あなたが好き

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Eu queria fazer uma fic de época e resolvi que seria Monsam, mas para encaixar com o momento histórico direito eu tive que fazer elas serem japonesas. Não criem caso, em A Criada são coreanos que estão fazendo papel de japoneses e tá tudo bem. Pedem tanto fics baseadas no Brasil com cultura brasileira e eu trouxe um pouco dos imigrantes e de história do Brasil, Japão e Segunda Guerra pra quem quiser aprender um pouco. Boa leitura. 

    Estou deitada. A luz da janela torna meu quarto cheio de claridade. Sonhei com a mesma pessoa outra vez. Sonhei que beijava seus lábios delicados de lady. Sonhei que tocava a pele branca de sua mão com a ponta dos meus dedos com toda delicadeza em que eu poderia tocá-la. Ela sorria para mim. Era um sorriso lindo e perfeito e eu conseguia ver seus olhos se fecharem por puro prazer em me ter por perto. Eu sorria de volta, observando ela rindo de algo bobo que eu havia falado. Sentia aquele prazer de saber que ela se sentia feliz ao me ter ali.
    Mas eu deveria saber que sonhos são feitos para os sonhadores, pois a  luz do quarto iluminado demonstra que eu já deveria estar de pé. E eu deveria acordar para a realidade. Aqueles lábios não são meus. Pertencem ao filho do que seria um coronel de uma fazenda que fica na região da cidade de Jundiaí.
    Essa fazenda foi fundada pelo japonês que veio no primeiro navio que chegou ao Brasil trazendo japoneses, lá em mil novecentos e oito. Ele tinha um sonho de construir algo e trabalhou muito duro para isso. Além de ter trazido consigo do Japão, uma quantidade de dinheiro que poderia dar o pontapé para o que sonhava construir.
    Então, quando houve a quebra da bolsa de valores em mil novecentos e vinte e nove, que fez as grandes fazendas de café do Brasil serem divididas e vendidas para seus antigos colonos, ele conquistou sua amada pequena fazenda e passou a produzir leite e a vender gado para corte.
     Agora, ele é um homem bem de vida. Construiu algo grande nesses quatorze anos que se passaram. E eu sou uma das empregadas da fazenda. Eu devo limpar a casa em que ele e a família moram. Esse é o meu trabalho desde cedo. É a minha obrigação deixar aquela casa sempre limpa, conforme o que me mandam.
    Eu nasci aqui no Brasil. Meu pai é japonês e minha mãe italiana. Eles se conheceram numa fazenda de panha de café. Panharam tanto café juntos, até se beijaram escondidos no meio das moitas de café. Pelo menos, foi o que minha mãe contou quando eu perguntei.
    E foi assim que eu fui feita, vinda da junção do Japão com a Itália bem no interior do Brasil. Mas devo dizer que meu avô italiano ficou um pouco irritado com a situação e disse que, se meu pai não se casasse, perderia o órgão reprodutor masculino.
    É engraçado, sabe? Eu imagino meu avô xingando em italiano e fazendo a mãozinha típica italiana. Enquanto o meu pai, um japonês tão sério... Pense só em como deve ter sido.
    Mas pense nisso aqui, também. Meu pai foi colher o café e colheu outra coisa. Nem vou falar sobre minha mãe... Foi levar o almoço para meu avô e deu o almoço para o meu pai. E estou eu aqui, meio japonesa, meio italiana...
    Mas, de qualquer forma, o mundo está em guerra e eu fico pensando o que será de nós todos. Porque a verdade é que todos nós sabemos o que está acontecendo lá longe daqui. As notícias correm e voam... Até mesmo por aqui.
    O Japão está em guerra e nossos parentes morreram nessa guerra. A Itália também, e é a mesma coisa. E isso é tão triste. Até um ano atrás, a Itália e o Japão eram unidos, mas agora a Itália trocou de lado. Imagina só como estão as coisas no meu coração.
    Meu pai, que já odeia meu avô, não quer muito saber... Pensa que todos os italianos são traidores terríveis. Mas ele respeita minha mãe. Ela é a única da Itália que ele não vê assim.
