Os meses passam e eu já estou grávida do meu terceiro bebê. Eu parei de reclamar da quantidade de filhos no primeiro. Sam sempre me faz sentir como se a nossa família grande fosse algo tão bom e grandioso que eu quero ter mais filhos para aumentar a nossa família.
E não se surpreenda com a quantidade de filhos que eu estou tendo. Ainda mais que a senhora Yha não teve mais nenhum. Jim já está no segundo filho e ninguém está falando nada. Eu juro que, se eu não estivesse tão feliz por ser mãe, teria raiva da deusa que resolveu escrever minha história por ela dizer que eu ter vários filhos um em seguida do outro seria algo bonito para mim. Deusa da desgraça! Eu nem sei mais o que é não ter um filho na barriga.
Eu fico pensando que Chin deve ter uma mulher, mas, às vezes, penso que ele pode ter um homem e que faz coisas comigo para mostrar que temos filhos. Só sei dizer que os chifres trocados não doem. Mas se Chin estiver dando uma de samurai e fazendo a relação homem a homem, não vou o culpar.
Deve ser mais gostoso um homem namorar outro homem. Mulher com mulher é mais gostoso, eu sei do que falo. E samurais conseguiam ter vários filhos, mesmo namorando homens. Eles saíam dos treinamentos samurais, vamos chamar aquilo de treinamento samurai porque não sei como chamar dois homens namorando. Que nome você daria? Mas eu quero dizer é que eles saíam e voltavam para a casa deles e conseguiam namorar as mulheres.
O filho é o fruto no namoro, né? Então, Chin pode ter mil filhos comigo e eu com ele que, se ele tiver algum homem praticando o treinamento com ele no meio das moitas da fazenda, eu também estarei praticando com a Sam. E vai ser bom porque vamos estar vivendo o amor de verdade de alguma forma, mesmo que a gente não se ame.
Eu não vou mentir que gostaria muito de descobrir que ele tem um amante homem. Mas se for uma mulher, eu não ligo. O importante é que ele seja feliz porque assim eu me sinto menos feia por estar traindo um bom homem com o meu grande amor. Porque eu penso que ele não tem culpa, mas eu também não tenho. A vida é feita disso e eu amo uma mulher, não meu marido.
Mas vamos às fofocas? Dessa vez, o Chin não pode me atrapalhar de contar fofocas. Ele não fala com você, só eu falo. Aquele homem é um fofoqueiro de mão cheia. Nunca vi um homem fofocar tanto da vida dos outros. Esses dias, cheguei em casa e ele já disse que a dona Marieta, casada com o senhor Vincenzo tinha visto um negócio voando no céu de noite. E que depois viu dois olhos brilhantes olhando ela no meio do mato. Me arrepiei toda e mandei ele parar de contar essas coisas porque assusta o bebê. O bebê sou eu.
Mas vamos às fofocas! As notícias que andam correndo é que os japoneses estão sofrendo ataques após o fim da guerra, aqui no Brasil, aqui em São Paulo. Isso está causando medo em alguns de nós. Mas otou-san não está com medo.
Chin anda muito mais calado desde que os ataques começaram. Ainda bem, porque a última vez que ele abriu a boca foi pra falar aquilo. Mas a questão é que alguns japoneses estão morrendo nesses ataques. Eles aconteceram em cidades do interior daqui de São Paulo. E os boatos são de que são vingança.
Otou-san anda calado também, mas sempre calmo. Ele não recebe aqueles panfletos que costumava receber, mas se recebe, esconde de nós. A maioria dos japoneses da fazenda resolveram continuar trabalhando e não falar mais sobre a guerra. Mas meu pai permanece num silêncio estranho. Ele sempre foi calado porque o japonês é mais calado, mas o silêncio dele é estranho. Mamma diz que ele mal responde e parece estar esperando por algo. Mas esperando pelo que?
Há japoneses querendo ir embora daqui com medo dos ataques porque ninguém sabe quem será o próximo, mesmo que agora a gente tenha nosso dinheiro. A fazenda está começando a nos pagar novamente porque já faz oito meses que a guerra acabou. Os brasileiros já começam a ver os japoneses como amigos após entenderem o que as bombas fizeram. Então, estão comprando nossos produtos.
O senhor Hamada cumpriu com a promessa e voltou a nos pagar. E esse dinheiro veio em boa hora porque ter três filhos sem ter o que comer seria uma desgraça que eu não gostaria de passar. Não daria para Sam desviar comida da cozinha dos senhores para sempre para eu dar para meus filhos. Daria na cara. E ainda ajudamos a Jim. Ajudou muito, mesmo.
