2. Sem jeito

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Rafaella Kalimann se sentia um pouco sem graça de negar mais uma vez o convite de Loreto. Ela não queria se envolver com mais ninguém depois que Flávio a deixou com uma filha de apenas 02 anos.

Rafaella se casou aos 18 anos, já estava grávida de Sofia, tinha quase nove meses de gestação. Foi tudo rápido e no cartório. Sem festa, sem glamour, mas ela acreditava no amor do tipo que se vê em filme bobo de romance, aquele que vence ao final e que tudo suporta.

Flávio tirou a sua virgindade, deu-lhe um casamento, uma filha e lhe tirou quase todo o resto, mas principalmente lhe tirou a paz. Depois do primeiro ano morando juntos, eram crises de ciúmes e noites de bebedeira do marido. A vida era caótica.

Foi assim até que, na festa de 02 anos de Sofia, Rafa flagrou o seu marido com uma colega de trabalho dele aos beijos no banheiro de sua própria casa.

 Poderia ser em outro lugar? não! Porque naquela casa só tinham dois quartos, um banheiro, e a sala e a cozinha ficavam no mesmo vão. Como a sala e a cozinha estavam com os poucos convidados da festinha, e os quartos estavam fechados, só sobrou aquele local  -  o banheiro. Não tinha como ser em outro local, não naquela casa.

Bianca era do tipo invejosa. Rafaella já tinha percebido os olhares de cobiça que a colega de Flávio lançava para ele. Ela relevou as paqueras porque achava que Flávio, o seu príncipe encantado, jamais olharia amorosamente para nenhuma outra mulher.

Flávio era corretor de imóveis, ganhava pouco, dava uma vida modesta a sua família, mas aparentemente ele estava feliz com a sua esposa e filha.

Rafaella saiu de seu sonho de conto de fadas para o verdadeiro inferno. Ela conheceu o pior lado do seu marido. Ao invés de desculpas por ser flagrado aos beijos com a amante, Flávio expulsou a mulher e a sua filha da casa e, em pouco tempo, já estava vivendo com a exuberante e traiçoeira Bianca.

Sem ter família no Rio de Janeiro, uma vez que seus pais foram morar em São Paulo havia um ano, Rafaella pegou as suas roupas e as de sua filha e, com o pouco dinheiro que tinha, comprou passagem de ônibus para a capital paulista. Era uma nova jornada que em nada se parecia com os romances que ela assistia nos fins de tarde.

Seus pais, Genilda e Fernando, eram humildes, bastantes simpáticos, quase sempre apresentam sorrisos nos seus rostos. Daí veio o ideal de casamento feliz que Rafa sonhava para ela. Ela queria ser par de alguém que lhe fizesse sorrir por bobagens e tornasse a vida mais leve.

Dias depois de se alojar na casa dos seus pais, Rafaella saiu pela ruas de São Paulo espalhando currículos em todas as lojas, padarias e empresas que tinha no caminho, mas foi na Bicalhos que ela conseguiu o seu primeiro emprego, foi contratada para ser copeira.

Ela tinha apenas 20 anos e a sua beleza foi o suficiente para ser contratada pelo chefe do RH da Bicalhos, José Loreto.

Na época, Loreto tinha 30 anos e se encantou pela jovem mulher de olhos esverdeados e cabelos que mesclavam marrom com um leve dourado nas pontas, era definitivamente a criatura mais despretenciosamente sexy que ele já tinha visto.

Rafa ignorou todo o entusiasmo de Loreto, só pensava em sustentar a sua filha e seguir a sua vida com um pouco de paz. Era o seu novo ideal - nada de romances, apenas criar a sua pequena Sofia com dignidade e focar no seu novo emprego.

Depois de trabalhar mais de cinco anos como copeira, atendendo exaustivamente cinco andares do prédio principal da empresa, ela conseguiu mudar de função, passou a ser secretária pessoal do engenheiro e vice-presidente da Bicalhos, o senhor Fagundes.

Rafa adquiriu um carinho muito grande por aquele homem de barbas brancas e voz suave. Fagundes era gentil, educado e tratava Rafaella como uma filha. Rafa viveu dias de paz naquele local. Foram 03 anos em que não se preocupava com olhares de desejo sob si, pois naquele andar só tinha a vice-presidência. Além disso, estava feliz recebendo o salário três vezes maior do que quando era copeira. Estava realmente satisfeita.

Sofia tinha acabado de completar 10 anos de idade quando Fagundes lhe deu de presente uma bicicleta rosa da Barbie. O sorriso da menina não saiu do seu rosto por quase uma semana. Sofia, em quase todas as quinta-feiras, corria pelos corredores do 5ª andar para entrar como um furacão na sala daquele que lhe dava bombons de chocolate escondido. Fagundes foi carinhosamente apelidado de "Vô Two" pela irreverente Sofia. Era o seu vozinho dos bombons, o seu segundo avô.

A criança era encantadora. Os seus cachos caramelados e a o seu sorriso largo chamavam atenção por onde a furacão passasse. Difícil achar quem não gostasse de Sofia.

E o Loreto? Sumiu?

Não. Loreto não cansava de convidar Rafaella para festas, cafeterias, restaurantes... Era incansavelmente apaixonado. E todas as vezes, Rafa sem jeito, mas educadamente, negava atenção ao chefe do RH, afastando-se de todas as investidas do rapaz sedutor, de cabelos castanhos, olhos verdes e boca carnuda. A beleza de Loreto não encantou a mulher que ele desejava.

Loreto não sabia que Rafaella estava fechada para qualquer romance, exatamente porque não teria como saber, ela nunca falava da sua vida particular. Para ela só existia - Sofia, seus pais, Fagundes e seu trabalho.

Continua...

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Não sei se tem gente que vai ler a FIC, mas se tiver, comenta para animar a escritora :-)





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