    Eu não sei qual lado eu devo ficar. É tão difícil estar na minha posição. O brasileiro está ao lado dos Estados Unidos. Eu não sei quem eu devo apoiar, então fico na minha. Só observo as coisas acontecendo ao meu redor. Não tenho muito poder. E não posso fazer muito, também.
     O filho do patrão está no exército brasileiro e o pai dele está muito triste, pois Getúlio Vargas declarou guerra contra o Japão. A sorte disso, é que ele declarou isso já tem dois anos, mas ainda não entrou em guerra de verdade.
    Ele brigou com o filho para ele desertar do exército porque ele só entrou para o exército porque Getúlio se mostrava aberto ao nazismo, até entregando judeus como Olga Benário para a Alemanha. E a Alemanha é a aliada do Japão.
    Só que o problema é que a população brasileira está cada vez mais pedindo a guerra, de fato. E o senhor Kirk não aceita desertar e ser um covarde. Existe a honra de se estar defendendo o país. E ele é brasileiro, deve honrar seu país. O que vai fazer ele ter que lutar contra seus parentes.
    Senhor Kirk é um homem de fibra. Vai deixar a esposa que acabou de se casar e ir para a guerra em breve. Isso se nada mudar. Isso é algo muito louvável da parte dele. A honra é algo bonito, ao meu ver.
     Parte de mim, é egoísta e quer que ele vá e morra por lá. Assim, a senhora Samanun não vai estar casada e ele não vai mais poder tocar seu corpo todas as noites. Afinal, eu sinto raiva dele. O ciúme me corrói todos os dias ao imaginar os dois sozinhos.
    Sei que é egoísmo ou algo pior me sentir assim sobre o senhor Kirk. Eu sou apenas a empregada da fazenda e ela é casada. Nós nunca poderemos ter algo. Mas eu sinto isso. Não tem muito o que eu possa fazer. Meu coração não para de sentir isso, mesmo que eu lute contra por ser loucura e impossível, um pecado, algo sujo e nojento. No meu coração, não é.
    — Mon, está atrasada! — Jim grita da porta. — Ainda deitada? Yha vai te matar por chegar atrasada de novo! Eu já coloquei a mesa para os patrões no seu lugar e você precisa ir lá retirar. Corre!
    — Já estou indo... — Me levanto e coloco meu vestido simples de camponesa e corro até a casa dos patrões.
    Entro na cozinha o mais rápido que posso e vou direto até a mesa da sala de jantar. Vejo os móveis tão bonitos feitos de madeira cara. Aquela madeira de cor tão viva e com cheiro forte. Você sabe que isso é matéria-prima vinda dos antigos. Algo que eu nunca teria oportunidade de tocar além de ser para limpar a superfície e deixar limpo para que se use.
     Chegando na porta, eu vejo a lady Sam sentada comendo pão com manteiga sozinha na mesa. Ela está olhando para baixo lendo um livro escrito em japonês. Sei que é japonês por causa dos símbolos. Só que não sei ler. Meu pai nunca me ensinou.
    Ela é tão linda que parece aquelas gueixas que meu pai conta nas histórias do Japão. Tão preciosa e linda. Meu pai diz que elas são treinadas para serem artistas. E eu a vejo como uma artista linda que canta músicas bonitas. Pelo menos, eu sempre imaginei que as gueixas cantavam músicas bonitas que faziam o coração se aquecer no inverno.
   Mas ela veio do Japão diretamente para se casar com o senhor Kirk. Foi um trato com a família dela, pois a guerra está levando muitas pessoas e os pais da lady Sam não poderiam continuar com ela por lá. Pelo menos, é o que se comenta por aqui. Que os pais deram ela em casamento para se livrar da filha logo e não ter outro corpo para enterrar.
    — Perdão, senhora... — Eu começo a sair de cabeça baixa porque não quero atrapalhar a lady Sam de terminar seu café.
    — Pode ficar, se quiser. — Ela fala em um sotaque bem ruim de alguém que mal fala o português.
    — Tudo bem, senhora. — Eu fico parada esperando.