Estamos, Sam e eu, debaixo da jabuticabeira para as crianças pegarem sol e os maiores poderem conviver com a natureza. Enquanto isso, o meu filho menor está pegando o sol no meio das sombras. Chin escolheu o nome dele. Sam e eu decidimos que ele teria o direito de escolher alguma vez e seria essa. E não foi o nome do avô dele. Não que eu sinta raiva do nome do avô dele. Eu só estou dizendo que não foi aquele nome, não sei o porquê. Ele só escolheu outro. O nome foi Kawa, que no japonês significa rio ou correnteza. Achei auspicioso e gostei. Chin tem um bom gosto para nome.
Kawa, assim como uma correnteza, é um menino mais agitado. Sora e Taiyō são mais calmos. Os três vão ser irmãos e amigos. Sam e eu vamos criar os três para serem sempre assim, mesmo com as diferenças. Eles são irmãos. Sempre serão irmãos. E um sempre vai cuidar do outro.
— Ume, cuide dos bebês porque eu vou buscar umas frutas no pomar para eles comerem. — Olho para Kawa que finalmente dorme tranquilo debaixo da sombra e do solzinho, enquanto os outros dois brincam sentados com os brinquedos que o senhor Hamada comprou para o neto.
— Sim, Sakuranbo. — Ela concorda e eu saio andando.
Chego no pomar e pego umas frutas. Pego para nós cinco porque Kawa já está começando a comer. A família aumentou muito e agora a comida está sendo maior. E é como eu disse, é difícil conseguir disfarçar que Sam e eu estamos desviando as coisas da fazenda para alimentar meus filhos.
Além de que, eu sempre desvio alguns para os filhos da Jim, como disse. Ela é minha cunhada e minha família também. E mesmo se não fosse, eu a ajudaria porque ela é minha amiga. Eu me importo com a gravidez dela e com os bebês que ela tem ou que tiver. Tanto que eu sempre cuido do menino dela. Ele não está aqui hoje porque está meio doentinho e ela quis deixar ele perto dela, enquanto ela faz os afazeres da cozinha.
A senhora Yha não gosta disso, do bebê estar lá, mas aceita, né? Porque seria difícil não aceitar porque Jim não vai se separar do menino nunca. Ela até vai embora com o Nop, se precisar. E a verdade é que os senhores são sempre assim. Querem o trabalho feito, não importando como. E os filhos atrapalham. Eles não gostam dos filhos. Mas aceitam para ter alguém para limpar.
Estou passando pelo centro da fazenda porque resolvi falar com mamma para ela me ajudar em casa porque Kawa anda me dando certo trabalho. A criança não para nem um minuto. Vive acordando e chorando. Eu tenho dois bebês para cuidar. É trabalhoso. Se os dois dormissem juntos e me dessem tempo para cuidar da casa, mas não é o que acontece. Pois quando um está lá se esgoelando, o outro começa a acordar também. Quando eu vejo, tenho uma criança correndo pela casa e outra chorando igual uma maluca. As avós foram feitas pra ajudar nessas horas. E elas até gostam, né? Elas amam cuidar. E nós agradecemos.
Então, estou indo ver mamma e vejo Chin indo para o escritório do senhor Hamada. Não dou muita atenção porque deve ser coisa do trabalho. Já vi ele fazendo isso outras vezes. E vou para onde mamma costuma trabalhar. Procuro por ela, até que a vejo no meio da granja pegando os ovos que serão vendidos na cidade.
— Mamma, domingo a senhora poderia me ajudar com os bebês pra eu arrumar a casa? — Pergunto e ela me olha.
— Claro, bambina. — Ela sorri porque, como eu disse, avós amam cuidar dos netinhos e isso é em todas as culturas.
Eu sorrio de volta em agradecimento. Até que ouvimos um barulho de estouro bem estranho e damos um pulo. As galinhas também se assustam, começando a fazer aquela algazarra de galinhas. E ouvimos outro barulho. As galinhas estão cacarejando feito loucas. Eu olho para minha mãe assustada e ela também parece estar assim.
— Espera, vou ver o que é. — Ela abre a porta do galinheiro e olha para os lados. — Ouviu o barulho também, Hinata?
— Ouvi sim. — A mulher concorda. — O que será?
— Não sei... — Ela fica confusa e começa a sair do galinheiro.
— Vamos ver o que foi. — A mulher chama mamma.
— Vamos, mas com cuidado. Vem, Mon. — Ela me chama e eu vou.
— Será que foi alguma coisa no trator? — A mulher olha para minha mãe confusa.
— Não sei... — Mamma parece estar com medo.
E vamos andando, até que vemos a senhora Takeda gritando feito louca. Depois, vejo otou-san correndo junto com mais dois homens da fazenda para rumo das nossas casas. Mamma também vê e fica pálida, colocando a mão no coração.
