Corpo quente

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Logo após desligar o telefone, fui atrás de resolver as questões mais burocráticas. O que era bem pesado.

Liguei para o seguro de vida para informar o falecimento da minha mãe e, a cada nova confirmação em voz alta, seja pra uma amiga distante ou qualquer conhecido, era muito doloroso. Era como se tornasse a perda dela real e a vontade que eu tinha era de nunca fazer isso mas, infelizmente, era necessário.

Mamãe sempre deixou muito bem explicado pra mim e pra Alex que caso algo acontecesse com ela e Chris, tínhamos que ligar para o seguro para resgatarmos uma espécie de "poupança" que nos manteria em conforto e segurança financeira até alguém nos ajudar ou conseguirmos nos readaptar. De fato, conforme o prometido, com o valor consegui quitar o aluguel da casa, pagar as últimas contas, sair do meu atual emprego sem me preocupar com as dívidas e obviamente, guardar para nossa nova vida nesse novo lugar.

Christopher, pai de Alex, até o momento não deu um retorno sequer após ser comunicado da morte da mamãe - o que me fazia repensar sobre sua índole. Pela falta de resposta dele, decidi não comunicar os próximos passos e seguir com o combinado.

As horas passaram voando enquanto arrumávamos todas as nossas coisas. Era incrível como mamãe ainda estava tão presente em tudo, era como se a ficha não tivesse caído totalmente, não sei, mas ir contra sua privacidade e mexer nas coisas que ela tanto pedia para serem privadas, não me parecia correto de certa forma. Choramos bastante quando foi preciso empacotar as roupas, sapatos e demais acessórios da nossa mãe. Obviamente não teríamos como ficar com tudo - e foi um pedido dela deixarmos para doação - então, para levarmos ela conosco de alguma forma, ficamos cada uma com um item simbólico e marcante.

Eu escolhi um colar de prata que continha um pingente de lobo e parecia ter sido feito a mão; mamãe o guardou em uma caixinha de madeira decorada e estava junto com os seus diários. Apesar da caixa parecer antiga, o que indicava que o item também era, estava em tão perfeito estado que entendi ser algo especial. Já Alex escolheu uma pulseira artesanal, item que a mamãe não tirava do braço por nada, que continha um único pingente em formato circular e alguns desenhos confusos no meio. Ela nos ensinou desde cedo que aquele símbolo era da nossa tribo e sempre repetia: "Uma hora vocês vão entender tudo."

É, mãe... Acho que esse momento está mais perto do que nunca.

Como se tivesse sido cronometrado, no momento em que fechamos a última caixa, ouvimos buzinas do lado de fora da nossa - agora - velha casa. A corretora responsável já nos aguardava na sala, então só assinei os documentos necessários e entreguei a chave.

Oficialmente, aquele já não era mais nosso lar.

Em frente ao jardim, estacionada, estava uma caminhonete azul. O jovem que ocupava o lugar do motorista não demorou para descer do veículo e vir em nossa direção. Pela aparência, eu diria que ele talvez fosse um pouco mais novo que eu, mas definitivamente mais velho que Alex.

- Olá, vocês devem ser Maya e Alex, não é? Eu sou o Quil. - Seu sorriso era sincero e simpático, mas também estava nervoso. Sua camisa de mangas curtas não condizia muito com a temperatura do momento, mas eu achei cedo demais para opinar.

- Credo, você não está com frio? - Mas pelo visto, Alex não.

- Alex! Modos! - Fuzilei minha irmã com os olhos, logo voltando ao garoto à nossa frente. - Oi Quil, desculpe minha irmã. Ela não está nos melhores dias, não é, Alex?

- Me desculpe, Quil. Agora que tal dispensarmos as apresentações e começarmos essa mudança logo? - Era incrível o poder que Alex tinha de mudar todo e qualquer momento - O tempo não está tão legal e não acho uma boa ideia pegarmos a estrada na chuva. Na verdade, eu morro de medo. Você sabia que o risco de acidentes cresce cerca de 40% com as estradas molhadas, Quil?

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