    — Você fala japonês? — Ela me olha por cima do livro.
    — Sim ,senhora. Meu pai fez questão que eu aprendesse. — Explico, tentando não tremer de nervoso.
    — Como seria... — Ela fala eu gosto do jeito que você me olha em japonês. —  Em português?
    — Seria eu gosto... Do jeito... Que você... Me olha. — Eu falo lentamente para ela entender e ela vai repetindo o que eu digo, palavra por palavra, naquele jeito japonês.
    — Obrigada. — Ela dá um sorriso bem leve e volta a ler.
    Eu olho para o chão e penso que é uma merda. Eu estou ensinando ela a falar com aquele homem. Ensinando ela a falar que gosta dele. Queria que ela falasse isso para mim e não para ele. Ele é feio. Ela é linda. Parece uma rosa bonita.
    Eu odeio sentir o que eu sinto, mas é inevitável. E tudo começou há dois meses quando ela saiu do carro do senhor Hamada, que a trouxe direto do Japão para que se casasse.
    Me lembro como se estivesse acontecendo agora. Vi quando ela desceu e olhou ao redor. Parecia curiosa. Nossos olhos se encontraram e eu congelei completamente. Ela era a mulher mais linda que eu já tinha visto na vida. Vestia uma roupa típica japonesa em tom vermelho. Aquela roupa que vai até o chão e se amarra um cinto de pano na cintura. Por aqui, não se usa muito isso. Ela usa.
    Então, o senhor Kirk foi e disse para eles entrarem. Ela fez um pequeno aceno com a cabeça e caminhou até a casa em completo silêncio, olhando para o chão. Parecendo ser tão recatada. Tão linda que meu coração parou e voltou a bater bem rápido. Parecia que eu ia morrer.
    Desde então, eu tenho observado quando ela sai depois do café da manhã com sua sombrinha japonesa para caminhar sozinha. Ela gosta de caminhar sozinha sempre. Penso que usa a sombrinha porque o calor daqui é tão diferente do que ela se acostumou. Meu pai diz que lá é mais frio.
   Sempre me pergunto o que deve se passar na cabeça dela quando ela sai. Ela foi retirada de seu país à força. Ela viu amigos e entes queridos morrerem. Ela se casou obrigada. E ela sempre parece ser alguém tão centrada e tranquila.
    Eu não sei se aguentaria isso. Se bem que eu também perdi pessoas na guerra e eu não falo nada. São pessoas de tão longe, mas eu sinto dor por essas perdas. Sem falar que, agora, meu avô e meu pai se odeiam mais ainda. Isso é doloroso também.
    Eu só queria estar naquele sonho para sempre. Somente ela e eu. Só nós duas, mais ninguém. Por isso, eu não queria me levantar. Se eu morresse dormindo e minha última imagem fosse aquela, eu estaria no paraíso agora.
    — Pode fazer a limpeza. — Ela se levanta da mesa e me olha um momento.
    — Sim, senhora. — Vou até à mesa e desvio os olhos dela, pois tenho medo dela ver o que eu sinto e rir de mim.
    — Não desvie o olhar... Eu gosto do jeito que você me olha. — Ela fala em japonês e sai andando.
    Eu fico travada olhando para a parede. Sinto aquele arrepio causado pelas palavras. Ela está dizendo o que eu acho o que ela está querendo dizer? Não, Mon, ela não está dizendo que sente algo por você! Isso é ridículo!
    Olha para ela, Mon! Ela é uma princesa linda e você é apenas uma filha de camponeses que nasceu em Pirapora do Bom Jesus do fim do mundo de São Paulo no Brasil. Quem conhece esse lugar, conhece bem as moitas escondidas do estado de São Paulo. Porque a questão que não quer calar é o motivo de termos alguém que foi até ali para passear. Me perdoe pessoa piraporense do bom jesusense, mas é uma questão que eu gostaria de saber. O que alguém foi fazer ali? E ainda colocou o nome de Pirapora.
    — Mon, você precisa parar de ser tão atrasada. Isso está demorando demais. — A senhora Yha me olha com raiva e grita comigo
    — Desculpe, senhora. — Eu fico nervosa, pois tenho medo dela.