— Mamma... a senhora está bem? — Solto as frutas e seguro ela.
— Mon... — Ela me olha e parece estar sem cor nenhuma.
— Socorro! Socorro! O senhor Hamada está ferido! — A senhora Takeda grita e começam a aparecer pessoas para ajudar. — Ajudem!
— Mon... — Mamma começa a cair e eu seguro ela com mais força. — Mon, eu ouvi seu pai falando ontem com dois homens. Eu ouvi eles combinarem de matar todos os que concordaram que o Japão perdeu a guerra. Falaram que seu pai deveria limpar a honra da família, que a filha não poderia ficar casada com um homem sem honra e que deveriam matar o senhor. Eu tentei falar com ele, mas ele me deixou falando sozinha.
— Mamma, não! — Eu olho para o rumo do escritório e vejo as pessoas entrando lá e ficando desesperadas, colocando as mãos nas cabeças.
— Mon, eu achei que era conversa de homem por causa da guerra. Desculpe por não ter impedido. — Ela começa a chorar e eu me desespero ainda mais depois da senhora Takeda começar a vir para o nosso rumo com uma cara de julgamento misturada com de pesar. Eu não sei o que fazer.
— Eu sei que vocês não tem culpa, mas... — Ela começa a falar e eu escuto todas as palavras em completo choque... — E eles entraram, mesmo eu pedindo para eles esperarem. Ouvi os disparos. Eles saíram correndo e eu entrei. Mon, Chin está morto.
— Não... — Eu congelo inteira e depois saio correndo deixando tudo para trás.
Eu preciso falar com Sam. Eu só preciso dela agora. Eu não sei o que vai ser de mim sem meu marido. Eu tenho três filhos para cuidar. Eu não sei como vai ser. Ainda mais que meu pai matou o dono da fazenda. Senhora Yha vai colocar todos nós na rua. Eu tenho três filhos! Como vou fazer? O que vai ser de mim? Todos nós sabemos o que acontece com mulheres que são mães e não têm maridos, mesmo sendo viúvas. Todos sabem!
Eu chego até perto da Sam e dos meninos na jabuticabeira. Ela está brincando com eles e sorrindo. É uma imagem tão linda. Eu só tenho vontade de chorar. Senhora Yha vai me mandar embora e eu nunca mais vou ver Sam e meu filho. Nós nunca mais vamos nos ver.
— Sakuranbo... — Ela me olha e fica preocupada. — O que aconteceu? Eu ouvi dois barulhos estranhos... Pensei que era o trator. O que foi?
— Ume, o senhor Hamada está morto. — Eu falo com a voz baixa.
— Não é possível. — Ela fica sem acreditar.
— Chin também. — Eu começo a chorar desesperada.
— Calma... — Ela se levanta e me abraça. — Não fica assim. Vamos dar um jeito.
— Não vamos. Meu pai matou os dois, junto com dois homens. Eu vou ser mandada embora. Eu nunca mais vou te ver. Está tudo perdido, Ume. Que poder você poderia ter? — Eu choro soluçando porque só existe o desespero em meu coração.
— Calma, Sakuranbo. Eu não vou deixar. Nossa árvore tem raízes profundas. Você confia em mim? — Ela se afasta e me olha, enquanto seca meus olhos.
— Confio... — Eu não sei se ela tem poder para isso sem o senhor Hamada, mas em que mais vou me apegar? Eu preciso me apegar a algo.Então gente essa coisa dos panfletos que eu usei na fic aconteceu mesmo. Os Shindo Renmei existiram e eram eles quem davam informações para os japoneses sobre a guerra. Acontece que eles eram um tantinho mentirosos sobre isso e diziam que o Japão estava sempre vencendo. E quem falasse o contrário era mentiroso pra eles. Membros mais doidos mataram japoneses que admituram a derrota do Japão. Eles foram condenados, mas receberam perdão após uns anos. Essa era uma organização que tinham milhares de japoneses sendo tipo que sócios, no Brasil, mas só alguns mataram. Foram 23 japoneses mortos por admitirem a derrota do Japão. E eu quis usar isso na fic porque ela é uma fic histórica. E até hoje se fala muito pouco sobre isso, até mesmo entre os japoneses do Brasil. Mas as famílias dos mortos se lembram. Só que aconteceu, infelizmente. Foi uma consequência da guerra aqui no Brasil.
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Illicit Affairs (REPOSTAGEM REVISADA E MELHORADA)
FanficApenas mais uma fic Monsam com nome de música da Taylor Swift. Mas essa aqui é de um caso ilícito. Aqui tem menção á história de verdade. Quem quiser aprender um pouco sobre cultura japonesa, história do Brasil, Japão e da 2 Grane Guerra, esteja à v...