a sua saída, me sentia uma idiota por ter sido rejeitada de forma tão passiva. Sim, ele estava me rejeitando, e ficou claro quando se esquivou da minha pergunta sobre o beijo, provavelmente porque, aos olhos dele, eu era tão coitada e fraca que ele julgou que suas palavras seriam cruéis demais para o meu pobre coraçãozinho humano aguentar.

O beijo que para mim significou tudo, aparentemente para ele não significou nada.

Eu chorei tanto antes de pegar no sono que meus olhos amanheceram mais inchados do que da vez em que tive uma reação alérgica a um rímel barato, e para o meu desgosto, eu não me sentia menos patética após dez horas ininterruptas de sono. Eu estava um caco, uma bagunça, não me reconheci quando vi aquela mulher no espelho do meu banheiro, os cabelos desalinhados, os olhos inchados, o semblante derrotado.

O que raios está acontecendo comigo? Eu não sou assim, nunca fui, a Gwyneth que eu conheço jamais se permitiria passar por isso, mas aqui estou eu, sofrendo como se estivesse de luto. E pior, de luto por um relacionamento que sequer existiu, para começo de conversa, já que ele mesmo fez questão de pontuar que o que tínhamos não passava de uma "amizade".

Humpf, amizade uma ova, seu idiota. Eu não me iludi sozinha, eu não sou maluca.

Ele podia negar o quanto quisesse, mas o que eu e ele tínhamos nunca foi somente amizade. Desde o início sempre houve uma tensão sexual mútua não proclamada entre nós, mesmo quando o que eu sentia por ele se resumia em apenas medo, ela estava lá. Nunca foi para ser uma apenas amizade, e ele tinha plena ciência disso quando me arrancou o fôlego com um beijo ardente demais para ser casual, aquela urgência só poderia vir de alguém que já não podia mais se segurar, e eu sabia disso porque eu também estava exatamente naquele lugar. Eu e ele estávamos na mesma página no dia do cinema, mas algo aconteceu, algo sério o bastante para fazê-lo mudar de ideia em relação a nós dois, eu só não sabia o quê.

Era feriado na cidade, o que significava que, felizmente, eu não teria que trabalhar, então resolvi aproveitar meu tempo livre com algo mais produtivo do que chorar em posição fetal. Finalmente faria a leitura do último capítulo do livro antes de entregá-lo à bibliotecária.

Coloquei de lado o suco de maçã de caixinha que eu estava tomando — que, diga-se de passagem, era a única coisa que eu colocava no estômago em quase vinte e quatro horas — para acomodar o livro entre minhas pernas.

"5. Equivalente Flamma:

A Chama Equivalente, também conhecida como "chama", é um fenômeno extra físico extremamente raro e de natureza romântica que ocorre entre dois seres demoníacos. Esta conexão entre almas é vista como uma ligação sagrada e poderosa, que une os seres de maneira inquebrável, e é caracterizada por um elo único e profundo entre os dois indivíduos que a compartilham, o que torna o vínculo quase impossível, e extremamente doloroso de ignorar, especialmente para o indivíduo do sexo masculino.

Cada Demônio possui sua própria chama interior desde o seu nascimento, é o que os mantém vivos, se a chama, por ventura, vier a se apagar, o Demônio que a possui morrerá de forma inevitável. O fogo, símbolo da chama, representa a fusão, a força vital que traz equilíbrio e completude. Compreende-se que o fenômeno da Chama Equivalente transcende os aspectos físicos, e ocorre quando dois indivíduos nascem com chamas interiores completamente idênticas, mas que, ao mesmo tempo, são complementares, em outras palavras, isso significa que o fogo que há em um, é o mesmo que arde dentro outro.

O vínculo da chama é marcado pela atração e conexão mútua, tanto física quanto emocional, entre os envolvidos, que se faz presente de forma instantânea e avassaladora, geralmente, sendo percebida primeiro pelo indivíduo de sexo masculino. A ligação é tão forte que, quando despertada, a torna quase impossível negá-la ou se afastar completamente de seu parceiro de chama. Mesmo que tentem, seus corpos e almas continuarão a se atrair e queimar um pelo outro. Juntos, os indivíduos se completam e se fortalecem mutuamente, e é somente na união que encontram plenitude e equilíbrio.

A partir do momento em que a união é selada, os dois tornam-se um só fogo, o que significa que estarão entrelaçados profundamente até o fim de suas vidas. Se um fogo se apaga, leva consigo o outro, o que significa que se um deles morrer, o outro também morre."

Eu não pisquei sequer uma vez durante o minuto que se seguiu após o término da leitura, porque de todas as coisas que imaginei que esse capítulo seria sobre, essa com certeza estava fora da lista de cogitações.

— Demônios têm... almas gêmeas — sussurrei atônita.

E então, tudo desabou em cima de mim como escombros de um arranha-céu recém-demolido. Se Demônios podem ter almas gêmeas, não havia sentido em se prender a relacionamentos amorosos com humanos, já que a minha espécie não tem nada que se pareça com isso, nada que se assemelhe à beleza e profundidade desta ligação e sentimento singulares.

Azriel havia me dito uma vez que nenhum ser era capaz de amar tanto quanto um Demônio, e eu acreditei nele, cobicei aquele sentimento, e prometi a mim mesma que se um dia ele amasse alguém, deveria ser eu, mas... agora parece tão injusto querer que ele fique comigo quando o que tenho a oferecer a ele é tão pouco comparado ao que ele pode ter com uma mulher de sua espécie.

Engoli o bolo de espinhos venenosos que se formou na minha garganta, eu jamais poderia dar isso a ele, esse tipo de amor, porque eu era humana, mesmo que eu esteja apaixonada por ele, meu amor ainda é humano, e sempre vai ser. Talvez seja por isso que ele esteja se afastando de mim, porque se deu conta disso, de que eu não valho a pena, de que o sentimento que eu tenho a lhe oferecer é minúsculo se comparado ao que ele pode ter com uma chama.

Se meu coração já estava em pedaços, me dar conta daquilo me quebrou em pedacinhos ainda menores. O que eu tinha a oferecê-lo, afinal? Ele estava certo em me rejeitar, porque não iria valer o tempo gasto.

Eu deveria desistir, não havia como competir com aquilo.

Mas por mais egoísta que fosse, uma parte de mim, maior do que eu queria admitir, se recusava a sequer cogitar a hipótese de deixá-lo ir. 

The Devil's Dagger • GWYNRIEL AUOnde histórias criam vida. Descubra agora