Capítulo 22

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Ao chegar a Paris, procurou o portão de embarque para outro voo da mesma companhia aérea, cujo destino era Istambul. O ritual de segurança era semelhante ao de outros tempos. Rumou ao toalete masculino, onde fez contato com outro agente, de quem recebeu um passaporte turco no qual constava sua foto e um nome fictício. Na saída, precisou devolver o passaporte francês, recebido em Tel Aviv, para descarte.

No saguão de chegada do Aeroporto Atatürk, em Istambul, seu contato levou-o para a sede da estação local do Mossad, onde reencontrou seu velho conhecido, Hakan Durmaz. Após os cumprimentos, não perderam tempo.

- Tenho alguns novos pertences para você aqui neste pacote - avisou Durmaz. - Abra-o, por favor.

Continha uma mochila grande de lona, desbotada, puída e encontrada em qualquer supermercado do Oriente Médio. Nela, havia duas mudas de roupas, uma ocidental comum e outra levantina, contendo camisas brancas de algodão de mangas longas, calças largas no mesmo tecido, um casaco e um turbante vermelho e branco quadriculado, chamado de keffiyeh. Para os pés, havia um par de velhas sandálias. No fundo da mochila, um telefone celular barato, mas com câmera digital embutida e o equivalente a cinco mil dólares em libras sírias.

- E aqui, nesse envelope, estão orientações sobre o que fazer ao chegar e qual será sua relação com o Sayan residente em Deir ez-Zor. Não custa lembrar, mas seus contatos com ele devem ser o mínimo necessários e, de preferência, nenhum pessoal. Aqui, o seu novo nome e documento de identidade sírio, reconstituído com a sua foto. Obviamente, ele se refere a um cidadão com aproximadamente a sua idade, já falecido e ex-morador de uma aldeia longínqua. Há também dados sobre a sua nova profissão, referências, etc. Finalmente, aqui estão as instruções para sua comunicação conosco. Após ler e memorizar, destrua os papéis.

- - pronunciou o katsa em voz alta, ao conhecer seu novo nome.

- Significa inteligente. Espero que eu faça jus a ele..

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Sahoun Sabah foi levado num avião bimotor civil alugado até a cidade de Harã, distante cerca de 1000 quilômetros a leste de Istambul e muito próxima da fronteira síria. No aeródromo local, trocou suas roupas ocidentais pela indumentária tradicional do país vizinho e embarcou num veículo que o esperava. Estava escurecendo quando o motorista se deteve, após rodar por 22 quilômetros numa estrada secundária até aproximar-se de outra aldeia menor chamada Zenginova, localizada a 800 metros da linha divisória. Era o ponto de desembarque. Trajando as roupas locais, incluindo o keffiyeh na cabeça, enfiou a mochila nas costas e, lentamente, iniciou sua jornada solitária. Não tinha a mínima pressa, pois desejava que a noite chegasse logo para aumentar seu nível de invisibilidade. Quando se deu por satisfeito, rumou a pé por entre campos aráveis até encontrar um córrego com vegetação alta nas duas margens, que tangenciava de o limite entre os dois países por cerca de dois quilômetros. O ponto fora escolhido por três importantes razões: era pouco vigiado pela polícia fronteiriça de ambos os países, tinha cobertura extra fornecida pela vegetação e se encontrava a cerca de dois mil metros da rodovia síria 712. Envolto pelo breu da noite, cruzou a linha completamente despercebido e rumou perpendicularmente a ela até encontrar a rodovia e uma pequena aldeia síria do outro lado do asfalto.

Numa das ruas, havia um velho jipe russo Lada Niva, tração 4X4, com a documentação em seu novo nome e a chave no porta-luvas, além do tanque de combustível cheio. Poucos minutos depois, ele rodava no sentido sul pela rodovia 712 rumo a Deir ez-Zor e Al-Kibar. Chegou ao seu destino ao amanhecer, após ser detido duas vezes no caminho pela polícia militar para averiguações de rotina. Em todas elas, teve o veículo revistado, seus documentos inspecionados e seu destino e objetivo de viagem interpelados. Embora sentisse as batidas do coração acelerar, as explicações fornecidas na sua língua materna foram suficientes para que prosseguisse a viagem em paz. A cidade de 270.000 habitantes estava localizada a 450 quilômetros de Damasco e a 130 quilômetros do bordo com o Iraque.

O Gato do DesertoOnde histórias criam vida. Descubra agora