    Yha é a mais nova esposa do senhor Hamada. Ele ficou viúvo da mãe de Kirk, Tee e Kade, e se casou pouco tempo depois. A senhora Hamada foi totalmente esquecida pelo homem bem rápido.
    A senhora Yha é uma mulher não tão mais velha que eu. Ela é baixinha e nervosa. Todos baixinhos são nervosos. E ela está grávida. O que deu mais poderes para ela sobre os empregados. Ela acha que Getúlio Vargas fez mal em dar salário mínimo e direitos trabalhistas para os trabalhadores. Ela é uma mulher muquirana que conseguiu dar o golpe do baú em um velho que queria ter uma esposa a qualquer custo.
    — Eu quero essa mesa limpa o mais rápido que puder. E não demore, senão eu te mando embora! Limpe logo, ou vai ver! — Ela grita mais alto ainda.
    — Sim, senhora. — Fico com medo e me apresso.
    Limpo tudo e vou para os meus afazeres diários. Depois, limpo toda a casa, pois Yha gosta da casa toda limpa e manda a gente limpar tudo muito bem limpo todos os dias. Ela exige uma casa impecável e vigia tudo para que fique do jeito que ela gosta.
    Sempre que vejo Sam lá fora sentada debaixo do pé de jabuticaba, enquanto passo pela janela e olho bem rápido, eu imagino que, se fosse rica como o senhor Kirk e pudesse casar com uma linda princesa, me casaria com ela. Eu a trataria como a rainha do mundo todo. Ela estaria sempre feliz, pois eu a faria sempre feliz. Mas eu sou apenas uma camponesa pobre. Além de que mulheres não podem sentir isso por mulheres. É um sonho impossível.
    Agora... Estou esperando a família terminar de jantar para eu recolher tudo e poder ir para casa dormir. Já que o dia foi longo e duro. Estou esperando na cozinha junto com a Jim, pois ela é a cozinheira.
    Nós só podemos ir para casa depois de eles comerem e irem se deitar. Nós trabalhamos o dia todo. Todo, mesmo! É bem cansativo. Mas nossa obrigação é esperar todas as noites. Porque nossa obrigação é servir tudo o que eles sentem vontade de comer.
    Estamos em silêncio porque não há assunto pra conversar. Mas conversamos baixo quando queremos. A senhora Yha não escuta. Se escutar, ela bate na gente. Gosta de empregadas silenciosas.
   Então, ouvimos um grito. Um grito que parece ser de raiva. Corremos para ver o que aconteceu porque pode ser uma emergência horrível. Então, chegamos à sala de jantar e vemos... É o senhor Hamada.
    — Meu filho lutando contra meus irmãos! — Ele grita com mais raiva ainda.
    — Pai, eu fui convocado. O senhor sabe que eu não poderia deixar... — Kirk começa a falar desesperado.
    — Pois vá... Eu vou dormir. — Ele se levanta e todo mundo fica de pé olhando para ele indo embora.
    — Eu vou falar com ele. — Yha se levanta e vai correndo atrás do homem.
    — Venha, Sam! Vamos dormir. Amanhã, eu saio cedo. — Kirk comanda e Sam vai com ele.
    — Foi como se nós duas nem estivéssemos aqui. Eles nem viram a gente. — Eu olho para Jim chocada.
    — O que vai ser dessa casa se algo acontecer com o senhor Kirk? Ele é o herdeiro. — Jim me olha assombrada.
    — Não sei. — Fico olhando com os olhos arregalados para a porta por onde todos saíram e penso que ele poderia morrer que não faria falta. Eu cuido da lady Sam.

Eu resolvi fazer essa em SP e não aqui em MG pra dar uma variada e porque combina mais com a história do Brasil. É isso... E, sim! Eu fiz pesquisas pra essa! Me perdoe pelo bullying pessoa de Pirapora... Pode bater na autora, mas bata com carinho, ela é sensível e chora fácil.

Illicit Affairs (REPOSTAGEM REVISADA E MELHORADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora