Capítulo 19

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A Unidade Kidon é o braço armado do Departamento de Planejamento Operacional e Coordenação, do Mossad. Dentre as especialidades do grupo, algumas das mais importantes são sabotagem, demolição e outras "missões especiais". Naquela madrugada, a missão especial fora a de recuperar em segurança dois operadores da Organização e um desertor estrangeiro, da forma mais discreta e cautelosa possível. Ao espreguiçar-se num dos assentos do aparelho, Tor lançou um olhar para seus extenuados passageiros. Não conteve um bocejo de tédio.

O helicóptero voou por 52 quilômetros até o Aeroporto de Yüksekova, onde todo o grupo rapidamente vestiu roupas civis, embrulhou as armas em sacolas e embarcou num jato executivo de uma companhia local de táxi-aéreo, com destino a algum lugar na Turquia.

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Akin repassou em voz baixa, não sem um certo tom de ironia, as últimas horas da sua missão. Ele e Pinar aproveitavam o momento de lassidão nas confortáveis cadeiras ao fundo da aeronave nivelada a 33 mil pés, enquanto degustavam um merecido vinho branco. Ela somente lhe contara a parte mais inócua da conversa que tivera com o general nas montanhas, poucas horas antes. Akin comentou:

- Quase fomos fuzilados três vezes nas últimas horas, mas penso que o final da missão foi bem planejado pelos caras lá embaixo. A negociação "paralela" prévia entre o general e Shapiro pode ter facilitado tudo. Asadi tem razão.

Pinar, contudo, enxergava a missão com outros olhos. Ainda remoía as revelações que ouvira de Asadi:

- Tenho pensado na minha dedicação sem limites a Shapiro e ao país em todos esses anos. Entreguei o melhor de mim, me submeti a qualquer sacrifício...Não estou de acordo, e sim, surpresa com essa "negociação paralela". Significa que somos descartáveis. Além do mais, se essa informação for verdadeira, será absurdamente contrária às tradições da Organização. Tentei entender essa forma tortuosa de preparar o recrutamento do inimigo, mas não consegui. Preferiria que o general estivesse mentindo.

- Não tenho dúvidas que somos descartáveis. Isto nunca vá mudar. Sei como funciona, mas este é o nosso emprego. Não quero me deprimir. Só desejo que eles jamais percam essa eficiência. Já levei um balaço na coxa, certa vez, por falha organizacional e não quero que isso se repita. Agora, só quero ir para casa e para a minha banheira.

Pinar mirou-o em silêncio. Aquele era o mundo de Akin, assim como devia ser o de Tor e dos demais kidons sentados ali nos assentos dianteiros.

- Estou feliz por estarmos juntos e íntegros, novamente - Cochichou ela no ouvido do parceiro.

Akin tomou-lhe a mão e beijou-a com suavidade. Ela retesou-se, varreu com o olhar o corredor e os passageiros próximos, e inquiriu-o num sussurro:

- O que está fazendo? Não pode me beijar aqui em público!

- Só queria lhe dizer que estava louco de saudades do seu perfume.

Ela respondeu-lhe com um olhar pérfido e uma suave cotovelada nas costelas, mas continuou em voz baixa:

- Não tomamos banho há uns dois dias, seu maníaco!

Akin apontou para Asadi, sentado logo à frente, que se distraía com o tilintar do gelo num copo de bebida em sua mão.

- Estava sempre perfumada quando deitava ao lado daquele sujeito ali?

- Quer mesmo saber? Pois ele me tratou com elegância e respeito todo o tempo. Em nossa única vez, foi um amante atencioso e pensou mais no meu prazer do que no dele. Mas nunca esqueci que é meu inimigo e porque eu estava em sua companhia! Tesão é uma coisa, trabalho é outra, caso queira saber!

O Gato do DesertoOnde histórias criam vida. Descubra agora